domingo, 21 de novembro de 2010

Desafio 5: Sustenta-me o olhar

O quinto desafio que me propuseram foi fazer uns versos em volta da frase "sustenta-me o olhar". E eu atirei umas memórias ao ar, misturei-as com palavras, e saiu isto:

Sustenta-me o olhar

Sustenta-me o olhar
se conseguires
porque ele é fogo, é aço, é ácido
que não corrói
é tornado em violência
que não destrói

Sustenta-me o olhar
se conseguires
porque dele nascem mundos inteiros
mares e rios, plantas e animais
e tudo o mais
e mesmo embrulhados em ligeireza
podem ser pesados demais

Sustenta-me o olhar
se conseguires
eu quero pôr-to inteiro nas mãos
para com ele fazeres
o que bem entenderes
basta para isso que sejas capaz
de me sustentares o olhar

Sustenta-me o olhar
Se não conseguires
não te esqueças de acrescentar mais uma letra
ao epitáfio do homem infeliz
Reza assim:
“quem o quis não o mereceu
quem mereceu não o quis.”

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Desafio 4: Insetos

O quarto desafio que me propuseram foi escrever uns versos sobre insetos. Quem mo propôs é uma notória bichófoba (todo e qualquer bicho, parece, não só insetos), e eu estive tentado a causar-lhe arrepios escrevendo uns versos cheios de bicharada a rastejar por cima da pele do(a) leitor(a), a ficar-lhe presa nos cabelos, a enfiar-se-lhe na roupa, enfim, estive tentado a fazer-lhe uma grande maldade.

Mas como a moça até é boa moça acabei por decidir ir por outra via, que até, quem sabe, possa mesmo chegar a contribuir para melhorar um pouco a noção de inseto que ela tem. E aqui fica o resultado:

Ah, que bom que é ser inseto

Ah, que bom que é ser inseto!
Ter mil imagens de ti nos meus olhos facetados
um milhar de lentes todas elas fitas em ti
ver-te em cores, mil elas também
construídas com azuis, vermelhos, verdes e ultravioletas
e tentar decidir se és cato ou se és flor
ou flor com espinhos, que também as há assim

Ah, como é boa toda esta queratina!
Ouvir a tua voz em estéreo ultra-surround
vibrações de jazz, dissonâncias, melodias
que através de todas as seis patas
me chegam direitinhas ao tubo cardíaco
e o obrigam a pulsar ao ritmo que definem

Ah, que delícia o teu cheiro nas antenas!
Moléculas de ti que agora me pertencem
moléculas que nem sabes que perdeste
mas que eu guardo como pedras preciosas
e que bom ter asas, poder abri-las e lançar-me à aragem
poder batê-las e lançar-me à voragem
poder orbitar-te como a Terra orbita o Sol
preso da refulgência de quem és
e alimentar-me da tua luz mascarado de girassol

Ah, tão bom, tão, tão bom é ser inseto!
Na verdade só o tamanho ma atraiçoa
por isso te escrevo estas linhas na esperança de que as leias
e assim saibas, quando por fim pousar em ti
que não pico nem aferroo, que só desejo o teu bem
e assim resistas ao instinto primeiro de todos os mamíferos
e me poupes ao destino provável de todos os insetos
o de acabar esborrachado, apanhado do chão
e deitado para o lixo sob o peso insuportável
de um esgar de nojo e inabalável repugnância

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Desafio 3: Vida

O terceiro desafio foi-me dado pelo twitter. Já agora, aproveito para esclarecer uma coisa em relação aos temas: prefiro que eles me sejam dados aqui no blogue, mas podem vir por qualquer outro meio e, seja qual for a via, é o primeiro a chegar que conta. Se me chegar mais do que um num dado dia, o segundo poderá ser utilizado se não me ocorrer nada para o primeiro; se não for fica de reserva para algum dia que não apareça nenhum desafio. E quem diz "dia" diz dois ou três, porque não vou fazer sempre isto todos os dias.

