quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

Lido: A Moura Encantada

Quando peguei neste conto para o ler, tive durante breves instantes a esperança de que finalmente, quase a fechar o volume, nele surgisse algum sinal de Algarve. É que A Moura Encantada é o nome que se dá com frequência a uma das mais célebres (e belas) lendas algarvias e podia ser que fosse essa história que aqui se contava. Mas depressa me desenganei. Adolfo Coelho era beirão de uma forma quase militante, contam-se pelos dedos as vezes que sequer se aproximou do Tejo e, se bem me lembro, nem por uma vez o ultrapassou, esta é mais uma das muitíssimas histórias que recolheu em Ourilhe e nada tem a ver com a lenda algarvia, além de haver nela uma moura e de esta estar encantada.

É uma história algo desconexa, como de resto acontece de vez em quando aos contos recolhidos em Ourilhe, que pertence ao grupo de histórias que se baseiam num encanto que deve ser ultrapassado por um conjunto de três provas. Ao ultrapassá-las com sucesso, o candidato a príncipe ou a rei demonstra o seu valor e fica pronto para desposar a donzela. O facto de esta aqui ser moura em nada altera este esquema; a história podia ser contada a respeito de uma princesa qualquer do Norte da Europa e seria praticamente igual. E isto é o que ela tem de mais interessante, pois literariamente é muito fraca.

Contos anteriores deste livro:

Também já anda por aí...

... a segunda parte de Sangue & Fogo, a minha mais recente tradução do George R. R. Martin.

E não tenho muito a acrescentar ao que disse quando foi publicada a primeira parte.Não há assim tantas coisas que sejam específicas deste segundo volume, à parte o facto de ele se debruçar sobre um período diferente, com outros protagonistas e outras personagens secundárias.

Por outro lado, o facto de se debruçar sobre um período diferente, com outros protagonistas e outras personagens secundárias, leva a uma clara mudança de tom neste segundo volume. Se o primeiro corresponde sobretudo a uma época de esperança, prosperidade e consolidação do poder Targaryen em Westeros, este fala de um período conturbado, em que a velha dicotomia entre a grandeza e a loucura na família Targaryen, que já conhecemos desde a relação entre Daenerys e Viserys n'A Guerra dos Tronos, causa um sem-fim de problemas, uma guerra civil devastadora, a morte de muitos dragões e por aí fora. Não, descansem, não são spoilers: já tínhamos ouvido falar deste período ao longo das Crónicas de Gelo e Fogo e o que aqui existe de novo são os pormenores e uma solidificação das personagens, que deixam de ser protagonistas de velhas lendas para se transformarem em pessoas tridimensionais à boa maneira do George R. R. Martin.

E por falar em personagens tridimensionais, há uma, em especial, que me deu um particular prazer a traduzir. Os leitores vão neste livro travar conhecimento com mais um dos fabulosos anões de Martin. Este, conhecido como Cogumelo (compreenderão porque lhe chamam assim), é usado pelo meistre que escreve a história como fonte primária dos acontecimentos durante as épocas mais conturbadas. Mas o Cogumelo é um bobo da corte e por isso a sua narrativa é com frequência pouco digna de confiança (ou será, pelo contrário, a mais exata de todas?) e, com mais frequência ainda, escabrosa e escandalosa. O Cogumelo é um malicioso e essa malícia é muitas vezes simplesmente deliciosa. Faz lembrar o Tyrion, sim, com o mesmo tipo de verve rápida, mas ao mesmo tempo é diferente, mais grosseiro (ainda) mais irreverente (ainda). Julgo que se vai tornar com facilidade um favorito do pessoal.

E agora, que venha o próximo. Não me perguntem é quando, que sei tanto como vocês. Quando o Martin o escrever, suponho.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

Lido: Fantasy & Science Fiction, nº 645

Embora nos ebooks exagere, uma vez que tenho coisas gravadas desde os anos 90, que ainda não li (nessa época ainda nem eram ebooks, pelo menos a maioria: eram páginas web), a verdade é que não é só em ebook que tenho coisas para ler há muito, muito tempo. A prova? Este número da Fantasy & Science Fiction, o 645, de dezembro de 2005, que anda por aí de pilha em pilha desde 2006. Há mais de 10 anos, portanto.

Contrariamente ao que por vezes acontece, no entanto, não saí da leitura a desejar tê-la feito mais cedo. Sim, é verdade que a revista inclui alguns contos bons, e portanto a leitura valeu a pena, mas não há aqui nenhum daqueles contos extraordinários que ficam realmente na memória. O que mais se aproxima disso é An Incident at the Luncheon of the Boating Party, de Allen Steele, mas só se aproxima desse objetivo, não o atinge. E nem a lista das outras histórias que me pareceram boas — Walpurgis Afternoon, The Cure e When the Great Days Came — é particularmente numerosa, sendo ultrapassadas pelas que não vão além da mediania.

Além da ficção, que compõe a parte de leão da revista, como é padrão deste tipo de publicação, este número inclui também artigos medianamente interessantes sobre livros (lançados na época, portanto já um pouco embafiados... mas aqui a culpa é exclusivamente minha) e filmes, mas tudo bastante mediano, nada que sobressaia. Saí da leitura com uma sensação de "OK, não foi mau", que é como quem diz "bem, podia ter sido melhor", que é bem capaz de ter sido amplificada pelo facto de todos os contos de que mais gostei estarem concentrados na primeira metade do volume.

Mas OK, não foi mau.

Eis o que achei dos contos individualmente considerados:
Esta revista foi comprada.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

Lido: A Aia

Ah, dramas e facas e alguidares. O que seria da literatura portuguesa sem dramas e facas e alguidares? Se perguntassem a muita gente a resposta que obteriam iria provavelmente na linha de «não seria a mesma», ou coisa do género, querendo com isso dizer que teria menos interesse do que tem. Mas estão a perguntar-me a mim, não é? E eu, concordando que não seria a mesma, acrescento que seria melhor do que é. E isso é para mim claro quando comparo este A Aia com a generalidade dos contos que ficaram para trás neste livro de Eça de Queirós.

Sim, A Aia tem abundância de dramas e facas e alguidares. E está longe de ser um mau conto, atenção! Na verdade, entre as histórias com abundância de dramas e facas e alguidares que já me passaram pelos olhos é capaz de ser das melhores. Que digo? Não é capaz coisa nenhuma; é de certeza das melhores. Mas... podia ter menos dramas e facas e alguidares e mais de outras coisas e ficaria bem melhor. A meu ver, bem entendido.

Com alguma inspiração narrativa nos contos populares e provavelmente também na história de D. Sebastião, o conto é ambientado num reino medieval em que o rei morre a combater em paragens distantes, deixando uma mulher nova e um filho e herdeiro bebé. Mas tem um irmão bastardo, maligno e ambicioso, que depressa aproveita a oportunidade para tentar capturar o poder para si. Coisa que só pode fazer matando o legítimo herdeiro, evidentemente.

