terça-feira, 27 de julho de 2021

Mia Couto: Pescador na Ida, Herói na Chegada

Outra historinha bonita, este Pescador na Ida, Herói na Chegada. Mia Couto conta-a como facto acontecido com ele, e provavelmente foi-o mesmo, pelo menos nas suas linhas gerais. Num barco, a caminho de uma ilha, a embarcação em que segue depara com outra, onde o único ocupante pede ajuda. Porquê? Porque "o vento não funciona". O barco está à deriva, sem rumo, e ele, segundo se vem a saber mais tarde, já está no mar há vários dias sem conseguir regressar a terra.

Pior é ter partido numa missão da qual regressa em fracasso. Mas ao chegar ao porto, a história que se conta é outra, uma história em que o pescador se vê surpreendido na pele de herói de uma história que só em traços vagos se assemelha à sua, rodeado e abraçado por uma família que já o julgava perdido. E Couto, ou a personagem que Couto encarna, confirma essa história, perante o agradecimento mudo do homem.

Esta é daquelas histórias que deixam um gatinho a ronronar no coração de quem aprecia a solidariedade humana. E quanto à literatura, é um Mia Couto bastante típico que aqui se pode encontrar.

Textos anteriores deste livro:

domingo, 25 de julho de 2021

Irmãos Grimm: A Cotovia Cantante e Saltitante

Para mim, um dos principais motivos de interesse para ler histórias tradicionais ou populares, quer sejam estas dos Irmãos Grimm, quer sejam compilações de outros autores, é descobrir nelas as raízes de muita da literatura europeia ou de inspiração europeia dos últimos dois ou três séculos, e muito em especial da fantasia nascida no século XX. É um interesse que combate o desinteresse provocado pelo seu caráter repetitivo, por reencontrar muitos dos mesmos elementos num nunca acabar de histórias, e que ajuda a fazer com que eu regresse sempre a estas páginas mesmo que de forma intercalada com umas pausas de vez em quando.

Vem isto a propósito, como é fácil de compreender, desta história. É que A Cotovia Cantante e Saltitante, apesar de ser uma história tradicional bastante convencional (ou talvez por isso, na verdade), está repleta de pequenos e grandes elementos que se tornaram depois comuns na fantasia.

Um pai tem três filhas (claro que só pode ter três). Um dia parte de viagem e pergunta às filhas o que querem que lhes traga, ao que as duas de que menos gosta lhe respondem pedindo joias e a preferida pede apenas uma cotovia cantante e saltitante. Mas as joias são mais fáceis de arranjar que a cotovia; na verdade, a tentativa de encontrar o presente para a filha predileta vai pô-lo em perigo e vai fazer-lhe prometer a um leão falante, para salvar a vida, que lhe entregaria a primeira coisa que fosse ao seu encontro quando chegasse a casa. Naturalmente, essa primeira coisa foi a filha preferida, e está dado o pontapé de partida para a série de aventuras que a rapariga vai viver.

Há também nesta história qualquer coisa de Mil e Uma Noites; pelo menos houve nela qualquer coisa que me fez lembrar as adaptações de alguns dos contos das Mil e Uma Noites que li em miúdo. É uma boa história. Convencional, claro, com tudo o que isso implica, mas boa.

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Leiturtugas #112

Mais uma semana que passou, e cá estamos de novo a divulgar coisas. Não quaisquer coisas, claro; só as Leiturtugas.

Na verdade, é só uma Leiturtuga e, por provável coincidência, a mesma que marcou presença isolada na nota equivalente a esta da semana passada. Só a proveniência foi diferente; se na semana passada tinha sido a Cristina Alves a falar de Conta-me, Escuridão!, esta semana foi um dos oficiosos, o Tomé. Já se sabe: esta coletânea de horror de Mafalda Santos foi publicada no mês passado pela Suma de Letras e nada tem de FC.

E por esta semana é só. Até à próxima. Provavelmente.

sexta-feira, 23 de julho de 2021

Mia Couto: Amar à Mão Armada ou Armar a Mão Amada?

De temas pesados, saltamos agora para um simples triângulo amoroso. Um simples triângulo amoroso, claro está, ao jeito de Mia Couto, como se pode desde logo ver pelo próprio título. Amar à Mão Armada ou Armar a Mão Amada é mais um pequeno conto, este despido de quaisquer elementos fantásticos, no qual um tal Luciano, marido de uma tal Ermelinda, se perde de amores por uma polícia sinaleira, ocupação há muito caída em desuso e provavelmente desconhecida de boa parte das pessoas que lerem estas linhas (as minhas e as de Mia Couto).

O desenlace? Pouco importa. O que importa é o dilema, ou o conjunto de dilemas que o título já refere e a história desenvolve, e a forma caracteristicamente coutiana como a história é passada ao papel. O desenlace é tão pouco importante que a história abre com ele: «Parece que há uma única versão: Luciano foi dado ordem de despejo do coração de Ermelinda». Importante é se a história é boa ou não, e é, embora nada tenha de fantástico e eu, como é sabido, as prefira fantásticas.