Dito isto, o tema que me chegou ontem foi a vida. Pano para mangas, não é? Pois. Mas como a inspiração não era muita fui buscar um par de versos excelentes do John Lennon e o lego seguiu a partir daí.

A Vida

A vida é aquela coisa que nos acontece
quando estamos distraídos planeando coisas diferentes
é o que fazemos mesmo se não apetece
é a soma dos sins e dos nãos, dos provavelmentes
é um navio aos tombos
e nós, os que a vivemos
os que nela nascemos e por ela morremos
de sua festa somos os bombos

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Desafio 2: O Banquete

Eu sabia que me iam logo atirar com coisas escorregadias. Acho muito bem.

Pois acontece que aqui há dias escrevi um tuito em que dava conta do meu desagrado quando me deparava com descrições pomenorizadas de comida nas minhas traduções. Dá uma trabalheira e abranda a velocidade da tradução. É uma chatice. E aqui está alguém a propor-me como tema de uns quantos versos um banquete, pois que mais havia de ser? Lembrando-se de um certo autor de que eu não digo o nome (coffgeorgerrmartincoff), mas que vai falando de comida com grande profusão ao longo da série de livros de fantasia que traduzi.

Então tá bem. Cá ficam eles, os versos sobre um banquete:

O banquete

No centro da larga mesa, uma bandeja
onde um javali se derrete em gordura
à volta gritos, risos, arrotos e bocejos
a um canto um casal enovela-se em ternura
e há quem apalpe seios entre beijos
pratos tilintam, bebe-se seja o que seja

Criados circulam por ali sem serem vistos
a menos que se estatelem, imprevistos
levam pratos vazios, trazem-nos cheios
eles ligeiros e sisudos elas num vento de chilreios
trovadores dedilham harpas e trauteiam
belas melodias que os outros só desfeiam

E junto à lareira, entre as sombras oculto
um vulto monumental de imensas barbas
entre pernas de frango e tragos de cerveja
vai observando com olhos vivos o tumulto
e murmurando “é isso mesmo, é mesmo assim”
rabisca num papel, com uma pena de marfim
“No centro da larga mesa, uma bandeja…”

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Vou precisar da vossa colaboração, meus caros

Há coisa de hora e meia, não interessa porquê, pus-me a ler os meus velhos spamemas. Para quem não acompanha este blogue há tempo suficiente, explico de que se trata: poemas, com ou sem pseudo, que fui fazendo ao longo de um ano inteiro, baseados no spam que me ia chegando à caixa do correio no dia em causa. O ano era bissexto, portanto acabaram por somar 366. Foi principalmente assim que alimentei a Lâmpada durante esse ano, e na época houve quem me dissesse que gostava.

Pois bem, agora estive a reler alguns desses spamemas, e fiquei com saudades de fazer algo do género. Mas o tempo não volta para trás, e a fase da spamesia está encerrada e não deve ser reaberta. Mas apetece fazer algo do género.

Pus-me a pensar, e acho que encontrei a solução. Peço-vos a vocês temas, títulos, frases que devem ser incluídas, e construo uns versos à volta deles e delas. O primeiro pedido é que vale, a não ser que por mais voltas que dê à cabeça não me sugira nada. O resultado aparecerá na Lâmpada no próprio dia ou nos dias seguintes, e assim que apareça está aberto o desafio seguinte.

Como é, rapaziada? Vamos nessa?

Para começar, apanhei uma amiga no messenger e pedi-lhe um tema. Ela deu-mo. E aqui está o resultado:

Cai a Lua

Cai a Lua, presa de fios invisíveis às estrelas
elásticos de noite que se esticam para o infinito
desenhando constelações assustadoras de tão belas

Cai a Lua, amarrada ao centro dos teus olhos
por girândolas de canções, alecrim aos molhos

Cai a Lua, e o céu tem pena
pois sem lua sente-se sem alma
Mas há que ter calma
há sempre a calma