Do seu lado, o rei bebé tem a mãe e uma aia, que Eça nunca chega a dizer com todas as letras que é negra apesar de o deixar claro através das várias alusões que vai espalhando pelo texto a cabelos crespos, à escravatura ou à terra de que ela é proveniente. Uma aia que tem um filho da idade do rei bebé e que, apesar de ser escrava, ama a este como se seu fosse. E Eça perde aqui uma oportunidade para ser minimamente incisivo na questão da escravatura, pois apesar de pintar a aia escrava nas cores da total bondade, dá-lhe também uma fidelidade quase canina, perpetuando assim o mito do escravo grato ao dono, do escravo que se sente merecedor da sua condição. É à volta da aia que se desenrola a toda a tragédia do conto, e não se vislumbra nela um impulso de rebeldia, muito pelo contrário. O conto está concebido de forma a fazer pingar uma lagriminha às leitoras (sobretudo, uma vez que tem como principal tema a maternidade) sensíveis em honra do destino que caiu em sorte à pobrezinha da aia, coitadinha, tão boazinha, mas sem pôr minimamente em causa nenhuma relação de poder.

E isso compreender-se-ia e aceitar-se-ia num conto publicado lá pelos idos de mil e setecentos, ou assim. Mas num conto que veio a lume em 1902? Não. Mas não mesmo. Os queirosianos que me perdoem, mas este conto deixa muito a desejar em vários aspetos importantes.

Contos anteriores deste livro:

Lido: O Pássaro de Fitcher

Mais um conto construído pelos Irmãos Grimm a partir de material-base múltiplo, este O Pássaro de Fitcher é filho de duas histórias do Hesse e conta a queda de um feiticeiro malvado que andava pelas aldeias a raptar raparigas, enfeitiçando-as. E matando-as. Até ao dia em que a rapariga que raptou era inteligente, corajosa e desembaraçada.

Trata-se de uma história interessante, "redonda" e bem feita, como de resto é hábito nas adaptações de contos tradicionais que os Grimm fizeram. Mas aquilo que achei mais curioso nela foi a enorme proximidade do seu enredo com histórias sobre assassinos em série, tanto os ficcionais como os reais. Lê-se este conto e vêm inapelavelmente à mente cenas da série Mentes Criminosas, tornando muito claro qual a realidade que se revela por detrás da fantasia. Claro que existem nela aquelas coisas típicas das histórias populares, os grupos de três, os feitiços e os feiticeiros, tudo isso. Mas parece-me claro que o substrato é uma história de assassinato em série, provavelmente bem real, que a imaginação e crendice populares pintou de magia.

Neste conto, apesar de ele próprio ter interesse, o mais interessante é a sociologia que lhe subjaz.

Contos anteriores deste livro:

domingo, 24 de fevereiro de 2019

Lido: O Preto e a Lâmpada de Santo António

Aos três ou quatro de vocês que têm seguido esta longa série de notas sobre os contos deste livro de Adolfo Coelho (eu sei, são muitas e a maioria pouco interesse têm) deverá bastar o título de O Preto e a Lâmpada de Santo António para perceberem que se trata de mais um conto racista, pois ele remete claramente para o do último conto declaradamente racista que aqui se acoita. E não se enganam. O racismo é neste um pouco menos intenso que no outro, é certo, mas está bem presente, e muito nos mesmos moldes. Mais uma vez, o protagonista preto é alguém que está em oposição a uma figura de autoridade eclesiástica, desta vez não um padre mas um sacristão, e mais uma vez o vemos quebrar as regras e ser punido por isso. Aqui, à pancada.

E no fundo por pouca coisa. O desgraçado do preto limitava-se a gostar de molhar o pão no azeite da lâmpada, e só o fazia depois de perguntar a Santo António se podia e não obter resposta. Merecia castigo? Claro que não. Mas levou na mesma com ele, em mais uma historinha muito, muito simples, muito, muito curta, e completamente vazia de elementos fantasiosos. Se não aconteceu podia ter acontecido, com racismo e tudo. E é muito, muito fraquinha.

Contos anteriores deste livro:

Lido: Undr

Muitos escritores têm temas mais ou menos obsessivos, e, em particular quando o seu género de eleição é o conto, é frequente escreverem histórias atrás de histórias que pouco mais são que variações da mesma ideia e do mesmo tema. Jorge Luis Borges é assim; são célebres os seus labirintos, os seus pseudofactuais, etc. E por isso, julgo que não será nenhuma surpresa se vos disser que este Undr também se integra num tema comum a outras histórias. Na verdade, pouco mais é que uma variação de O Espelho e a Máscara.

Ou seja, o tema das duas histórias é o mesmo: a procura da mais absoluta pureza literária (e, sim, metafísica), de uma só palavra que englobe em si o significado do Todo. E nisso ganha um ambiente fantástico, apesar de nada de explícito (alguma magia, algum súbito surrealismo que ponha em causa a substância da realidade) aproximar o conto do género. Pelo contrário o lado explícito das coisas dificilmente podia ser mais solidamente ancorado à realidade histórica, pois Borges decide recorrer a um dos seus truques habituais, apresentando o conto como transcrição de um texto (inexistente, naturalmente) do século XI. E este é apresentado como uma crónica de viagens e aventuras, como tantas houve na época e em séculos posteriores.

É um bom conto, este, mas pareceu-me que O Espelho e a Máscara é um pouco melhor, tanto como conto propriamente dito, quanto como forma de explanação das ideias que Borges procura expressar em ambos.

Contos anteriores deste livro:

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

Lido: As Viagens de Polegarzinho

Ah, mais um conto sobre o Polegarzinho. Fica assim desfeito parte do mistério que me fez estranhar o outro: parecer-me uma versão abreviada de um dos contos da minha infância. Aparentemente, o conto que eu li em miúdo foi uma fusão destes dois contos, eventualmente retirando umas partes e pondo outras. Mas só aparentemente: para ter certezas seria preciso reler aquele que para mim é o original (e já não me lembro lá muito bem de onde ele está... mas ainda deve andar cá por casa).

Mas adiante.

As Viagens de Polegarzinho, conto que já de si foi construído pelos Irmãos Grimm a partir de vários contos que, segundo eles, se complementam, é uma história de aventuras fantásticas vividas pelo minúsculo protagonista, cheio de peripécias para as suas quatro páginas. O Polegarzinho deste conto é uma personagem semelhante mas não idêntica à do outro. É menos vigarista, para começar, embora se mantenha corajoso e desembaraçado e, tal como no outro, apesar de se meter em variadíssimos assados ao longo das suas aventuras no fim acaba por se sair bem. Há nestes contos ecos do João Sem Medo, e neste há também o que me pareceu ser um eco longínquo da lenda de Jonas, aquele que foi engolido pela baleia (embora o bicho que engole o Polegarzinho seja uma prosaica vaca), e embora eu continue demasiado submerso no encanto que as histórias do Pequeno Polegar exerceram sobre mim antes mesmo de aprender a ler para ser realmente objetivo na forma como encaro estes contos, uma coisa é certa: dos mais de quarenta contos já lidos neste livro este inclui-se entre os que mais me divertiram.

Contos anteriores deste livro:

terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

Lido: A Beata e o Senhor dos Passos

Mais uma historinha com mais ar de coisa que podia ter acontecido do que propriamente de conto popular, esta A Beata e o Senhor dos Passos foi recolhida por Adolfo Coelho em Coimbra mas é mais tosca do que o normal nas histórias coimbrãs que se encontram neste livro.