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quarta-feira, 21 de julho de 2021

José Viale Moutinho: Os Alçapões do Sol

Parece que a cada conto que leio, neste livro de José Viale Moutinho, mais gosto do que leio. Se assim continuar até ao fim (improvável, bem sei), o último será simplesmente magnífico. Este Os Alçapões do Sol não chega lá, mas já é francamente bom.

Trata-se de um conto-homenagem. De resto, não é o primeiro nem o segundo: todos os contos deste início de livro estão dedicados a algum escritor, e parecem conter pelo menos alguns elementos de homenagem literária à obra do alvo da dedicatória. Mas aqui a homenagem é substancialmente mais explícita, pois a inspiração do conto são, como Moutinho declara na própria dedicatória, versos que José Gomes Ferreira compôs para dar vazão à emoção sentida ao visitar o irmão preso pela ditadura salazarista pelo imperdoável crime de se recusar a dar dinheiro para apoiar os franquistas na guerra civil espanhola.

E é precisamente esse episódio que Moutinho ficcionaliza. E o que é mais interessante, para mim, é ele o ter feito de uma forma profundamente fantástica. Não é um conto em que os acontecimentos se encadeiem de forma fria e objetiva; há nele dureza, e não pouca, mas é uma dureza temperada com uma atmosfera onírica que traz a tudo um elemento de irrealidade e insubstancialidade. Mountinho parece querer com isso transmitir a ideia de que todo o episódio é tão absurdo que só faz sentido num pesadelo. O episódio e, por extensão, as ações das personagens e o próprio regime, um regime que é capaz de prender pessoas por não quererem financiar uma guerra noutro país.

Este é um conto surpreendentemente bom para um livro que começou como este começou. E eu estou cada vez mais curioso com os cinco que vêm aí.

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Irmãos Grimm: O Pobre e o Rico

Há contos em que basta o título para se perceber com quase total certeza o que aí vem, e O Pobre e o Rico é um desses contos. Porquê? Porque além desta história dos Irmãos Grimm há milhares de outras com o mesmíssimo tema e o mesmíssimo enredo, em boa parte porque na nossa civilização judaico-cristã as histórias bíblicas tiveram uma influência muito grande na literatura em geral, popular ou não, e na Bíblia há aquela passagem célebre em que Jesus diz aos discípulos qualquer coisa sobre mais depressa passar um camelo pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus.

E, embora por vezes aconteça, este conto nem tenta disfarçar a inspiração bíblica. É fantástico cristão assumido desde a primeira frase, que situa o conto nos tempos em que "o bom Deus ainda andava na Terra entre os homens". O que faz mover a narrativa são milagres que esse Deus faz para benefício de pobres de bom coração, os quais vão despertar a cobiça de ricos que o têm mau, e a ideia-base da história é a incapacidade dos ricos de aproveitar o milagre concedido, por não compreenderem a bondade que tem de lhes estar subjacente.

Tudo muito de acordo com o que expectável, o que constitui a velha pecha das ficções de base cristã; só muito raramente incluem algo de minimamente surpreendente, e portanto de interessante. Interesse há na longa nota em que, como habitualmente, os Grimm estabelecem relações entre este conto e outros, incluindo ficções mais antigas que o cristianismo e/ou oriundas de lugares em que a religião dominante é outra. Sim, que os desejos satisfeitos por milagre divino e cristão, para dar um exemplo entre vários possíveis, têm relações evidentes com os desejos satisfeitos por outros meios mágicos, nem que seja o simples esfregar de uma lâmpada para de lá fazer sair um génio. E eu acho que li uma história assim em algum lado.

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Mia Couto: O Português, as Raças, os Corvos

Depois de crónicas mesmo crónicas voltamos aos pequenos contos, ainda que com Mia Couto nunca se consiga ter bem a certeza se as histórias que conta nestes contos/crónicas são ficção pura ou só parcial. O Português, as Raças, os Corvos pode ser fruto integral da imaginação do autor, pode ser apenas ficcionalização de uma vida verdadeira. Mas de qualquer forma é uma reflexão sobre o racismo. Ou melhor, sobre o modo como as acusações de racismo podem ser instrumentalizadas por gente com pouco escrúpulo.

O protagonista é um português, recém-chegado a Moçambique, já depois da independência, com ideias de fazer aí fortuna. Mas é convencido de que, para evitar acusações de racismo e todos os problemas que daí poderão advir, terá de dar boleia a qualquer pessoa que lha peça. A partir daí, a vida do desgraçado passa a ser transportar qualquer um para qualquer lado, em permanente excesso de lotação no veículo, e sem ganhar por isso um metical que seja, o que não o impede de atrair de vez em quando a atenção da polícia.

Não sei, como já ficou implícito acima, o que levou Mia Couto a escrever esta historinha. Mas imagino que ela tenha sido para ele um risco. Couto é moçambicano, mas também é branco, e escrever sobre aproveitamento das acusações de racismo para proveito próprio terá muito provavelmente levado alguns sobrolhos no seu país a franzir-se. Mas a história está tão bem escrita e tão bem concebida como é habitual, o que talvez tenha ajudado a desfranzi-los.

