sábado, 8 de dezembro de 2012

A estupidez revela-se nestas coisas

Andam aí os caquéticos da velha ortografia com tudo aos saltos porque, segundo dizem, "o Brasil meteu o acordo ortográfico na gaveta", ou vai adiá-lo, ou não sei que mais. As versões são múltiplas.

E, como é hábito nesta gente, são um chorrilho de asneiras.

A verdade é apenas a seguinte: um senador brasileiro, repito, um senador, membro do equivalente local ao nosso PSD que, como os de cá, procura qualquer pretexto para criar dificuldades ao governo quando não é da sua cor política, fez no senado uma proposta para adiar para 2016 a entrada plena em vigor da nova ortografia.

Precisam que eu repita?

1) É uma proposta.

2) Feita por um senador.

3) Destina-se a adiar a entrada plena em vigor da nova ortografia. Esta estava prevista para 2013, se não me engano.

Precisam que eu explique?

No Brasil, como em Portugal, como nos demais países lusófonos, não se adota a nova ortografia de um dia para o outro. Existe um período de transição, durante o qual estão as duas em vigor, a nova e a antiga. No Brasil, como em Portugal, estamos agora dentro desse período. Em Portugal, ele vai até 2015. E no Brasil, no caso improvável desta proposta ser aprovada (o PSDB é minoritário), iria até 2016.(*)

O tal senador, que tem tido por lá mais ou menos o mesmo papel que o Graça Moura tem desempenhado por cá, justifica o adiamento com a ideia de que é preciso tempo para reformulações e detalhamentos de alguns pontos da nova ortografia. Nunca fala em abandono ou anulamento. Fala em aperfeiçoamento.

Mas claro que os idiotas da velha ortografia não perceberam nada, como sempre, e fizeram uma monumental trapalhada com base nisto. Já andam por aí a dizer idiotices como "o Brasil meteu o acordo ortográfico na gaveta," "o Brasil deu uma chapada de luva branca em Portugal" e outras coisas do género. Por causa de uma proposta de um senador.

E é assim que se revela a monumental estupidez desta gente. Não é por terem as opiniões que têm sobre o acordo. É por serem incapazes de compreender as coisas mais óbvias e nunca se coibirem de asneirar a partir dessa sua incapacidade de compreensão.

E são isto, as "elites" desta pobre terra. Alguém ainda se admira por estarmos no estado em que estamos?

(*) Segundo diz o tal senador, Dilma Rousseff aceitou a ideia e está a preparar um decreto nesse sentido, o qual dispensa a votação no senado. Não sei bem se acredite: esta malta é bem conhecida por distorcer os factos. Na verdade, tenho estado à espera do desmentido. Mas o caso de já se terem passado alguns dias e este ainda não ter aparecido dá-lhe uma certa credibilidade. A ver vamos se essa credibilidade se concretiza ou não. Seja como for, trata-se, repito, de um adiamento do momento em que a velha ortografia deverá deixar de ser usada e só disso.

4 comentários:

  1. Olá, senhor Candeias.

    Sem tom de hostilidade (sou um dos defensores da velha ortografia), venho só aqui sugerir que investigue um pouco melhor a situação. O que disse não é verdade, ainda que realmente o acordo não esteja definitivamente adiado, como muitos estão a dar a entender.

    Também acho que é de mau tom insultar toda e qualquer pessoa que defenda a ortografia antiga. Ao contrário do que os acordistas (e digo acordistas só por facilitismo, não leve a mal) dizem, a maioria de nós é contra apenas por não concordar com as novas regras. Ainda que sim, há um ou outro marmanjo que são sobretudo xenófobos. Mas na grande generalidade não é assim.

    Já discutimos antes, por isso repito que estou a dizer isto sem hostilidade. Eu sigo este blog sobretudo pelas críticas literárias, mas não consegui evitar responder pois senti-me lesado com este comentário.

    Do ponto de vista linguístico eu não entendo quem é a favor do Novo Acordo, aqui partilho a opinião Espanhola, Francesa, Inglesa, seja o que for. Ortografia não se muda por decreto.

    Tal como o senhor Candeias não entende quem é contra. É um ponto de vista tão válido quanto qualquer outro. Só peço é que no meio disto tudo não nos chame "os idiotas da velha ortografia".

    Repito, não quero com este post abrir nenhum tipo de hostilidade.