É uma historieta marota que, mais uma vez, conta com a estupidez dos protagonistas (neste caso da protagonista) para funcionar. Uma beata era muito devota do Senhor dos Passos, e um sapateiro resolve aproveitar-se desse facto para, fazendo-se passar pelo alvo da devoção da beata e ajudado pelo aprendiz, se aproveitar dela. Mas as coisas só lhe correm de feição até certo ponto.

É mais uma historinha que pretende ser divertida mas só consegue ser básica. É humor à Malucos do Riso. Funciona com parte da população, claro, mas não funciona comigo.

Contos anteriores deste livro:

Lido: The 2055 Hugo Awards

A F&SF tem a tradição de apelar à criatividade dos seus leitores, organizando duas vezes por ano competições de pequenos textos, por vezes em prosa, por vezes em verso, sempre sujeitos a tema. Neste número, o tema foi The 2055 Hugo Awards, para o qual era solicitado que se imaginasse que categorias poderia haver nos prémios Hugo de 2055 e quais os prováveis vencedores. E o resultado foi bastante divertido.

Não é possível falar destes microtextos sem estragar a leitura. E sim, isto é algo a ter em conta, porque o resultado desta competição está disponível online no site da revista, aqui, e quem quiser verificar de que se trata pode fazê-lo. Todas as entradas me divertiram — incluindo a menção desonrosa, de Harlan Ellison — mas a que me levou a dar mesmo uma gargalhada foi a de Doug Mayo-Wells. Well done, sir! Não foi este autor a levar o primeiro prémio, porém; este coube a Meghan Davis. Os restantes autores premiados e publicados foram Joshua Gunter, Michael Canfield e Thornton Kimes.

Contos anteriores desta publicação:

sábado, 16 de fevereiro de 2019

Lido: O Vampiro de Nova Holanda

Ah! Agora sim. Depois de um início morno, descritivo talvez em excesso e não muito bom, eis que finalmente este livro engrena com O Vampiro da Nova Holanda (bibliografia). Apesar de ter sido alterado para se adaptar ao formato de romance-colagem, sofrendo uma expansão e a amputação de um capítulo (quando falei de A Noiva e o Vampiro mencionei que já conhecia a história e julgava que ela fazia originalmente parte de um texto mais extenso mas não me lembrava de qual; era deste), esta é essencialmente a história que deu o pontapé de saída na série dos Três Brasis e conserva as características que tornaram o original uma das melhores noveletas da história alternativa lusófona. As grandes alterações que ela sofreu, de resto, nem foram feitas para este livro; esta é basicamente a versão que apareceu na coletânea Outros Brasis, já aí expandida em novela.

Ambientada no Recife, cidade que na linha história alternativa que Gerson Lodi-Ribeiro estabelece é a capital da Nova Holanda, acompanha uma investigação, por parte de três personagens diferentes, para determinar a autoria de uma série de crimes sangrentos que teriam tido lugar na cidade velha, pobre e habitada principalmente por portugueses e seus descendentes. Entre as vítimas conta-se a "noiva de Palmares" d'A Noiva e o Vampiro, i.e., uma negra, recém-trazida de África, cujo destino é tornar-se mulher de algum habitante de estatuto elevado de Palmares, a república negra que na imaginação de Gerson se desenvolve a partir do quilombo (local de refúgio de negros livres no Brasil esclavagista colonial, ora por fuga, ora por alforriamento) de Palmares, que existiu de facto mas aqui se desenvolve num estado independente e potente, aliado dos holandeses da Nova Holanda.

O assassino, claro, é o vampiro que já encontrámos antes no livro. E há aqui um detalhe interessante: no conto original, o clima de mistério, muito bem gerado e sustentado durante a maior parte do texto, é boa parte do que propele o interesse do leitor ao longo da narrativa. É boa parte do motivo por que o conto é realmente muito bom. Esse mistério reside na identidade e na natureza do assassino e, quando elas se revelam, o impacto é fantástico. Mas a integração do conto (agora novela) num romance-colagem altera fundamentalmente essa dinâmica. Já conhecemos o protagonista quando começamos a ler esta história e a sua permanência nas sombras ao longo de quase todo o texto não impede que ele esteja bem presente na mente do leitor. O impacto ressente-se, evidentemente. E para um leitor que só conheça esta versão, neste livro, é bastante provável que ela não pareça tão boa como é na realidade.

Por outro lado, há coisas que esse facto não afeta. O naipe de personagens interessantes, por exemplo, razoavelmente bem construídas, para personagens secundárias, e divertidas. Da princesa banta que não conhece o medo ao espadachim francês, filho de Cyrano de Bergerac, que julga que sabe muito quando nada sabe, passando por um inspetor da polícia holandesa da colónia de Nova Holanda que não se chama Van Helsig, propriamente (esse nome tão bem conhecido de quem é fã das histórias de vampiros), mas se chama Van Helsing. Entre outros. Julgo que as personagens, juntamente com um enredo bem construído e movimentado nos lugares certos e um texto de qualidade, bastam para que mesmo quem não conheça a história original considere esta novela boa. Porque o é.

Contos anteriores deste livro:

Lido: O Castelo

Isto devia ficar para a opinião sobre o livro propriamente dito, mas não é fácil explicar o que é este O Castelo sem explicar primeiro o que é o livro em que vem incluído. Italo Calvino, de resto, facilita a tarefa, pois ele próprio explica na apresentação que o prefacia. O Castelo dos Destinos Cruzados é uma experiência literária composta por contos cujos enredos são dirigidos por cartas de tarot. A fim de reunir os contos num todo que se quer coerente, e à semelhança do que fez em As Cidades Invisíveis, Calvino arranja uma narrativa que os engloba. N'As Cidades, usou conversas entre Marco Polo e Kublai Kan; aqui, concebeu um viajante que vai dar a um estranho castelo onde as pessoas contam histórias.

É isso o que explica neste texto. Trata-se de uma espécie de enunciado, que apresenta o protagonista e o lugar onde ele vai dar. Um lugar fantástico; um castelo surpreendente, onde se hospeda gente estranha, e onde é impossível falar. Abre-se a boca e a voz pura e simplesmente não sai. E daí as histórias serem contadas através do recurso às cartas de Tarot. É ao mesmo tempo uma saída claramente artificiosa e engenhosa, e a qualidade literária desta espécie de introdução, bastante elevada, abre as melhores perspetivas para as histórias propriamente ditas.

Venham elas.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2019

Lido: A Morte Madrinha

Lembram-se d'O Senhor Padrinho? Foi o penúltimo conto deste livro a aparecer por aqui, portanto devem lembrar-se. Pois saibam que este A Morte Madrinha, conto que os Irmãos Grimm, nas suas habituais notas, não deixam inteiramente claro se está numa versão mais ou menos original, do Hessen, se surge em versão (re)construída por eles, pouco mais é que uma variante desse conto.