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segunda-feira, 19 de julho de 2021

José António Gonçalves: Ella Fitzgerald: Marfim Branco e Negro

E eis que saímos finalmente dos poemas bucólicos mais ou menos relacionados com a insularidade. E eis que eu pela primeira vez nesta revista gosto muito de um poema que leio. Estarão as duas coisas relacionadas? Talvez; provavelmente não. Deve ser mais questão de comunidade de gosto entre mim e o José António Gonçalves. Ele gosta de Ella Fitzgerald, o que se pode dizer por outras palavras simplesmente como ele tem bom gosto.

Bons entendedores já terão entendido estas meias palavras, mas digo-o agora por extenso. Ella Fitzgerald: Marfim Branco e Negro é um poema-homenagem àquela grande cantora de jazz (e outras coisas, mas foi no jazz e nos blues que ela realmente se destacou). E é um poema que, talvez por ter ressoado tão bem comigo, eu achei muito bom.

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Leiturtugas #111

Um dia mais tarde do que é hábito, que ontem meti na cabeça que era sábado e só descobri que era domingo praticamente ao deitar, eis mais uma semana de Leiturtugas para divulgar. Pela 111ª vez, ou coisa que o valha.

E por pouco não era daquelas semanas em seco. Temos uma única leiturtuga entre os participantes oficiais, que nos chega pela mão da Cristina Alves, uma opinião sobre uma coletânea de histórias de horror escritas por Mafalda Santos e intitulada Conta-me, Escuridão. Publicado no mês passado pela Suma de Letras, este livro não parece conter nenhum vestígio de FC, pelo que a Cristina passa a 4c7s.

E nenhuma entre os oficiosos, pelo que este post é rapidinho e termina já aqui. Até daqui a uma semana. Menos um dia.

domingo, 18 de julho de 2021

Mário de Carvalho: O Trombone

A grande maioria destes contos de Mário de Carvalho são simplesmente divertidos, independentemente das outras qualidades que possam ter. Isto é, são contos escritos com um claro objetivo de divertir, imagino que o próprio escritor em primeiro lugar, e os leitores, já agora, também. A maioria mas nem todos. Por exemplo este, O Trombone, traz consigo também uma certa melancolia.

O protagonista é um velho que, por se ter visto sozinho, é convencido a abandonar a sua aldeia de origem e vir viver com a família para a cidade, acabando por aterrar no Beco das Sardinheiras. Mas não é o facto de ter a família por perto que lhe anula a solidão, e o velho arrasta-se tristonho pela vida, aparentemente com saudades de tudo. Os familiares tentam alegrá-lo, devolver-lhe um pouco de interesse pela vida e, como o homem tocava saxofone na banda da aldeia, resolveram arranjar-lhe um saxofone... na candonga. Só que o que a candonga arranjou foi um trombone. Mas mesmo assim o homem acabou por se interessar pelo instrumento.

Mas já se sabe que no Beco das Sardinheiras há sempre qualquer coisa de fantástico a estragar os melhores planos. Este caso não é exceção. O trombone, ao ser tocado, deforma as coisas em volta, cada vez mais, até que as faz desaparecer. É uma espécie de buraco negro musical. E lá fica o velho sem trombone, já não só triste mas agora também irritado. E o conto acaba assim, bastante menos divertido que os restantes, bastante mais agridoce, apesar de escrito com a competência habitual.

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Kurt Vonnegut, Jr.: Utopia 14

Antes de começar, lanço um alerta aos eventuais leitores destas palavras. Eu tentei, juro que tentei. Matei a cabeça em busca de uma maneira. Mas falhei. Não consegui descobrir forma de falar capazmente deste livro sem revelar elementos fulcrais não só do enredo, mas do final. Spoilers, em suma e em inglês. Portanto vou dar spoilers. E, por conseguinte, se tu és alérgico a spoilers, e sem querer dizer-te o que fazer, talvez prefiras passar adiante, ir ler outras coisas. Se passares deste parágrafo considera-te avisado: este texto contém  spoilers. Quatro vezes já não deixa dúvidas a ninguém, suponho.

À primeira vista, Utopia 14 (bibliografia), romance que apesar de também ter este título em algumas edições na língua original é muito mais conhecido pelo outro título que tem, Player Piano, é uma distopia bastante comum. Num mundo futuro, a Humanidade de um intederminado pós-guerra entregou às máquinas toda a gestão da organização social, bem como a parte de leão da atividade económica. Talvez não em todo o planeta mas certamente nos Estados Unidos. Isto porque a governação humana levou à guerra e à catástrofe, pelo que se considerou que para proteger o futuro havia que proteger o Homem de si mesmo, afastando-o de posições em que pudesse estragar tudo.

