quarta-feira, 26 de abril de 2017

Lido: O Legado de Mrs. Baker

A literatura (e não só) está cheia de histórias sobre mentores, pessoas especiais na vida dos jovens que contribuem para a sua formação enquanto pessoas. Normalmente, embora nem sempre, as histórias são contadas a partir do ponto de vista do jovem que, não raro, é o protagonista ou herói e vem mais tarde a cumprir algum destino mais ou menos grandioso que sem a influência do mentor nunca seria alcançado. Ou simplesmente a tornar-se um adulto diferente. É um velho chavão, mesmo tendo muitas vezes base em factos reais, em verdadeiros mentores que os escritores assim recordam e homenageiam.

O Legado de Mrs. Baker, novela de Maria do Vale Cartaxo, é uma dessas histórias. A Mrs. Baker a que o título faz referência é uma excêntrica inglesa que a mãe de uma dondoca tímida e adolescente resolve contratar para dar lições de inglês à filhinha. É esta última a narradora, e o livro descreve o modo como a relação entre as duas se vai desenrolando, a forma como a burguesíssima criaturinha que é a portuguesa, educada na pasmaceira salazarenta, vai de sobressalto em sobressalto aprendendo que há muito mais vida para lá daquela que conhece. E descreve sobretudo, de episódio relatado em episódio descrito, a vida aventurosa da mentora, mulher de quem se pode dizer com total propriedade que viu muito mundo.

O livro está bem escrito, pesem embora algumas fragilidades aqui e ali, e provavelmente interessará a quem goste deste tipo de história. Eu não desgosto, desde que esta espécie de enredo de passagem venha acompanhada por mais alguma coisa que me sustente o interesse. É que só a interação entre as personagens não me chega, por já estar tão vista: mentora encontra jovem, mentora influencia jovem, jovem aprende, jovem torna-se adulta incorporando os ensinamentos (os legados) de mentora, fim. OK, e depois? Preciso de mais. E aqui pouco mais existe. À boa (ou nem por isso) maneira mainstream, o fulcro da coisa é a psicologia das personagens, com o mundo exterior pintado a breves pinceladas e, no fim de contas, pouco mais que irrelevante. E apesar de ser necessário fazer a Maria do Vale Cartaxo a justiça de reconhecer que soube criar personagens consistentes, o que nem sempre acontece, essa psicologia, muito francamente, não me aquece nem arrefece.

De modo que este livro sai da leitura com o rótulo de razoável. Há certamente quem o leia com bastante mais prazer do que eu. Também deverá haver quem tenha menos. Para mim, foi uma leitura indiferente.

Este livro veio da biblioteca dos meus pais.

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