Aqui reencontramos o mesmo dilema do desgraçado do homem demasiado fértil que já não tem a quem pedir para lhe apadrinhar os filhos, aqui reencontramos a mesma subida na vida em resultado da escolha de padrinho e aqui reencontramos a mesma desgraça que surge em consequência dessa escolha. Bem, não a mesma desgraça, propriamente, mas uma desgraça. Seja como for, o enredo geral e as ideias genéricas são praticamente os mesmos, mas os pormenores divergem.

Diverge, sobretudo, a natureza de quem acaba por apadrinhar a criança. Se no outro conto era um feiticeiro, aqui a parada é mais alta, pois o homem recebe ofertas de Deus, que rejeita, do Diabo, que também rejeita, e finalmente da Morte, que aceita, sempre com ótimos argumentos. Mas como um conto cautelar não pode ser um conto cautelar sem que as coisas corram terrivelmente mal, é o que acontece aqui. Este é um conto interessante. Não muito, mas interessante.

Contos anteriores deste livro:

Lido: Conto do Fuso

Recolhido por Adolfo Coelho em Oliveira do Douro, este O Conto do Fuso é mais um dos muitos contos no fim deste livro que não só não têm qualquer elemento fantástico, como estão também desprovidos de boa parte daquilo que transforma um texto num conto, mais parecendo relatos mais ou menos atabalhoados de acontecimentos reais. Mesmo que, como neste caso, esses acontecimentos sejam algo inverosímeis.

Gira aqui a narrativa em volta de uma mulher preguiçosa, que devia fiar mas não fiava, enchendo-se de desculpas para não o fazer. Normalmente a desculpa envolvia fusos quebrados. E o marido, desgraçadinho, ia-lhe arranjando novos fusos, uns atrás dos outros, até que se fartou e meteu na cabeça que haveria de cortar um pinheiro e mandar fazer um de encomenda. Só que não era nenhum génio, o pobre homem, para não dizer que era parvo, e não houve nada que não lhe corresse mal nesse empreendimento.

Como facilmente se percebe, é mais um continho que pretende ser divertido, mas que também tem aspirações a história cautelar patriarcal. Não te cases com mulher preguiçosa, parece dizer, porque vais sofrer com isso. Mas essa mensagem dilui-se com a estupidez do marido; afinal de contas, ele não sofreria nem um décimo do que aqui sofre se não fosse tão palerma. O resultado é uma historinha tosca que nem consegue transmitir capazmente a moral da história que procura transmitir.

Contos anteriores deste livro:

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

Lido: Os Dois Mentirosos

Os Dois Mentirosos é mais uma historinha sem nenhum elemento fantástico, as quais, como de resto já disse por aí, parecem tornar-se mais abundantes à medida que este livro se encaminha para o fim. E esta é das que trazem consigo um certo sabor a coisa acontecida, a episódio verdadeiro.

Conta como dois irmãos muito pobres arranjaram maneira de vigarizar os povos das aldeias, fingindo um trazer grandes novidades, que contaria a troco de dinheiro, e confirmando o segundo essas novidades depois do primeiro se ir embora. E é só isso. Nada sobre o destino que levaram os irmãos, nenhum moral na história, apenas menos de uma página sobre uma vigarice campestre que podia perfeitamente ter acontecido, apesar da extravagância das histórias que os irmãos teriam contado.

Este é mais um conto com potencial para expansão; poderia resultar num conto interessante, coisa que não é tal como aqui está.

Contos anteriores deste livro:

Lido: O Espelho e a Máscara

Às vezes até parece que nestes últimos tempos, desde que me lancei à leitura de contos tradicionais, a estrutura e ambiente dessas histórias me perseguem. Encontro-as nos livros de histórias tradicionais, obviamente, mas também já as encontrei no livro do Eça que tenho andado a ler e agora encontro-as outra vez neste livro de Jorge Luis Borges.

Pois O Espelho e a Máscara é um conto bastante curto, fundamentalmente sobre a natureza da literatura, que vai buscar às histórias tradicionais, acima de tudo, o número três como esqueleto estrutural. Conta a história de três encontros entre o Alto Rei da Irlanda e um seu poeta, no primeiro dos quais o primeiro encomenda ao segundo uma obra capaz de imortalizar a sua vitória sobre os noruegueses. Um ano depois, o poeta entrega a obra mas, pese embora a sua perfeição estilística, ela é recusada por nada conter de seu, ser composta apenas por empréstimos de outros autores. Apesar da recusa, o rei recompensa o poeta com um espelho de prata. E um ano mais tarde lá regressa o poeta com nova obra, bem diferente, mais curta, original, perturbada e perturbadora. Esta o rei não recusa mas, enquanto recompensa o poeta com uma máscara de ouro, vai dizendo que sabe que o poeta é capaz de produzir algo melhor ao mesmo tempo que é introduzido no texto um elemento metaliterário, pois o rei diz que os dois são "figuras de uma fábula e é justo recordar que nas fábulas prima o número três". E lá vai o poeta e regressa um ano depois com uma terceira obra, um poema de uma só linha que só se atreve a murmurar em privado ao rei por grande insistência deste. Porque este último poema, recompensado com uma adaga, é o resultado da depuração da literatura até à perfeição, e isso é fatídico para ambos.

Este é outro conto excelente. Não lhe chamarei perfeito, até porque tem mais que uma linha, mas é um conto capaz de revelar como poucos a atitude que Borges tinha para com a literatura; A sua ideologia literária, chamemos-lhe assim. E fá-lo indo beber precisamente à mais profunda e antiga fonte da literatura: as histórias populares. O que constitui um nível de leitura em si mesmo mas ganha novos significados quando é combinado com o que vem escrito no conto. Borges gostava de labirintos, como é sabido, e aqui construiu um labirinto metaliterário de primeira qualidade.

Contos anteriores deste livro:

domingo, 10 de fevereiro de 2019

Lido: A Senhora Trudes

Embora muitos dos contos dos Irmãos Grimm sejam mais desenvolvidos do que os que se encontram na compilação do Adolfo Coelho, até por causa do costume que os alemães tinham de fundir e desenvolver as histórias que recolhiam, este livro não deixa de ter também historinhas muito pequenas e muito básicas. A Senhora Trudes, com menos de uma página de extensão, é uma dessas histórias.

Trata-se de um conto cautelar sobre o que pode acontecer às meninas teimosas que não obedecem aos pais. No caso da menina do conto, que meteu na cabeça que haveria de ir visitar a Senhora Trudes, contra a proibição dos pais, e claro que isso lhe foi fatal, que a Trudes era bruxa.

Esta é mais uma história com mais interesse sociológico que literário, pois literariamente é bastante fraca e previsível.

Contos anteriores deste livro:

Lido: A Senhora da Graça

A diferença entre conto popular e anedota nem sempre é fácil de avaliar, mas este A Senhora da Graça, recolhido por Adolfo Coelho em Coimbra, parece-me cair claramente na segunda categoria. Trata-se de uma daquelas anedotas que só funcionam porque os seus protagonistas são hilariantemente estúpidos, pois conta a história de um homenzinho que se deixa enganar pela mulher bêbada, a qual teimava que não tinha sido ela mas a gata a beber uma garrafa de vinho e o convenceu de que a Senhora da Graça haveria de lhe contar a verdade. Nem vos conto como.