Claro, as máquinas precisam de quem as conceba, construa e planifique a sua atividade, em grandes fábricas que funcionam como conglomerados. Por isso, existe na sociedade assim alterada uma casta especial, selecionada maquinalmente com base no QI — os engenheiros e administradores. O escol da sociedade. Os outros? Bem... os outros são descartáveis. Inúteis. Relegados a trabalhos menores, desnecessários, desconsiderados e mal pagos.

Utopia? Para alguns, sim. Para os outros, a grande maioria, a sensação de inutilidade e irrelevância, a imposição de uma inferioridade da qual são incapazes de sair e que talvez nem sempre seja verdadeira, é o fermento perfeito para a revolta. E a revolta está latente desde as primeiras páginas do romance, apesar de este se centrar na pessoa de um dos engenheiros, o dr. Proteus, filho de pessoa importante e diretor de uma fábrica igualmente importante em Illium, uma cidade fictícia nos Estados Unidos, mais propriamente no estado de Nova Iorque.

É principalmente pelos olhos deste engenheiro que o leitor vai descobrindo aquela sociedade e as suas contradições e insuficiências. E digo que é principalmente porque o rei de um reino asiático também anda a deambular pelas páginas do romance (e pelos EUA), acompanhado por um agente do Departamento de Estado cuja função é sobretudo tentar convencê-lo de que a maneira americana de fazer as coisas é a melhor. Sem qualquer sucesso, não só porque há muita coisa que se perde na tradução mas também porque as contradições da utopia americana saltam aos olhos dos estrangeiros.

Há muito de ironia neste artifício, ainda que o resto do romance, as páginas que seguem Proteus, pareça a princípio bastante despido dela. Aí, a ironia começa a aparecer quando Proteus toma contacto com os desocupados e com o seu estilo de vida, encontra neles qualidades de que não suspeitava, e se descobre idealista, deixando de acreditar na máquina social de que faz parte e de que beneficia diretamente. E decide fugir dela, embora não saiba bem como.

A ironia acentua-se quando ele parte para o retiro anual nos "Prados", cada vez mais decidido a mandar tudo às urtigas e tornar-se lavrador. Os "Prados" são uma ilha onde se realiza um daqueles acampamentos corporativos, destinados ao convívio e descanso das classes privilegiadas. É uma instituição... uma instituição que Vonnegut retirou diretamente do mundo real e apresenta como a coisa absolutamente ridícula que é.

E depois disso o gozo só se torna cada vez mais descarado. Proteus é encarregado de investigar um grupo subversivo, infiltrando-se nele, e para dar credibilidade à infiltração é despedido e despojado de todos os privilégios. No fundo, fazem-lhe precisamente o que ele já planeava fazer por si próprio, e ele fica com sentimentos algo ambivalentes sobre o sucedido. Mas lá se vai infiltrar no grupo, acabando por se assumir como líder da conspiração, sem saber bem como. E, depois de uma série de peripécias, arranca a revolução. Com Proteus entre os cabecilhas.

Só que há um problema. Ainda que os cabecilhas sejam de uma forma geral dissidentes da classe dirigente, pessoas com experiência e capacidade para organizar sistemas complexos, quem realmente faz a revolução não são eles. São os descartáveis, aqueles que as máquinas tinham determinado não terem a capacidade intelectual necessária para serem úteis à sociedade. Em suma: os idiotas. E os idiotas comportam-se como idiotas, mergulhando numa orgia de destruição desorganizada que rebenta com todos os planos cuidadosamente traçados por Proteus e pelos outros conspiradores. A revolução acaba derrotada, como era inevitável desde o início, e os dirigentes não têm alternativa a não ser entregar-se às autoridades da velha sociedade desumana que tinham tentado destruir. Porque os seus humanos concidadãos não passam de um bando de idiotas.

Irónico, cínico, muito pouco otimista, este romance é uma das distopias clássicas da FC, que quase nada têm a ver com a recente onda de distopias juvenis que fizeram as delícias de uma legião de leitores. Não faço ideia se teve, desde que foi publicado há quase 70 anos, uma quantidade comparável de leitores, mas duvido. Sei, sim, que não é livro para todos: a malta pela-se por um bom finalzinho feliz em que o rapaz fica com a rapariga, ou vice-versa, e aqui não encontra nada que se pareça. Encontra um livro provocatório. Daqueles livros que, mesmo que não se concorde com as ideias que lhe subjazem (e eu não concordo com várias delas), nos deixam a pensar. Um bom livro.

Este livro foi comprado.

sexta-feira, 16 de julho de 2021

Oscar Wilde: O Rouxinol e a Rosa

Os pré-conceitos são engraçados. Já tenho este livrinho cá em casa há anos e anos, uma vez que comprei a coleção completa. Fui lendo os outros e este foi ficando para trás. Porque não gosto de literatura romântica, de uma forma geral, quer o termo se refira à corrente literária, quer no sentido mais comum de equivalente literário do dia de S. Valentim, e porque supus que histórias de amor não tivessem grande coisa a interessar ao Bibliowiki, outro dos fatores que costumo ter em conta quando decido as próximas leituras. E agora que finalmente me decido a despachar esta leitura, abro o livrinho e a primeira história que me aparece é logo esta do Oscar Wilde.