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  2. Os idiotas da velha ortografia não são todos os que a defendem. Há gente a defender a velha ortografia com opiniões legítimas e capaz de ler as coisas e entender o que está escrito. Aliás isso fica mais ou menos claro quando eu neste mesmo post digo que a "monumental estupidez desta gente" se revela "não por terem as opiniões que têm sobre o acordo" mas por "serem incapazes de compreender as coisas mais óbvias".

    Os idiotas da velha ortografia são, muito concretamente, aqueles que lá porque há uma proposta para adiamento do fim do período de transição, a qual ainda nem sequer se sabe se vai ou não ser posta em prática, vêm logo dizer idiotices como "o Brasil pôs o acordo ortográfico na gaveta". É contra este grupo muito concreto de gente que este post se dirige.

    Eu sei que não são todos. Felizmente. Mas olhe que para quem os olha desde este lado parecem ser a larga maioria dos que estão desse. Talvez por serem quem mais barulho faz, talvez por fazerem o barulho mais imbecil, e que portanto dá mais nas vistas. Talvez. Mas que parecem ser largamente maioritários, parecem.

    Já agora, do ponto de vista linguístico, ortografia só se muda por decreto. Nesses países de que fala, há instituições largamente respeitadas que decretam as mudanças ortográficas e toda a gente as segue. A Real Academía espanhola (mesmo assim com polémicas recorrentes entre os espanhóis e os latino-americanos), os grandes dicionários da língua inglesa, etc. Na língua portuguesa, infelizmente, não temos essas instituições largamente respeitadas portanto o decreto tem de ser político. E também tem de ser político porque entre nós ortografia é lei. Só poderia deixar de ser político se um dia se concordasse abolir todas as leis ortográficas, e aí teríamos boa parte dos atuais partidários da velha ortografia a atirar-se ao ar porque aqui d'el rei que querem acabar com a ortografia e deixar a língua sem rei nem roque.

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  3. Sim, realmente faz cá falta um órgão semelhante à Real Academia.

    A ideia que eu tenho é que o problema legal com o acordo é que ele estava com o estatuto de resolução, e que um decreto-lei está acima. E acima disso um tratado internacional. Mas sou um absoluto leigo nestes assuntos, confesso.

    De ambos os lados, acordistas e anti-acordistas, surge muita ignorância. Aquela parvoíce do "o cagado vai à praia de fato" é um exemplo da ignorância de alguns defensores, e os inúmeros "contatos" e "fatos" são exemplos do que infelizmente também acontece muito nos meios acordizados, a minha faculdade incluída. Sou absolutamente contra o acordo, e penso que sempre serei, mas aí é posição minha.

    Mas não reservo a mesma relatividade para uma instituição superior supostamente de renome.

    Em relação à notícia do Brasil, pessoalmente também não fico com assim tanta esperança em relação ao suposto adiamento, mesmo que se venha a concretizar. Ainda que acredite numa eventual revisão.

    Uma pergunta por mera curiosidade: Se o acordo por acaso acabasse por ser quebrado (é improvável, eu sei), o senhor Candeias voltaria a escrever com a velha ortografia?

    Ou se o Brasil decidisse não aceder ao acordo, e Portugal acabasse por ser o único país a adoptá-lo.

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  4. Obviamente que, se a ortografia voltar a mudar, eu mudarei com ela. Sou um profissional da língua. Aplico as regras a que a língua obedece. Apesar da minha posição ser globalmente favorável à nova ortografia desde que esta foi aprovada, há duas décadas, só passei a aplicá-la na vida de todos os dias quando a editora com quem trabalho me começou a pedir os textos em obediência às suas regras. Até aí usei sempre a antiga, salvo um texto ou outro que escrevi para exemplificar como na verdade poucas seriam as mudanças.

    E a ortografia voltará a mudar, mais tarde ou mais cedo. A língua evolui e a ortografia deve evoluir com ela, já para não falar dos problemas que ainda não foram resolvidos desta vez (ou eventualmente de um ou outro que a prática mostre que foi criado) e que terão de o ser um dia. Em especial o caos que eram e continuaram a ser as regras de hifenação.

    Quanto aos ses, Portugal não será o único país a adotar a nova ortografia. Nem vale a pena pensar nisso. A adoção no Brasil é neste momento mais completa do que por cá. Dias depois do tal senador se sair com esta do adiamento do fim do período de transição, a secretária da educação da Baía veio dizer que a adaptação do sistema escolar do seu estado ao acordo estava completa. Só para dar um exemplo. O Brasil não vai voltar atrás, mesmo que prolongue a transição.

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