quinta-feira, 2 de junho de 2011

L'11: A estratégia do costume

A estratégia é sempre a mesma. Há, em Portugal, há quase 40 anos, dois partidos que colonizam o poder (e que por sua vez estão completamente corroídos pelo poder económico que os coloniza a eles, mas esse é outro assunto). Estes dois partidos desenvolvem uma política que na essência é precisamente igual. Mas vivem numa gritaria permanente, tentando (e em boa medida conseguindo) com essa gritaria levar as pessoas a julgar que entre eles há diferenças que na realidade não existem. O PSD berra, arrancando os cabelos, que o PS é um horror para o défice ao mesmo tempo que aumenta o défice; o PS guincha, erguendo as mãos para o céu, que o PSD quer destruir o estado social ao mesmo tempo que destrói o estado social. E assim vão, de mãos dadas, servindo-se do país, enriquecendo, e deixando-nos a todos mais pobres, mais sobrecarregados de impostos, taxas, o diabo a quatro. São assim como duas técnicas diferentes de demolição. Um é o camartelo, o outro os explosivos, e na verdade não interessa muito qual é qual.

A ideia é simples. Quando o partido-camartelo acusa o partido-explosivos de incompetência, assustam-se os eleitores que acreditam que o partido-explosivos é incompetente e ainda não se aperceberam de que o partido-camartelo o é igualmente e, com as velhas e falsas chantagens do voto útil e da ingovernabilidade, leva-se esse mar de ingénuos a votar no partido-camartelo. Do lado do partido-explosivos, a estratégia é simétrica. Depois, um deles ganha as eleições, digamos o camartelo. Imediatamente o partido-explosivos começa a denunciar que aqui d'el rei, as medidas que ele próprio tomaria se estivesse no governo em vez do partido-camartelo não têm pés nem cabeça, e blá blá blá, tudo para tentar fazer com que nas eleições seguintes seja o partido-explosivos e não o partido-camartelo a vencer e a ir para o governo, distribuir lugares aos amigos e continuar a mesmíssima política que o partido-explosivos tinha feito e, segundo dizia antes o partido-camartelo, tanto mal fazia ao país.

No ponto em que nos encontramos hoje, há uma nuance: o empréstimo que nos estão a fazer com juros de mais de 5% e que qualquer criancinha que saiba fazer contas de somar (ou melhor, de subtrair) percebe que é impossível de pagar. Agora temos camartelo e explosivos, coadjuvados pelo partidinho-eu-também-quero, a afiançar aos ingénuos que o programa do FMI é que nos vai salvar da bancarrota. Toda a gente sabe que não vai. Toda a gente sabe que vai resultar precisamente tão bem como resultaram os PECs, que já antes nos afiançavam que seria aquilo que nos salvaria do garrote. Toda a gente compreende que um país forçado à recessão por medidas económicas draconianas nunca, mas nunca, poderá pagar empréstimos de mais de 5%. Toda a gente o compreende, mas a maior parte das pessoas prefere assobiar para o ar, autoiludir-se, fingir que tudo está bem, que isto não passa dum buraquinho na estrada, nada de grave. E é precisamente com isso que o camartelo e os explosivos contam.

Porque quando o partido que ganhar as eleições, digamos o explosivos, puser em prática as medidas impostas pelo eufemisticamente chamado "plano de resgate financeiro" e a economia continuar a cair a pique no buraco onde esta política inacreditavelmente imbecil que temos seguido alegremente nos últimos anos nos foi enfiando, aí teremos o partido-camartelo a esbracejar e a bater no peito dizendo "Veem, veem, o que nós dizíamos? Veem como eles são incompetentes? Votem mas é em nós, para sermos nós a fazer a mesma política e a continuar a demolir isto!" Pronto para continuar a farsa dos gémeos siameses que tentam fingir que são de raças diferentes, perpetuando-se no poder, esperam eles, para sempre.

A não ser que no próximo domingo nenhum deles consiga fazer uma maioria absoluta a não ser com o outro. Isso é que lhes estragava mesmo os planos, não era? Assim é que veríamos mesmo um pouco de verdade na política portuguesa. Nas eleições seguintes não haveria desculpas. E o inevitável falhanço teria finalmente responsáveis claros perante todo o povo.

Como é que isso acontece? Simples: Deixando PS e PSD em torno dos 30%, e não deixando que o CDS suba o suficiente para servir de muleta a nenhum dos dois. Isso faz-se votando no BE e na CDU. E, para quem vota em Lisboa e até certo ponto no Porto, noutros partidos que tenham alguma hipótese de eleger deputados, o que, extrapolando dos resultados das últimas eleições (é arriscado, imperfeito, mas como as sondagens não medem intenções de voto nestes partidos é o que temos), significa o MRPP, o MEP, a Nova Democracia e os monárquicos. Votar em branco é o mesmo que votar PS ou PSD, porque os votos em branco não contam para nada e o método de Hondt favorece os partidos mais votados. Votar nulo idem aspas. E ficar em casa pior um pouco.

Era mesmo, mesmo bom que isso acontecesse. Porque este país só sairá do marasmo quando o eleitorado punir mesmo todo o centrão, em vez de passar a vida a ir de camartelo para explosivos e de explosivos para camartelo. E só fará tal coisa quando realmente vir que o que se tem passado não é por causa da incompetência do Sócrates ou da nabice do Santana ou da mania de bazar do Guterres e do Durão, mas da própria natureza daqueles dois partidos.

Obriguem-nos a mostrar ao país o que valem ou o que não valem. Já que vocês não querem arriscar uma política realmente diferente, e é claro que não querem, obriguem aqueles dois antros de incompetência a governar em conjunto. Obriguem-nos, pelo menos, no mínimo, a arranjar desculpas diferentes do costume, a ter de pensar um bocadinho noutras maneiras de enganar o freguês.

Faz-se isso votando. Em todos menos neles.

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