E atenção que vai haver SPOILERS.

É que O Rouxinol e a Rosa (bibliografia) não é nada do que eu estava à espera de um livro de contos românticos. Para começar, é uma história fantástica fortemente inspirada pelos contos populares. E depois, apesar de a princípio parecer sê-lo, não é propriamente romântica no sentido delicodoce do termo.

Trata-se de algo de próximo a uma fábula. O protagonista é um rouxinol que, enternecido pelas dores de amor de um jovem, resolve ajudá-lo. O jovem anda apaixonado por uma mulher que exige que ele lhe entregue uma rosa vermelha antes sequer de lhe dar alguma oportunidade de tentar conquistá-la. Só que a temporada não é a certa e ele não encontra rodas vermelhas em lado nenhum. Só há brancas. Desespero. O rouxinol é que, mais sintonizado com o lado mágico das coisas, sabe de uma forma de transformar a rosa branca em vermelha, embora saiba também que terá de dar a vida para o conseguir. Tem de espetar um dos espinhos da roseira no coração, fazendo cair sobre a rosa o seu sangue, e morrer enquanto canta. Tudo muito trágico e romântico, não é?

Não, não é. É que depois chega o desenlace e tudo se desfaz. A mulher rejeita o jovem, mesmo depois de este lhe dar a flor e o jovem limita-se a deitar fora a flor que o rouxinol se sacrificou para criar, ignorando por completo o sacrifício da ave. O conto termina numa denúncia dos ideais românticos, tão violenta que não me surpreenderia se alguns lhe chamassem cínico. Quanto a mim, chamo-lhe francamente interessante.

Irmãos Grimm: A Raposa e os Gansos

Algumas destas histórias aqui reunidas pelos Irmãos Grimm são histórias no sentido pleno do termo, com enredos razoavelmente complexos e tudo. Outras, embora mais simples, também têm interesse enquanto peças de ficção. Já outras pouco passam de anedotas. Esta A Raposa e os Gansos é uma destas últimas.

Em pouco mais de meia página, esta fabulazinha apresenta uma raposa que, incaracteristicamente, é ultrapassada em astúcia. E logo por gansos, imagine-se. A moral da história parece ser qualquer coisa como "quando os tiveres à tua mercê acaba com eles, não te deixes distrair", o que não é propriamente uma moral agradável. Sim porque a raposa desta história mostrou alguma clemência e lixou-se.

Este é outro daqueles contos com mais interesse sociológico do que literário. Mas mesmo o interesse sociológico que tem não é grande.

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quarta-feira, 14 de julho de 2021

José António Gonçalves: O Canto do Sabiá

Mais um poema, desta vez pela pena de José António Gonçalves, e mais uma vez repito que pouco sei de poesia. Mas gostei bastante mais deste O Canto do Sabiá do que dos poemas anteriores. É, como eles, um poema fundamentalmente bucólico sobre a vida insular, desta feita a da Madeira, mas apesar disso ressoou melhor do que eles neste continental urbano que aqui escreve. Não sei se é bom ou não; sei que gostei de o ler.

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Mia Couto: Carta Entreaberta do Corrupto Nacional

Uma das coisas mais constantes nestes textos do Mia Couto é a fina ironia que os atravessa e geralmente vem à superfície em pequenas e grandes subtilezas, inclusivamente de linguagem. Nesta Carta Entreaberta do Corrupto Nacional, porém, essa fina ironia desaparece por completo. Aqui, e ironia nada tem de fina: é aberta, descarada, ruidosa, quase transformada em sarcasmo.

Pois a Carta Aberta do Corrupto Nacional é... uma carta aberta. De um anónimo corrupto moçambicano. A queixar-se amargamente da incompetência das autoridades, que não o investigam. É que o homem olha para o estrangeiro e vê o mundo cheio de corruptos célebres porque foram investigados e denunciados, e também quer. Com a mesma filosofia daqueles que dizem que antes ser bêbado famoso do que alcoólico anónimo, acha que antes ser célebre do que ilustre corrupto desconhecido. Os outros, no estrangeiro, vivem a glamorosa vida dos corruptos famosos. Mas ele, nada. Ninguém lhe aponta o dedo, ninguém quer saber das suas manigâncias. É como se não existisse. Já imaginaram a depressão?

Pois Mia Couto imaginou. Claro que o sarcasmo é óbvio e intenso, e contribui para tornar a crónica muito divertida. Aprovado.

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terça-feira, 13 de julho de 2021

Ângelo Brea: O Varredor

Nas mãos de um Bradbury, esta ideia daria um conto magnífico, mas se há algo que já ficou claro relativamente a Ângelo Brea é que ele é, de uma forma geral, bastante melhor a ter ideias do que a pô-las em prática. Dito isto, este O Varredor é significativamente melhor que os dois últimos contos do livro. E não só por causa da ideia; a própria concretização está bastante mais competente.

