terça-feira, 16 de novembro de 2010

Desafio 4: Insetos

O quarto desafio que me propuseram foi escrever uns versos sobre insetos. Quem mo propôs é uma notória bichófoba (todo e qualquer bicho, parece, não só insetos), e eu estive tentado a causar-lhe arrepios escrevendo uns versos cheios de bicharada a rastejar por cima da pele do(a) leitor(a), a ficar-lhe presa nos cabelos, a enfiar-se-lhe na roupa, enfim, estive tentado a fazer-lhe uma grande maldade.

Mas como a moça até é boa moça acabei por decidir ir por outra via, que até, quem sabe, possa mesmo chegar a contribuir para melhorar um pouco a noção de inseto que ela tem. E aqui fica o resultado:

Ah, que bom que é ser inseto

Ah, que bom que é ser inseto!
Ter mil imagens de ti nos meus olhos facetados
um milhar de lentes todas elas fitas em ti
ver-te em cores, mil elas também
construídas com azuis, vermelhos, verdes e ultravioletas
e tentar decidir se és cato ou se és flor
ou flor com espinhos, que também as há assim

Ah, como é boa toda esta queratina!
Ouvir a tua voz em estéreo ultra-surround
vibrações de jazz, dissonâncias, melodias
que através de todas as seis patas
me chegam direitinhas ao tubo cardíaco
e o obrigam a pulsar ao ritmo que definem

Ah, que delícia o teu cheiro nas antenas!
Moléculas de ti que agora me pertencem
moléculas que nem sabes que perdeste
mas que eu guardo como pedras preciosas
e que bom ter asas, poder abri-las e lançar-me à aragem
poder batê-las e lançar-me à voragem
poder orbitar-te como a Terra orbita o Sol
preso da refulgência de quem és
e alimentar-me da tua luz mascarado de girassol

Ah, tão bom, tão, tão bom é ser inseto!
Na verdade só o tamanho ma atraiçoa
por isso te escrevo estas linhas na esperança de que as leias
e assim saibas, quando por fim pousar em ti
que não pico nem aferroo, que só desejo o teu bem
e assim resistas ao instinto primeiro de todos os mamíferos
e me poupes ao destino provável de todos os insetos
o de acabar esborrachado, apanhado do chão
e deitado para o lixo sob o peso insuportável
de um esgar de nojo e inabalável repugnância

7 comentários:

  1. Eis 1 tema q me ocorreu para a panóplia de poemas: "Sustenta-me o olhar" frase que apanhei há uns tempos e nc me esqueci

    ResponderEliminar
  2. Não. Mas foi um inseto que lhe respondeu.

    ResponderEliminar
  3. Está mto boa! Uma vez bi(ch)ólogo, sempre bi(ch)ólogo! ;-)

    ResponderEliminar
  4. :)

    Obrigado.

    Mas por acaso há um erro científico ali. A substância de revestimento dos artrópodes não é a queratina, mas sim a quitina. Mau bi(ch)ólogo, portanto... ;)

    ResponderEliminar
  5. Ah, ia-te avisar do erro, mas parece que cheguei tarde.

    Gostei imenso deste, especialmente a parte da quimiocepção (moléculas que nem sabes que perdeste/mas que eu guardo como pedras preciosas).

    ResponderEliminar

Por motivos de spam persistente, todos os comentários neste blogue são moderados. Comentários legítimos passam, mas pode demorar algum tempo. Como sempre acontece, paga a maioria por uma minoria de abusadores. Parece ser assim que o mundo funciona, infelizmente.