Com menos de uma página, como qualquer anedota que se preze, é uma historinha sem quaisquer elementos fantásticos, por mais que o parvo que a protagoniza possa julgar o contrário. Razoável.

Contos anteriores deste livro:

Leiturtugas da semana

Não estava previsto, mas apeteceu-me. E afinal sempre tenho qualquer coisa para apresentar esta semana às leiturtugas, mais um dos contos em ebook publicados pelo DN. Trata-se, desta vez, de um conto fantástico do Nuno Markl, com o ribombante título de A Terrível Criatura Sanguinária. Não tem FC, pelo que o meu grau de avanço no projeto está agora em 2c3s.

E mais uma vez não fui só eu a participar nisto, porque a Tita também se estreou no projeto, e logo com opiniões sobre três contos de FC (ou com FC) publicados no Fantasy & Co.: A Filha da Peste, de Carina Portugal, Os Jardins Suspensos da Babilónia, de Leonor Ferrão, e O Artefacto, de Pedro Pereira. E a Tita, que escolheu participar só no Leiturtuguinhas, acabou de cumprir os mínimos do ano da parte com FC, graças a estas 3 leituras. Notação: 3c0s. Desconfio que vai passar ao nível acima.

Já agora, a Tita é youtuber, estendeu-se mais nas opiniões no vídeo que em texto, e aí pede sugestões para leituras futuras. Agora que já comecei a perceber quais são os seus gostos, posso sugerir-lhe que:

1) Procure textos mais extensos. Podem não ser romances; mas há noveletas e novelas que já incluem o tipo de desenvolvimento que ela prefere, e há algumas dessas obras online. Não sei que dimensão têm os textos do Fantasy & Co., que ainda não me dediquei a recolher esses dados, mas no Bibliowiki, nas fichas sobre os autores, as histórias estão divididas em miniconto, vinheta, conto curto, conto, noveleta, novela e romance. Aconselho à Tita procurá-las de noveleta para cima. Esta tabela pode ser-lhe útil, porque inclui não só a nacionalidade dos autores mas também o número de obras presentes no Bibliowiki, de cada um e em cada categoria. Há bastante material que ainda não está no wiki, pelo que não entra nessas contas, mas pode ser um bom ponto de partida;
2) Na parte FC da coisa não creio que tenha percebido os gostos dela bem o suficiente para fazer sugestões concretas, pelo que o único conselho que acho dever dar-lhe é: explore mais. A FC é vasta, com uma grande quantidade de estilos e abordagens, e mesmo na portuguesa, que é muito anémica quando comparada com outras, essa variedade existe. O mais certo é que uma parte desses estilos, talvez até a maioria, não lhe agrade mesmo, mas muito me surpreenderia se nenhum o fizesse.

E faço estas sugestões aqui porque podem ser úteis não só à Tita mas a outras pessoas com gostos mais ou menos semelhantes aos dela.

sábado, 9 de fevereiro de 2019

Lido: Ciência, Sabedoria e Capacidade

Comediazinha de costumes de uma página, este Ciência, Sabedoria e Capacidade tem um nome demasiado pomposo para o que é, embora até faça sentido depois de se ler a história. Recolhido, mais uma vez, por Adolfo Coelho em Lisboa junto de alguém oriundo de Almeida, parece um enredo daqueles teatrinhos revisteiros que continuam até hoje a divertir quem gosta dessas coisas. Fala de um marido espertalhão com uma mulher linda e cobiçada, que arranja maneira de envergonhar os cobiçadores (pelo menos três deles) com a cumplicidade da mulher. Suponho que divirta quem gosta destas coisas, apesar da sua extrema brevidade. Pessoalmente, dispenso.

Contos anteriores deste livro:

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Lido: A Terrível Criatura Sanguinária (#leiturtugas)

Há na literatura uma técnica com alguns exemplos famosos, a que eu gosto de chamar "escrever em cebola", uma expressão assumidamente irreverente que designa a introdução de histórias dentro de histórias, eventualmente dentro de histórias e dentro de histórias. O mais célebre texto "em cebola" que conheço é o romance Drácula, de Bram Stoker, mas não é preciso usar extensões longas para o fazer. Na verdade, muitos contos de fantasmas do século XIX e início do século XX também são contos "em cebola", pois neles encontramos com frequência depoimentos de alguém que ouve outra personagem contar uma história inacreditável e a regista, ou que conta a um grupo de amigos alguma história ouvida a um outro amigo ou lida algures.

Pois bem: este A Terrível Criatura Sanguinária, de Nuno Markl, é um conto em cebola com duas camadas. Na camada exterior, estamos perante um conto mundano sobre as lutas entre um escritor e o seu editor, mais interessado em vender as histórias da moda do que naquilo que o candidato a autor publicado quer exprimir. Na camada interior, temos a história que esse escritor escreve: uma fantasia urbana sobre, lá está, uma terrível criatura sanguinária. Que terrível criatura sanguinária? Bem, a personagem, que é assim uma espécie de alter ego do autor, que por sua vez se parece muitíssimo com um alter ego do Nuno Markl (lá está: cebola) é um banalíssimo humano num mundo cheio de muito sexys lobisomens e vampiros, e ressente-se disso. Portanto também quer transformar-se em monstro, para ver se fica sexy e apimenta a relação com a mulher. E consegue. Em parte. Mas claro que, sendo o Markl quem é, a parte que não consegue corre francamente mal.

É um conto engraçado e interessante, apesar de estar demasiado preso à persona habitual do Markl para que eu o ache realmente bom. Consequências de anos e anos de exposição pública; a novidade já é pouca, e quase tudo se torna mais ou menos previsível. Mas para mim, este conto tem a curiosidade acrescida de parecer que dois dos contos que escrevi em 2012 para o Infinitamente Improvável (Uma História Verdadeira, Segundo Quem a Contou e Quem Quer Ser Super-Herói?) fizeram tórrido amor um com o outro e tiveram um filho. Parece-me infinitamente improvável que tenha havido alguma espécie de inspiração cruzada entre uns e outros, até porque o Markl publicou o seu também em 2012, em dezembro, muito pouco tempo depois dos meus serem postos online, mas há vários pontos de contacto entre os meus contos e este.

Lido: O Burro do Azeiteiro

Mais anti-intelectualismo. Neste conto recolhido por Adolfo Coelho em Lisboa junto de alguém oriundo de Almeida, temos dois estudantes sem dinheiro que resolvem passar a perna a um azeiteiro que se revela tão idiota como os estudantes são desonestos. A ideia é roubarem O Burro do Azeiteiro, vigarizando o dito azeiteiro e vendendo depois o burro, o que só conseguem fazer porque o azeiteiro não tem dois neurónios a que possa chamar de seus. Sim, o conto pretende ser divertido, uma comédia de costumes sem qualquer elemento fantástico, mas a mim mais depressa levanta questões do que os cantos à boca.