Mas apenas competente. Falta-lhe, para subir a um patamar superior — pelo menos neste conto — livrar-se da tendência para o excesso de explicação e para pôr personagens a explicar umas às outras coisas que todas sabem. E haveria aqui material para essa subida. Não só a ideia é realmente boa como a história que Brea conta é bonita, e ele consegue ter sucesso a sugerir um determinado caminho para ela, trocando as voltas ao leitor, num efeito muito propositado de reorientação narrativa.

Não estragarei esse efeito explicando do que se trata. Direi apenas que o protagonista é pai e tem uma profissão de que o filho se envergonha. Ou, na verdade, toda a família. Sim, é varredor, como o título indica. E a princípio pensamos que não há nessa atividade nada que a diferencie daquela que conhecemos dos dias de hoje. Mas estamos perante um conto de ficção científica, pelo que talvez não devêssemos fazer tal suposição.

Bradbury faria disto uma obra-prima. Brea faz um conto ternurento mas não particularmente bem conseguido.

Contos anteriores deste livro:

segunda-feira, 12 de julho de 2021

Leiturtugas #110

Cá estamos no fim de mais uma semana, de novo com Leiturtugas a registar e divulgar. E desta feita temos FC!

E temos FC, de novo, pela mão do Artur Coelho, que apanhou a jeito uma velhinha edição de FC portuguesa e não perdeu a oportunidade de lhe deitar a mão, após o que a leu e comentou. Falo de A Morte da Terra, romance de Sebastião Morgado publicado em 1969 pela Sociedade de Expansão Cultural. Passa assim o Artur a 5c6s e está a uma leitura com FC de cumprir os mínimos. Perna às costas.

E também a Carla Ribeiro nos traz FC, em versão distópica e razoavelmente impura. Opina ela esta semana sobre A Instalação do Medo, romance de Rui Zink já com alguns anos (data de 2012) que foi reeditado pela Porto Editora no mês passado. A Carla passa, portanto, a 2c9s.

Entre os oficiosos, temos o regresso da Daniela, que traz desta vez a sua opinião sobre uma fantasia YA. Intitulado Aquorea (ou talvez o título seja Inspira e Aquorea pretenda ser o nome da série), tem como autora M. G. Ferrey (pseudónimo de alguém chamado Ferreira?), foi publicado no mês passado pela Nuvem de Tinta.

E se o anterior era juvenil, o próximo é mesmo infantil. Chega pelas mãos da Júlia Martins, a qual opinou sobre Matilde e a Cidade das Portas Mágicas, uma fantasia infanto-juvenil de Patrícia Furtado publicada pela Nuvem de Letras no ano passado.

E por esta semana é isto, e não está mal. Até à próxima.

sábado, 10 de julho de 2021

José Viale Moutinho: A Porta do Cavalo

Bom, ao segundo exemplo da escrita de José Viale Moutinho já posso pelo menos dizer que a curiosidade está despertada. É que neste A Porta do Cavalo ele mantém as características que mais me tinham agradado n'O Tricô de Constança, ao passo que as que me desagradaram estão desaparecidas em parte incerta, ou pelo menos significativamente atenuadas.

Há algumas coisas em comum entre as duas histórias, a começar pelo ambiente. Em ambas, os protagonistas são membros da burguesia oposicionista ao Estado Novo, com uma atividade política que ora é aberta, no caso do conto anterior, ora razoavelmente clandestina, no caso deste. E digo "razoavelmente" porque ao contrário do primeiro conto este passa-se no interior beirão, terra pequena, onde toda a gente sabe que o protagonista mais velho não é partidário do regime. E há em ambos os contos uma atmosfera geral de coisa antiga, de decadência, mesmo sendo os protagonistas progressistas. De dinheiro velho e algo desfalcado, talvez.

Mas outras coisas são bastante diferentes. Este A Porta do Cavalo é a história da cumplicidade entre um velho e um rapaz, e da forma como os dois se entreajudam. O rapaz lê ao velho as notícias, e não só, pois este é cego ou quase. Em contrapartida, quando chega o momento, o velho ajuda o jovem a fugir a salto para França, a fim de evitar a guerra colonial. Houve milhares de histórias assim nos anos 60 e 70 do século passado, até que o 25 de Abril acabou com a guerra e o colonialismo, e Moutinho conta-a bem.

Vamos lá agora a ver o que nos traz o próximo conto.

Conto anterior deste livro:

Irmãos Grimm: Os Filhos Dourados

Enquanto lia esta história dos Irmãos Grimm, foi-se desenvolvendo uma forte sensação de déjà vu. Não é coisa incomum; muitas são as histórias populares que partilham elementos com outras histórias, e quando as lemos vamos reencontrando as mesmas ideias e as mesmas estruturas com bastante frequência. Mas aqui, a sensação foi mais forte do que é hábito, e eu às tantas dei por mim a tentar perceber onde teria visto estes elementos. Nalguma outra história dos Grimm? Nos Contos Populares Portugueses do Adolfo Coelho?

