quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Lido: O Rei / A Diarreia ................. O Dia Rei

O Rei / A Diarreia ................. O Dia Rei é um texto (poema, será?) de Rui Reininho, reininhamente absurdo, surreal, irónico, sobre um tal Polaroid, "malabarista maldoso", que aparentemente seria rei de qualquer coisa. O estilo é basicamente o mesmo encontrado em Sífilis e em tantas letras dos GNR; é, e digo-o correndo conscientemente o risco de me repetir, um texto absurdo, de puro nonsense, desconexo, que nunca se chega a perceber onde quer chegar, nem mesmo se quer chegar a algum lado, se tem a mínima pretensão a ultrapassar o simples malabarismo das palavras e ideias, dos trocadilhos que o próprio título exemplifica. É um estilo que não me agrada por aí além, que nem quando revestido de música alguma vez me agradou mesmo (sempre fui bem mais amigo das histórias em verso do Carlos Tê, por exemplo) e por conseguinte também deste texto não gostei lá muito.

Textos anteriores deste livro:

Lido: Inundação

Inundação, de Mia Couto, é um magnífico continho fantástico, muitíssimo poético, sobre o amor, a perda e o desgosto e vice-versa. A história até que é banal, e mesmo o ponto de vista o é: é contada na primeira pessoa por uma criança que um dia descobre a mãe em pranto porque o pai deixou de a amar. Mas está escrita de uma forma tal que toda a banalidade desaparece como que por encanto. E não é esse o único encantamento que aqui existe; há mais magia, vestidos que se enfunam e desenfunam consoante as presenças ou ausências, como metáforas de sentimentos. Maravilhoso, em mais do que um dos sentidos da palavra.

Contos anteriores deste livro:

Lido: «A Costureira»

«A Costureira» (bibliografia), de Hugo Rocha, é mais uma história fantasmagórica, aqui contada em modo de relato de história alheia, técnica bastante comum nas velhas histórias de fantasmas vitorianas e de que Rocha se socorre várias vezes ao longo deste livro (e que aqui sublinha, julgo, pelo uso de aspas no título). A história que conta é também bastante típica das histórias vitorianas: uma costureira é seduzida por um galã, que a enche de juras de amor, e abre-se-lhe, literal e figurativamente, mas não sem antes lhe fazer uma jura: se a traísse, nunca mais dela se veria livre. E, obviamente, é isso mesmo que ele faz, mas depressa descobre que a ideia não foi das melhores porque passa a ser perseguido por toda a cidade (a história passa-se no Porto) pelo tiquetaquear da máquina de costura.

É uma história bem construída, apesar de formulaica e já algo ultrapassada em estilo e tema na época em que Hugo Rocha a publica. O que a melhora é Rocha não a levar muito a sério, pincelando-a de humor, acrescentando-lhe essa nova camada de uma certa ironia.

Contos anteriores deste livro:

domingo, 27 de outubro de 2013

Lido: O Mistério da Selva

O Mistério da Selva é um pequeno conto de José Alberto Braga que acrescenta ao humor habitual, aqui transmutado em ironia mais fina do que a dos trocadilhos mais ou menos inspirados de que Braga tanto mostra gostar, uma certa dose de poesia e uma qualidade de português bem acima do que tem sido habitual ao longo do livro. Trata-se de uma fábula. Não digo sobre o que é a fábula, pois boa parte do conto reside no seu desenlace, mas digo que se passa (obviamente) numa selva que entra em periódico alvoroço quando o leão, rei da dita, vai à caça. Talvez possa também dizer que o conto é subversivo, mas só talvez. É possível que já esteja assim a dar informação a mais.

Seja como for, estas duas páginas constituem, de longe, o melhor texto do livro até ao momento.

Textos anteriores deste livro:

domingo, 20 de outubro de 2013

Quase

Já faltou mais.
Mas continuo a ter de gastar o meu tempo de fuga em viagens até muito, muito longe daqui.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Hoje

Hoje apetecia-me estar algures, bem longe. Talvez aqui.

Ou então na cama, a dormir o que não dormi durante a noite.

Mas não. Nem uma coisa nem outra.