Parece-me claro que existe uma componente de classe nestas histórias em que os estudantes são sistematicamente retratados ora como estúpidos, ora como desonestos. Um fundo de contestação surda aos privilegiados que estão a caminho de ser doutores. Também há um fundo de verdade nelas, pois a típica (e secular) boémia estudantil presta-se a certo tipo de comportamentos, como bem sabe qualquer pessoa que tenha passado por uma universidade. Mas a boémia não é, nem nunca foi, exclusiva da classe estudantil. E julgar-se-ia que à medida que a educação se fosse aproximando da universalidade (e hoje está-o muito mais do que estava no século XIX, apesar de propinas e outros escolhos no caminho) esta tendência anti-intelectual se fosse atenuando e sendo substituída por outras formas mais racionais de luta de classe. Mas tudo indica que não, que só tende a incentivar-se. E a questão é: porquê? O que leva tanta gente a ter autêntico ódio (francamente perigoso porque promove todos os tipos de estupidez) de quem tem alguns conhecimentos técnicos?

Esta é uma questão a que conviria dar resposta com a máxima rapidez.

Contos anteriores deste livro:

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

Lido: Adão e Eva no Paraíso

Já o disse anteriormente e repito agora: Eça de Queirós, quando envereda pelo fantástico, usa quase sempre como base a mitologia cristã. Os exemplos são múltiplos, mas este Adão e Eva no Paraíso é dos mais claros, pois não deixa qualquer dúvida logo a partir do título.

Trata-se de um conto ao mesmo tempo bíblico ao ponto de ser beato e levemente herético, de uma forma que faz lembrar um pouco as aventuras de Saramago pelo mesmo tipo de inspiração. Escusado será dizer que está muitíssimo bem escrito. Quanto ao enredo, recua ao Génese, apresentando-nos a vida de Adão, primeiro, e mais tarde de Adão e de Eva no Paraíso, o jardim do Éden, onde todos os animais conviveriam numa paisagem de abundância, não pacificamente, como rezam certas histórias, mas com a violência e a luta pela sobrevivência que se encontram hoje em dia no mundo natural (e se encontraram sempre, na verdade, pelo menos desde que na sopa primordial surgiu o primeiro consumidor).

O Adão de Eça, contudo, não é o Homo sapiens perfeito (e branco, e louro) que certas histórias cristãs apresentam como tendo sido criado à imagem e semelhança da divindade. Pelo contrário, é um brutamontes, amacacado, hirsuto e de testa baixa, recém descido das árvores. Eça parece esforçar-se por conciliar os mitos de origem abraâmicos com o que já no seu tempo as ciências naturais tinham descoberto sobre a verdadeira origem humana (e das outras espécies), e há no conto uma espécie de seleção natural acelerada e uma alteração ultrarrápida de formas à medida que o ambiente o exige. É muito mais lamarckiana do que darwinista, claro, mas mesmo assim afasta-se de algumas ortodoxias cristãs. Talvez tanto quanto o tempo e a tacanha sociedade portuguesa da época lho permitiam.

E é essa espécie de evolução que o conto conta, em especial depois de Eva se lhe ter juntado e provado o fruto da sabedoria. E poderia ficar-se por aí mas, convenhamos, pouco adiantaria face a histórias já mais que conhecidas por todos os que tenham crescido mergulhados numa cultura que, por mais alternativa que seja a educação que receberam, não deixa de ser muito cristã. Talvez por isso, Eça remata esta sua história com uma pergunta, no fundo a mesma que o levara a escrever Civilização: valeu a pena? Estamos melhor assim, plenamente civilizados e cheios de conhecimentos, ou estaríamos melhor sendo amacacados e trogloditas mas plenamente integrados no mundo natural? Não dá uma resposta expressa, mas não é difícil perceber que a sua opinião é que estaríamos melhor não sendo o que somos. De novo o ludismo queirosiano desponta, e de novo me repele. Este conto é bom, sim, mas deixou-me uma certa amargura na boca.

Contos anteriores deste livro:

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Em janeiro falou-se de...

Segundo ano a fazer isto, mês número um. E ao fim de um ano, finalmente, finalmente, o número de comentários a obras portuguesas ultrapassou os 10. Finalmente! Nem tudo foi leiturtugas, obviamente, mas sim, o nosso projeto teve impacto.

Mas antes, a conversa habitual, para os que caírem aqui pela primeira vez. Para saberem o que é isto, para que serve, quais as suas limitações e por aí fora, dêm um salto ao primeiro destes posts, que lá está tudo explicado. E quem quiser dar uma vista de olhos não só por este, mas pelos restantes, tanto os que o antecederam como os que a seu tempo lhe sucederão, é só visitar a tag leituras fc, que está lá tudo. E no fim deste post estão algumas notas sobre o que foi comentado este mês.

E siga para as listas.

Ficção portuguesa:
  1. A Mina do Deus Morto, de João Barreiros (conto)
  2. Crazy Equóides, de João Barreiros
  3. O Saque de Lampedusa, de João Barreiros (conto)
  4. O Dia em que o Mar Desapareceu, de José Carlos Barros (conto)
  5. Ecologia, de Joana Bértholo
  6. Estás Livre no Sábado?, de António Ladeira
  7. Yazik, de Emanuel R. Marques (conto)
  8. Floresta de Homens, de Valter Marques (conto)
  9. Por Este Mundo Acima, de Patrícia Reis
  10. Antologia de Ficção Científica Fantasporto, org. Rogério Ribeiro
  11. A Guardiã da Espada, de Bruno Martins Soares
  12. Laura and the Shadow King, de Bruno Martins Soares
Ficção brasileira:
  1. A Mão que Pune, de Octavio Aragão
  2. Sobre a Imortalidade de Rui de Leão, de Machado de Assis (7x)
  3. Sob a Luz da Escuridão, de Ana Beatriz Brandão (4x)
  4. A Guia, de Évany Cristina Campos (2x)
  5. O Viajante do Céu, de Bruno Capellano
  6. O Teorema das Letras, de André Carneiro
  7. Mestre das Marés, de Roberto de Sousa Causo
  8. Selva Brasil, de Roberto de Sousa Causo
  9. Oneironautas, de Fábio Fernandes e Nelson de Oliveira
  10. As Coisas que Encontramos, de Denise Flaibam
  11. Deus, o Diabo e os Super-Heróis no País da Corrupção, de Fernando Fontana
  12. Crystallo, de Raphael Fraeman
  13. Infinito em Pó, de Luís Giffoni
  14. A Ascensão da Trindade, de Jefferson Lessa
  15. O Macaco que se Fez Homem, de Monteiro Lobato
  16. Omnes Viae, de P. H. Ludwig
  17. Muito Além das Rosas, de Camila Martins
  18. Casulos, de Ricardo Mesquita
  19. Escuridão, de Alexandre Moreira (2x)
  20. A Segunda Pátria, de Miguel Sanches Neto (2x)
  21. Fractais Tropicais, org. Nelson de Oliveira (3x)
  22. A Era dos Mortos, parte 1, de Rodrigo de Oliveira
  23. Pseudônimo Mr. Queen, de Loraine Pivatto
  24. Peixeira&Macumba, de Pablo Amaral Rebello
  25. Crepúsculo Matutino, de Gerson Lodi-Ribeiro (conto)
  26. O Anel de Tekarin, de T. L. Sophie (conto)
  27. Heróis de Novigrath, de Roberta Spindler (2x)
  28. O Reino de Zália, de Luly Trigo
Ficção angolana:
  1. A Vida no Céu, de José Eduardo Agualusa
Ficção internacional:
  1. Contactos con Alienígenas, org. ??
  2. El Planeta Loco, org. ??
  3. El Tiempo no Es Tan Simple, org. ??
  4. O Guia do Mochileiro das Galáxias / À Boleia Pela Galáxia, de Douglas Adams (2x)
  5. O Poder, de Naomi Alderman (2x)
  6. Obsidiana, de Jennifer L. Armentrout
  7. Ônix, de Jennifer L. Armentrout
  8. Opala, de Jennifer L. Armentrout
  9. Opostos, de Jennifer L. Armentrout
  10. Originais, de Jennifer L. Armentrout
  11. Eu, Robô, de Isaac Asimov
  12. Fundação, de Isaac Asimov (2x)
  13. Coma e Emagreça com a Ficção Científica, org. Isaac Asimov, George R. R. Martin e Martin H. Greenberg
  14. The Peculiar, de Stefan Bachman
  15. Matem o Presidente, de Sam Bourne
  16. The City of Silence, de Ma Boyong (conto)
  17. Farenheit 451, de Ray Bradbury
  18. A Chegada em Darkover, de Marion Zimmer Bradley
  19. Despertar, de Octavia E. Butler
  20. Kindred: Laços de Sangue, de Octavia E. Butler (2x)
  21. A Rapariga que Sabia Demais, de M. R. Carey
  22. A Seleção, de Kiera Cass
  23. A Vida Compartilhada em uma Admirável Órbita Fechada, de Becky Chambers
  24. Los Mejores Relatos de Ciencia Ficción, org. Groff Conklin
  25. Vírus, de Robin Cook
  26. Vox, de Christina Dalcher (6x)
  27. Dinosaurios, org. Jack Dann e Gardner Dozois
  28. Alice no País das Armadilhas, de Mainak Dhar
  29. Espere Agora Pelo Ano Passado, de Philip K. Dick (2x)
  30. O Homem do Castelo Alto, de Philip K. Dick
  31. Ubik, de Philip K. Dick
  32. O Mundo Perdido, de Arthur Conan Doyle
  33. Terra das Mulheres, de Charlotte Perkins Gilman
  34. Metrô 2033, de Dmitry Glukhovsky
  35. Desafiando as Estrelas, de Claudia Gray
  36. Uma Coisa Absolutamente Fantástica, de Hank Green (9x)
  37. A Mão Esquerda da Escuridão / A Mão Esquerda das Trevas, de Ursula K. Le Guin (3x)
  38. O Colar de Semley, de Ursula K. Le Guin (conto)
  39. Humor Cósmico, org. Joe Haldeman
  40. O Mapa do Tempo, de Heidi Heilig
  41. A Terra da Noite, de William Hope Hodgson
  42. A Quinta Estação, de N. K. Jemisin
  43. O Portão do Obelisco, de N. K. Jemisin
  44. Flores Para Algernon, de Daniel Keyes
  45. A Dança da Morte, de Stephen King
  46. Celular, de Stephen King
  47. A Balada do Black Tom, de Victor LaValle
  48. Justiça Ancilar, de Ann Leckie
  49. Os Contos Mais Arrepiantes de Howard Philips Lovecraft, de H. P. Lovecraft
  50. O Corpo Dela e Outras Farras, de Carmen Maria Machado
  51. Estilhaça-me, de Tahereh Mafi
  52. Caminhos do Espaço, de Charles Eric Maine
  53. Caixa de Pássaros / Às Cegas, de Josh Malerman (5x)
  54. Renegades, de Marissa Meyer
  55. Railsea, de China Mièville
  56. The Scar, de China Mièville
  57. Os Escolhidos, de Kass Morgan
  58. 1Q84, de Haruki Murakami
  59. Quarta-Feira Submersa, de Garth Nix
  60. 1984, de George Orwell (3x)
  61. Máquinas Mortais, de Philip Reeve
  62. O Mapa de Ossos, de James Rollins
  63. Calamidade, de Brandon Sanderson
  64. Skyward, de Brandon Sanderson
  65. 2084, de Boualem Sansal
  66. Encarcerados, de John Scalzi
  67. A Nuvem, de Neil Shusterman
  68. Moscas, de Robert Silverberg (conto)
  69. O Homem que Jamais Esquecia, de Robert Silverberg (conto)
  70. A Lente de Marbury, de Andrew Smith
  71. Piquenique na Estrada, de Irmãos Strugatsky
  72. A Volta ao Mundo em 80 Dias, de Jules Verne
  73. Vinte Mil Léguas Submarinas, de Jules Verne
  74. As Sereias de Titã, de Kurt Vonnegut
  75. Cama de Gato, de Kurt Vonnegut
  76. The Mammoth Book of Steampunk, org. Sean Wallace
  77. O País dos Cegos e Outras Histórias, de H. G. Wells
  78. Interferências, de Connie Willis
  79. Golden State, de Ben H. Winters
Não-ficção brasileira:
  1. Diário de Blindness, de Fernando Meirelles
  2. A Idade da Ignorância, de Braulio Tavares
Não-ficção internacional:
  1. 21 Lições Para o Século XXI, de Yuval Noah Harari
  2. Universo Alien, de Don Lincoln
  3. The Science Fiction Book: An Illustrated History by Franz Rottensteiner, de Franz Rottensteiner
  4. 2062: The World that AI Made, de Toby Walsh
Pois é. Finalmente, finalmente, temos, nos comentários a ficção portuguesa, um número que já me parece aceitável: 12. E, mais importante do que isso, também o seria mesmo sem a contribuição do que vou publicando aqui na Lâmpada, pois sem mim haveria 10 comentários. É, claro, o projeto Leiturtugas a fazer o seu efeito, embora nem todas as leituras venham daí, como de resto seria sempre não só natural como desejável. Dois autores estão em destaque: João Barreiros, com três leituras, e Bruno Martins Soares, com duas. Se continuarmos assim, pelo menos, já fico mais contente.

Mas, curiosamente, quem realmente se portou bem este mês foram os brasileiros. Depois de terem chegado a ter menos de 10 opiniões durante um mês, e de se andar durante muito tempo com menos de 20, este número não só é agora ultrapassado pelo terceiro mês consecutivo, como foi este o mês com mais títulos lidos, 28, e isto acontece com muito pouca participação minha, para variar. Mais ainda: foram vários os títulos com múltiplas leituras, algo que é comum nas leituras de traduções mas tem sido bastante raro nas lusófonas. Também é curioso só haver um título por autor, i.e., essas 28 opiniões correspondem a outros tantos autores. Destaques para Machado de Assis, com 7 opiniões, Ana Beatriz Brandão com 4 e Nelson de Oliveira com 3.

Quanto aos comentários à ficção traduzida, parecem ter estabilizado em volta dos 80 títulos, por vezes um pouco mais, por vezes um pouco menos. Hank Green voltou a ser o mais lido, com 9 comentários ao seu romance juvenil, seguido por Christina Dalcher, com 6 comentários à sua distopia. Jennifer L. Armentrout, com um comentário a cada um de 5 livros, e Josh Malerman, com 5 comentários ao seu livro famosamente adaptado ao cinema, também estiveram em destaque. Dick, desta vez, não chegou aos 5 comentários; ficou-se pelos 4, a 3 títulos diferentes. E Le Guin também teve 4 comentários, mas apenas a 2 obras.

Vamos prosseguir este bom rumo no mês de fevereiro? Duvido — estas coisas têm sempre oscilações — mas não será difícil ultrapassar largamente o número de comentários às ficções lusófonas que houve em fevereiro do ano passado: 6 a brasileiros e... 1 a portugueses. Daqui a um mês, veremos.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Lido: A Velha Fadada

Mais uma história cheia de bons sentimentos, esta A Velha Fadada, recolhida por Adolfo Coelho em Coimbra. E se julgam que estou a falar a sério, pois saibam que estou, da forma mais sarcástica possível.

Pois que há duas velhas manas que queriam casar, vá-se lá saber porquê. Mas ninguém as queria, porque não só eram velhas como eram muito feias. Uma delas, desesperada, enche-se de coisas postiças e lá consegue levar um homenzinho ao engano. Mas ele, como era boa pessoa, assim que percebeu que a velha com que tinha casado era feia como tudo, atirou-a da janela abaixo. Claro. E lá fica a velha pendurada a noite inteira, que pelos vistos não era por ser velha que não tinha força nos braços. Vai daí, duas fadas têm pena dela, as cabras, e dão-lhe uma cara linda, linda, linda. E claro que o marido agora já a quer e catrapumba. A irmã é que achou aquilo espantoso e também quis. Pergunta à irmã ex-feia o que lhe aconteceu, ela responde baixinho que foi fadada, a mana velha e surda percebe esfolada e lá vai ao barbeiro para que a esfole, o que ele faz e ela morre. E acham que a mana ex-feiosa sofre com isso? Ná! Agora tem marido, quer lá saber.

Um conto de fadas ternurento, portanto, cheio de romance e coraçõezinhos palpitantes. Uma doçura pegada. Tirando isso, está razoavelmente bem estruturado, com início meio e fim, o que não deixa de ser um ponto a seu favor. E, espremendo-o, é capaz de dar algum sumo, embora eu não garanta a palatabilidade desse sumo. Podia ser pior.

Contos anteriores deste livro:

domingo, 3 de fevereiro de 2019

Lido: O Senhor Padrinho

Há leves sugestões do mito faustiano neste conto dos Irmãos Grimm, cujo tema são as desventuras de um pai particularmente fértil, com tantos filhos que já não encontra nenhum homem na aldeia que ainda não tenha sido padrinho de um deles. Desesperado, pede ao primeiro desconhecido por que passa para apadrinhar o último e isso tem consequências.

No entanto, essas sugestões são só leves. A atmosfera do conto é infantil, pelo que não dá para grandes aprofundamentos filosóficos. O conto divide-se em dois momentos, o primeiro em que o problema do pai é apresentado, o apadrinhamento é realizado e o pai ganha capacidades curativas em resultado dele e um segundo, em que o pai visita a casa do padrinho. E é aí que O Senhor Padrinho é apresentado como um homem estranho, cuja casa está cheia de bizarrias mágicas, pelo menos na aparência, as quais são por ele explicadas de forma naturalista. Com uma exceção: o pai vê-o pelo buraco de fechadura com uns grandes (e demoníacos?) cornos, coisa que ele nega de forma taxativa.

Não sendo propriamente um bom conto nem um conto especialmente elaborado (o que seria difícil em menos de duas páginas) esta história tem interesse como exemplo de como uma ideia complexa pode ser simplificada ao escrever para crianças, deixando-se apesar disso entrever quando o resultado é lido por adultos.

Contos anteriores deste livro:

Leiturtugas da semana

Voltaram a ser minhas as primeiras leiturtugas desta semana, graças às numerosas leituras de contos em ebook que tenho feito este mês. Primeiro comentei A Queda de um Anjo, um conto fantástico de Afonso Cruz. Dias depois, comentei o conto (que acho que atinge a dimensão de noveleta, mas não verifiquei) A Princesa do Gelo, uma fantasia amalucada de Manuel João Vieira. Ambas são leituras sem FC, pelo que estou com 2c2s. E falta-me apenas uma leitura com FC e outra sem para cumprir o objetivo do semestre. Yay!

Mas as leiturtugas não foram só minhas, pois esta semana também coube a vez do Marco Lopes se estrear neste projeto com a sua opinião sobre Anjos, um romance de FC de Carlos Silva publicado pela Divergência. O Marco está, pois, com 1c0s.

Haverá mais para a semana? Pela minha parte, não. Pela vossa? Veremos.

sábado, 2 de fevereiro de 2019

Lido: Comera um Bocadinho se Tivera Limão...

Um dos aspetos daninhos mais duradouros dos contos de fadas é a tendência que tantos deles mostram para apresentarem o amor como um arrebatamento instantâneo gerado pela mera beleza, quase sempre das donzelas, muitas vezes também dos donzéis. À conta disso, não só gerações de coraçõezinhos românticos se gastaram na espera por um príncipe ou princesa encantada capaz de os levar a tal arrebatamento, como a ideia transbordou dos contos de fadas, infetando muitos outros géneros narrativos com amores instantâneos. E nem é preciso juntar água.

Pelo introito acima já se percebe que este Comera um Bocadinho se Tivera Limão..., conto recolhido por Adolfo Coelho em Lisboa e significativamente mais elaborado do que é frequente encontrar-se neste livro, é um conto de amor instantâneo à Cinderela.

E claro que tem de haver dificuldades. A donzela tem de ultrapassar a oposição do pai conde, que a pretende guardar para si, e o donzel príncipe só consegue encontrar a sua amada graças aos bons ofícios (bons, mas bem pagos) de uma fada. Não há aqui sapatinhos de cristal nem coches de abóbora, mas há um discretíssimo transporte da rapariga até junto do príncipe e depois um jogo de sedução feito de rimas, o qual acaba com um beija-mão coletivo, durante o qual o príncipe reencontra a sua amada. É uma história diferente, portanto, embora os pontos de contacto sejam numerosos e evidentes. E é boa: soa a história completa, o que neste livro nem sempre acontece, e está bem amarrada, narrativamente falando. Interessante.

Contos anteriores deste livro:

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Escrita de janeiro

imagem de Lukas Gojda
O prometido é devido. E como o prometido é devido, aqui estou no início de fevereiro a dar conta de como correu o mês passado em termos de escrita.

E correu bem, para um mês de trabalho intenso daquele que põe a comida na mesa. Foram mais 3200 as palavras (i.e., cerca de 10 páginas) acrescentadas a A Escolha de Diop, que já não está só planeada como novela: já tem dimensão de novela, com cerca de 50 páginas. Ainda faltam quase outras tantas (acho; isto de escrever tem surpresas), mas a coisa avança, e agora que vou entrar numa fase menos intensa em termos de trabalho o mais certo é que passe a avançar mais depressa. E se tivermos em conta que estas 3200 palavras de janeiro são quase tantas como as que escrevi no ano de 2018 completo, então...

Em março cá nos encontraremos para ver como correu fevereiro. Até lá.