O mistério desfez-se ao ler a nota que, como é hábito, os Grimm anexaram à história. Os Filhos Dourados, diz-se nessa nota, "é basicamente idêntico ao conto Os Dois Irmãos", aqui comentado há cerca de dois anos. Confesso já não me lembrar praticamente nada desse conto, o que, lendo o que então escrevi sobre ele, não me surpreende nem um pouco. Seja como for, a história que aqui se conta ressoa muito a coisa já lida, pelo que se calhar até me lembro. Um homem pesca um peixe, este pede-lhe que o liberte, prometendo em troca um milagre, o que o homem faz. O milagre aparece, na forma dos filhos dourados de que fala o título. E estes vão despertar a cobiça dos gananciosos que lhes puserem a vista em cima, o que irá pôr um deles em risco iminente de perder a vida, levando o outro a tentar socorrê-lo.

Talvez por ser mais curto, embora também não seja dos contos mais curtos incluídos neste volume, talvez por ser antecedido por contos muito mauzinhos, não saí desta leitura tão mal impressionado como da leitura d'Os Dois Irmãos. Não fosse o intenso déjà vu, e teria achado esta história realmente interessante. O déjà vu estraga um pouco a experiência de leitura. Mas o certo é que, apesar disso, esta leitura não me aborreceu. É bom sinal.

Contos anteriores deste livro:

quinta-feira, 8 de julho de 2021

Mia Couto: África com Kapa?

Mais uma vez não sei se esta historinha que Mia Couto (ou será Mya Kowto?) aqui conta aconteceu mesmo, o que fará da crónica uma crónica mesmo crónica, ou se trata de ficcionalização de um tema para melhor o explorar, o que a transforma num continho com um pé na crónica. Sei, sim, que é história francamente divertida.

Passa-se num aeroporto brasileiro, durante as formalidades necessárias para um par de moçambicanos entrarem no país. Mia Couto é basicamente espetador de uma discussão que surge porque o homem que o acompanha insiste que a maneira africana de escrever português enche a escrita da língua de k, w e y, e teima que é assim que se deverá escrever o seu nome. Daí o título de África com Kapa. O brasileiro, um dos funcionários do aeroporto, não vê o mínimo sentido naquilo, argumentando que k, w e y são caracteres latinos como os restantes, tão europeus como todos os outros, mas acaba derrotado pela teimosia do moçambicano. Derrotado não no sentido de convencimento, mas de se fartar de uma discussão sem pés nem cabeça, cheia de argumentos sem ponta por onde se lhes pegue, aceitando o nome do outro como quem diz "que se lixe; se o pateta quer escrever assim o nome, pois que escreva".

Ironia a rodos, claro. E Mia Couto, que em outros textos dá no toutiço dos conservadores disparatados, aqui dá no toutiço dos inovadores disparatados, mostrando que para ele não é o conservadorismo ou a inovação que estão em causa, mas sim o disparate. Simpatizo com o sentimento, confesso.

Textos anteriores deste livro:

terça-feira, 6 de julho de 2021

Irmãos Grimm: João Casa

Continuamos entre os contos mais fracos que os Irmãos Grimm coligiram e, talvez por eles serem tão fracos, não parecem ter alterado grandemente — ainda que aqui existam alterações — e encontramos mais um João, ou Hans no original alemão. João Casa é outro continho muito simples, tanto que chega quase a ser simplório, que, em apenas uma página, narra a história de um casamento enganoso.

Trata-se basicamente de uma comediazinha de costumes, na qual o bom do João, camponês pobre, tem um tio que decide que vai casá-lo com uma filha de gente endinheirada. E lá vai ele convencer o pai endinheirado da filha que o João é tipo cheio de guito. Com sucesso. E o conto é isto, basicamente.

No fim, os Grimm acrescentaram-lhe um parágrafo que nada tem a ver com a história, embora esteja relacionado com o tema, explicando que "este tipo de facécias usam-se amiúde no final dos contos sempre que se revelam adequadas". Seja. Mas também têm o efeito de diluir o final da história, tornando-o ainda menos eficaz. É interessante na vertente sociológica da tradição oral, mas literariamente? Nada.

Contos anteriores deste livro:

segunda-feira, 5 de julho de 2021

Mia Couto: A Morte Nascida do Guardador de Estradas

Depois de gozar com quem o criticava pelas inovações entrocadilhadas que sempre gostou de introduzir na sua língua, Mia Couto resolveu tentar explicar-lhes qualquer coisinha por intermédio da ficção. Depois ou antes, que não sei se os textos deste livro respeitam a cronologia da sua publicação original na imprensa moçambicana. Mas duvido; Couto não é homem dado a grandes rigores desse género. E também duvido de ter conseguido com este conto fazer os seus denegridores compreenderem melhor o seu ponto de vista sobre a língua do que quando foram simplesmente gozados. Especialmente tendo em conta que recorre para isso ao fantástico, e é bem sabido que gente falha de imaginação tanto estranha o fantástico como os significados ocultos nas mutações das palavras.