É a vida a que temos direito, aparentemente.

terça-feira, 15 de outubro de 2013

Contas

Estive a fazer contas e há dezoito dias que não tenho descanso.

Exceto, bem entendido, quando parto para lugares longínquos.


segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Ultimamente

Ultimamente não tem havido escrita, mal tem havido leituras, tem havido apenas trabalho. Um trabalho de tal forma desgastante que quando me farto e o ponho de lado estou tão absolutamente saturado de letras vírgulas pontos finais e o raio que parta tudo o que seja linguagem que só encontro refúgio nas paisagens alienígenas de um simulador do universo, o Space Engine. Paisagens como esta.
Quando isto acabar a Lâmpada retomará o ritmo habitual. Até lá, é pouco provável que recebam mais de mim do que uma imagem destas de vez em quando.

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Falemos então um pouco mais de Portimão.

Então lá foram as eleições autárquicas. Queria e devia ter participado mais da campanha, mas estive aqui preso no chega-não-chega de um trabalho daqueles que têm de estar prontos para anteontem, e que só acabou por chegar mesmo na sexta, precisamente o dia em que a placa gráfica deste meu fiel computador, já algo idoso para um membro da aceleradíssima família informática, achou por bem entregar a alma ao criador chinês.

Foi a primeira avaria que teve, em, quê?, seis anos? Viva a pontaria. Mas adiante. Não é disso que vos quero falar.

Como era previsível, o PS voltou a ganhá-las; afinal, nunca as perdeu. Desde que há democracia, Portimão é um concelho socialista, umas vezes mais solidamente, outras de uma forma mais periclitante. Desta vez, apesar dos escândalos de corrupção e da catástrofe financeira, venceu, mesmo tendo perdido mais de metade dos votos(!). E só venceu, na verdade, porque temos este desastre de governo no país. Fosse outro o governo, fosse outra a situação, e o Partido Socialista teria com toda a certeza perdido esta câmara pela primeira vez na história. Assim, os partidos da direita só conseguiram ganhar cerca de 200 votos dos seis mil perdidos pelo PS. Os outros foram todos para a abstenção. E para os brancos e nulos. E para a esquerda, por uma vez sem exemplo.

Claro que o PS, tendo ganho as eleições, perdeu a maioria absoluta que tinha na câmara. Ficou com 3 vereadores contra 4 das outras forças concorrentes, um para cada. Antes tinha 5, contra 2 do PSD (que desce para 1). O CDS ganha um vereador, julgo que pela primeira vez na história do município, o PCP recupera o vereador que já não tinha há muito tempo, e o BE elege um vereador também pela primeira vez na história.

Na assembleia municipal, o PS, que tinha 12 deputados eleitos, trambolha até 7, a que acrescem (a ambos os números) os três presidentes das três juntas de freguesia. O PSD, que tinha 5, baixa para 4. O CDS, que tinha 1, sobe para 4. O Bloco, que tinha 2, sobe para 3. O PCP, que tinha 1, sobe para 3.

Para que vos estou a dar estes números? Já verão mais à frente.

Ao contrário do que aconteceu no país, em Portimão o Bloco portou-se muito bem. Cumpriu todos os objetivos a que se tinha proposto: contribuir para tirar a maioria absoluta ao PS, contribuir para derrotar as candidaturas de direita e reforçar a presença nos órgãos autárquicos. Foi tudo cumprido. Pela primeira vez, aliás, há eleitos pelo Bloco em todos os órgãos autárquicos do concelho, da vereação camarária às juntas de freguesia. A percentagem de votos duplicou, e a quantidade de votos quase duplicou também: acrescentaram-se cerca de mil aos anteriores mil e quatrocentos.

Para todos os efeitos práticos, um sucesso.

Mas o PS lá voltou a ganhar a câmara. E não teria de ser assim.

Porque houve quase dois mil votos brancos e nulos. Não é difícil concluir que se trata de eleitores descontentes com as candidaturas. Também com as do Bloco e do PCP, sim, mas muito em particular com as do PS e da direita. Se o Bloco tivesse conseguido captar esses eleitores, os resultados teriam sido bastante diferentes. Bastariam os nulos, o menor número dos dois (houve cerca de 800 votos nulos e cerca de 1100 brancos) para o Bloco tirar ao PSD um deputado municipal. Captando os brancos, o Bloco já teria sido a segunda força, não a quarta, embora em termos de eleitos as coisas ficassem como com os nulos. E se tivesse captado os brancos e os nulos, o Bloco tiraria um deputado municipal ao PSD e outro deputado ao PS e ainda um vereador ao PS. Captando o Bloco os brancos e os nulos, o PS ficaria com 2 vereadores, o Bloco com outros 2 e as restantes forças com 1 cada. Captando o Bloco os brancos e os nulos, o PS ficaria com 6 deputados municipais, o Bloco com 5, o CDS com 4, o PSD com 3 e o PCP com 3.

E é por isso que, na prática, exprimir descontentamento através do voto branco ou do voto nulo em vez de votar na oposição só serve para reforçar as forças políticas dominantes. E é por isso que eu tendo a chamar a esses votos a estupidez branca.

Mas não foi essa a única estupidez que impediu uma verdadeira mudança nesta cidade. A outra foi a estupidez sectária da esquerda.

O PCP, pela voz do seu secretário-geral, afirmou durante a campanha que o partido não aceita diluir-se em coligações, o que é no mínimo curioso dado o facto de se apresentar sistematicamente... em coligação. É revelador, tão revelador como ter o PCP sido o único partido de esquerda a ficar de fora da coligação que finalmente derrotou o jardinismo na cidade do Funchal.

O Bloco, por seu lado, decidiu na última convenção uma política autárquica que sempre achei estapafúrdia e a que a realidade acabou por dar resposta adequada, arrasando-a por completo. Que coligações sim, mas só com toda a esquerda. O que o deixou refém das realidades locais (em Portimão, por exemplo, uma coligação de toda a esquerda sempre foi inteiramente impossível, dado ser no PS que se concentram os vícios do poder local; noutros locais, será no PCP) e dos outros partidos, todos eles, estarem dispostos ou não estarem para coligações. Na prática, entre ter esta estratégia autárquica e dizer que o Bloco não se dissolve em coligações, à PCP, a diferença não é praticamente nenhuma.

O resultado foi que a única real vitória que o Bloco conseguiu ter nestas eleições foi no único sítio onde violou a sua própria estratégia autárquica. E que nos outros locais em que concorreu coligado teve de desaparecer, dissolvendo-se não em coligações, mas em movimentos de cidadãos, o que, por mais aspetos positivos que possa ter tido, contribuiu para fazer com que a derrota eleitoral parecesse ainda maior do que na realidade foi.

Estúpido, muito estúpido.

E se não acreditam que isto é estúpido, reparem no seguinte: em Portimão, uma coligação entre BE e PCP teria sido logo a segunda força, a apenas 1100 e 650 votos do PS, consoante se trate de votação para a câmara ou para a AM. Curiosamente, isso não teria tido reflexos diretos no número de eleitos para a câmara e a assembleia municipal, dadas algumas peculiaridades na distribuição de mandatos nestas eleições mas, com resultados um pouco diferentes, esses reflexos surgiriam. Desde logo porque uma candidatura conjunta seria logo à partida vista como uma candidatura com possibilidades reais de discutir a vitória e mudar realmente as coisas. Logo, seria uma candidatura mais capaz de captar votos que foram dados aos brancos e aos nulos, ou perdidos para a abstenção. É que bastaria captar os nulos para haver logo mudanças, não na vereação, mas na assembleia: com os nulos, uma candidatura conjunta teria vencido a AM. E bastaria captar os brancos para vencer ambas as eleições (por 10 votos a da câmara... mas por um voto se vence e se perde, como tantas vezes se diz). E aí as coisas mudariam mesmo, embora a falta de uma maioria absoluta fosse forçar a alguns compromissos.

Mas nada disto aconteceu. Em vez disso desperdiçou-se uma oportunidade talvez única (e se não for única é muito mau sinal, porque significa que a catástrofe financeira continua, que a corrupção continua) de mudar o governo desta cidade.

Reflitamos todos nisto. Nós, os que estamos nos partidos, e vocês, os que não estão, quer votem, quer não votem, quer votem nos partidos, quer votem branco e nulo.

Se queremos mesmo mudar, vamos mesmo ter de mudar.