A Morte Nascida do Guardador de Estradas é, como se torna evidente pelo parágrafo acima e mais ainda pelo subtítulo/dedicatória de Aos Puristas da Língua, um conto de fantástico alegórico. Nele, um homem ordena-se guardião de uma estrada e dos que por ela passam, em especial quando decidem não lhe respeitar o trajeto e os limites e se desencaminham — a seu ver — por caminhos laterais. Termina a história com a própria estrada a levantar voo, farta de se ver tolhida por tão disparatada vigilância. E ele próprio, vendo-se de vida vazia de objetivos, agora que a estrada já lá não está, também se sente muito mais leve. Dir-se-ia que lhe bastaria bater os braços e empassarar-se.

Quem não for irremediavelmente pateta percebe facilmente a alegoria, e quem tiver bom gosto certamente gostará da forma que Mia Couto escolheu para lhe dar corpo. Este é um belo continho, sim senhor.

Textos anteriores deste livro:

domingo, 4 de julho de 2021

Pedro Javier Castañeda García: Ilhas: Praças do Mar

Não se engane quem veja um título como Praças do Mar e julgue estarmos perante um texto em português. Não estamos. Estamos, como um nome de autor como Pedro Javier Castañeda García indica, perante um texto em espanhol. Mais especificamente um poema em espanhol, cuja única porção em português é o título, não sei se por ideia do autor se da revista (provavelmente do autor, visto que há na revista outros textos em outras línguas com títulos na língua original, como veremos mais à frente). E tendo em conta que "ISLAS: plazas de mar" é um dos versos do poema não é difícil perceber-se qual era o título original.

Trata-se de outro poema sobre a insularidade, escrito num castelhano salpicado de palavras e expressões que eu desconheço, pelo que além da minha consabida e sempre reafirmada ignorância em matéria poética há mais este grãozinho na engrenagem. Posso dizer que gostei bastante mais do ritmo deste texto do que do anterior mas mais do que isso terá de ficar para qualquer outro.

Textos anteriores desta publicação:

Leiturtugas #109

E cá vamos nós para mais uma semana de Leiturtugas. E que temos?

Pois temos opinião do Artur Coelho, que parece ter sido levado um pouco ao engano. Fala de Apocalipses, de Joaquim Fernandes, um livro publicado já este ano pela Contraponto e que parece não conter propriamente o que ele esperava, uma vez que se trata de uma obra de divulgação de curiosidades históricas. Não-ficção, portanto. E o Artur soma mais uma leitura sem FC, o que o leva a 4c6s.

E temos opinião do Artur Coelho. Parece que por estes dias o pessoal anda mais virado para a bola, ou coisa que o valha. Pode ser que a semana que aí vem venha mais composta, mas esta foi só nos trouxe isto. Até à próxima.

sexta-feira, 2 de julho de 2021

Escrita de junho


Estranharam o facto de a imagem que está aqui em cima ser a mesma que esteve no mês passado? Não é caso para isso. Só quer dizer que tudo em junho foi igual a maio. O mês foi todo gasto nas revisões do mesmo projeto, o saldo final, depois do que sai e do que entra, foi praticamente igual, um lucro de um pouco mais de 300 palavras, e julho iniciou da mesma forma. A única diferença é que agora falta muito, muito pouco para a coisa ficar feita, pelo que julho será de certeza o mês em que desta parto para outra. Qual é que ainda não sei. Não tenho nenhuma história a gritar para sair, como às vezes acontece. Logo se verá. E se estiverem por aí, no início de agosto talvez vos diga qualquer coisa sobre isso. Por agora é só isto. Até lá.

quinta-feira, 1 de julho de 2021

Mário de Carvalho: Chuva ao Domicílio

A imaginação de que Mário de Carvalho dá mostras nestes seus contos passados no Beco das Sardinheiras parece estar diretamente correlacionada com quão divertidos consegue fazê-los, e no caso deste Chuva ao Domicílio uma e outra coisa estão em alta.

Começa a história quando aparece no beco um fiscal da câmara, seguido pouco depois por uns quantos trabalhadores. Parece que tinham encontrado um chafariz irregular, que terão de fechar porque não se pode andar assim a gastar água ao município sem pagar as taxas respetivas. Os habitantes do bairro rebentam em gargalhadas, convidam-nos a ir beber um copo e contam-lhes a origem e o motivo do chafariz.

É uma nuvem.

Não uma nuvem qualquer, mas uma nuvem pequenina que apareceu um belo dia a chover torrencialmente mesmo em cima da cabeça de um dos habitantes do Beco. Quando este se conseguiu livrar dela, feito pinto, passou a outro, e foi saltitando de cabeça em cabeça até que o engenho dos sardinheiros (poder-se-á chamar isto a quem ali mora?) logrou capturá-la, enterrá-la e dar bom uso à sua água.

Ao ler esta história, houve vários trechos que levaram ao sorriso aberto ou mesmo à gargalhadinha. É um conto divertido, imaginativo e bem escrito. Não tenho queixas a fazer.

Contos anteriores deste livro: