quarta-feira, 31 de julho de 2013

Lido: A Pedra Preta

A Pedra Preta é outro dos contos que Mário de Carvalho ambientou no seu bizarro Beco das Sardinheiras. Neste, um cheiro a gás atraiu o respetivo piquete, que depois de abrir o sacrossanto buraco não tardou a achar a causa do problema: uma pedra preta que, apesar de pequena, por mais que tentassem, por mais potentes os músculos e a maquinaria, ninguém conseguia mover tamanho era o peso. Até que um puto de calções e eventualmente ranhoso decide armar-se aos cágados, salta para dentro do buraco e... pega na pedra como se nada fosse. E segue-se o desenlace, carregadinho de ironia.

É outro conto divertido, bem escrito, com um magnífico uso do falar popular que bom seria que certos escritores e candidatos a tal coisa estudassem com atenção para ver se conseguiam evitar os diálogos ridículos que tantas vezes apresentam. Um conto claramente fantástico, cheio de ironia, e que se ajustaria como uma luva ao Infinitamente Improvável. Gostei, sim senhor.

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Lido: A Mulher da Saia Pela Cabeça

A Mulher da Saia Pela Cabeça (bibliografia) é mais um conto fantasmagórico de Hugo Rocha que pouca novidade traz ao leitor. Ambientado no Porto, está escrito em tom de história contada à lareira, à boa e verificada maneira de tantos contistas anglófonos, por um narrador que narra na primeira pessoa um caso supostamente acontecido com os seus bisavôs, ele militar adequadamente valente, ela mulher de militar, também dotada da valentia que se exige a quem pode perder o marido a qualquer momento. Pois acontece que os antepassados do narrador se teriam mudado para o Porto, onde alugaram uma casa na parte alta da Rua de Santa Catarina, desconhecedores das histórias que a vizinhança contava sobre o sítio. Má ideia. Porque às tantas começam a ouvir barulhos noturnos, depois a bisavó do narrador vê, no jardim, uma mulher com a saia pela cabeça, à transmontana, e a coisa vai-se degradando com assombrações cada vez mais terroríficas até ao desenlace final. Tudo bem conforme ao receituário deste tipo de história. E tudo com aquele estilo enovelado que já tinha encontrado na primeira história, embora aqui menos. O que é bom. Em geral, achei esta história mediana.

Conto anterior deste livro:

Lido: Deus Fez - O Diabo Inventou

Deus Fez - O Diabo Inventou é mais um... hm... o que é isto, ao certo? Hm... Bem, parte fácil: foi escrito por José Alberto Braga, pretende ter piada, e tem muito pouca. Basicamente trata-se de duas listas, a de coisas que deus terá feito, a outra de coisas que o diabo terá inventado, o mariola. E como naqueles conjuntos que se aprendem no secundário, existe uma correspondência biunívoca (ainda será esta a terminologia?) entre cada elemento da primeira lista e o elemento correspondente da segunda. Tipo "deus fez o ar - o diabo inventou a poluição", "deus fez o governo - o diabo inventou a oposição" (a sério?!). Coisas assim.

Deixou-me o nariz bastante torcido, isto. Mas, com uma massagenzinha, ele destorceu-se.

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Lido: Unique Chicken Goes in Reverse

Unique Chicken Goes in Reverse é o bizarro título de um não menos bizarro conto de Andy Duncan. Partindo, como o autor explica num breve comentário que o acompanha, de um caso real (parece que a escritora Flannery O'Connor teve o seu primeiro encontro com a fama em criança por ter ensinado uma galinha de estimação a andar para trás, o que foi filmado e exibido nos noticiários que costumavam anteceder os filmes nos cinemas antes da disseminação da televisão), Duncan cria aqui uma provocação teológica protagonizada por um jovem padre que é chamado para deslindar o estranho caso de uma rapariguinha que teria decidido chamar a uma das suas galinhas "Jesus Cristo". Em Savannah, Geórgia. Terra natal de Flannery O'Connor, precisamente.

Sim, trata-se de Flannery e de uma peculiar versão da história da galinha, na qual o padre é confrontado com algo mais do que estava à espera. Não só uma miúda com ideias peculiares sobre a natureza teológica de Cristo, e ainda por cima baseadas na própria Bíblia, mas também uma galinha cuja capacidade de andar para trás é a menor das suas peculiaridades. Suponho que este conto seja coisa para pôr as penas os cabelos em pé a qualquer cristão. Não sendo eu próprio cristão, só posso supôr. Tenho de confessar, padre, que não gostei muito. Mas o conto deixou-me a pensar, ainda que não sobre teologia.

É que tenho absoluta certeza de que um conto como este, em Portugal, se escrito por autor português, seria soberanamente ignorado por toda a gente ligada ao género. Se alguém se lhe referisse, a palavra "bosta" ou similares faria decerto uma aparição, e a história seria apontada como exemplo da monumental e proverbial nabice dos tugas quando se põem a escrever fantástico.

Lá fora? Foi nomeado para um Nébula.

Há coisas fantásticas, não há?

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Lido: O Homem do Segundo Andar

O Homem do Segundo Andar (bibliografia) é um conto daquela espécie de horror suave que tão característica é de Ray Bradbury. Trata-se, na verdade, de uma história muito bradburiana: aqui se encontra a infância a deparar-se com os horrores e os espantos do mundo, aqui se encontra a América das pequenas cidades e dos casarões vitorianos... e aqui se encontra um vampiro que poderia perfeitamente ser membro da bizarra família Elliott.

Como em muitas outras histórias de Bradbury, em especial daquelas que mais de perto contactam o horror, esta é uma história de descoberta. O protagonista é um miúdo, filho de uma família que aluga quartos no seu grande casarão, e que é o único a reparar que o homem que alugou recentemente um quarto no segundo andar é mais estranho do que seria natural. E é pelos sucessivos passos que levam à descoberta da verdadeira natureza desse homem que Bradbury leva o leitor, com a qualidade e segurança habituais na sua prosa. Mas há um pequeno detalhe problemático: uma história como esta, em que o mistério a respeito da natureza de uma personagem é o que faz mover a trama, perde algum do seu impacto quando se vê incluída numa antologia centrada precisamente nessa natureza. A culpa, obviamente, não é de Bradbury, e seria impossível incluir esta história num livro como este sem que isso acontecesse; mas é um fator a ter em conta.

Esta não será uma das obras-primas de Bradbury, mas é um belo conto mesmo assim.

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segunda-feira, 29 de julho de 2013

Pandorama nos Contos de Litfan

Já foi há uns dias, mas não faz mal, digo-vos na mesma. O meu conto Pandorama, inicialmente editado no Infinitamente Improvável, foi republicado no site brasileiro Contos de Litfan, inuaugurando por lá uma secção nova, Insólitos. Link direto para o conto? Ei-lo.

Lido: O Tombo da Lua

O Tombo da Lua (bibliografia) é um pequeno conto fantástico e humorístico, de Mário de Carvalho, sobre um estranho caso que terá acontecido no alucinante Beco das Sardinheiras. Estava o bom do Andrade da Mula à janela, vem-lhe uma daquelas irresistíveis vontades de bocejar, à qual ele, obviamente, não resiste, e é nessa precisa altura que a Lua se lhe enfia goela abaixo, catrapumba. Comoção geral, como é bom de ver. É um conto divertido e muito bem escrito, com um belo uso da oralidade popular. Um conto carregadinho de ironia, muita dela de cariz social. E um conto que se socorre de um certo maravilhoso que é mais comum encontrar-se em histórias infantis do que em histórias como esta, mais ou menos para adultos, o que segundo as minhas contas só lhe aumenta o interesse. Gostei bastante, sim senhor.

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domingo, 28 de julho de 2013

Lido: O Guarda-Vestidos de Porta de Espelho

O Guarda-Vestidos de Porta de Espelho (bibliografia) é uma noveleta de horror de Hugo Rocha que recupera um tema já bastante batido: o espelho encantado (ou, no caso, amaldiçoado) que não se limita a refletir aquilo que deve. Trá-lo para Portugal, é certo, e aí reside a novidade, mas de resto o enredo é previsível, ainda que não deixe de estar bem construído. Contado na primeira pessoa por um homem bem integrado na sociedade conservadora do tempo, que começa empregado e acaba promovido a gerente de uma casa comercial, a história descreve cerca de ano e meio da sua vida, entre o momento em que a promoção lhe permite pedir casamento à mulher que vinha cortejando e o desenlace adequadamente trágico da trama. Os dois ficam noivos, os dois procuram casa, depois procuram mobília, encontram-na e é aqui que surge o tal guarda-vestidos de porta de espelho, cujo espelho faz das suas e vai provocar todo o drama. Não convém revelar muito mais do que isto, portanto calo-me. Acrescento apenas que não gostei muito desta noveleta, não só pela previsibilidade do seu enredo, como também (ou se calhar principalmente) porque o estilo literário de Rocha não me agradou por aí além. Se por um lado mostra um vocabulário vasto e interessante, o que é bom, por outro tem um estilo de tal forma enovelado, enrodilhado, com vírgulas por todo o lado, que torna a leitura algo penosa. O que é mau.

Lido: O Paraíso Revisitado

O Paraíso Revisitado é um pequeno conto de José Alberto Braga que, como o título indica, revisita o mito judaico-cristão da criação de Adão e da expulsão da humanidade do Paraíso. É, naturalmente, um conto fantástico. E também é o mais bem escrito dos contos de Braga que li até agora, e um dos seus textos mais divertidos.

Adão é retratado como um birrento insuportável, que quer, que exige, uma mulher. Já! E o Criador lá lhe faz a vontade, mais para não ter de o ouvir mais do que propriamente por desejo próprio. E o resto é história, antecedida da respetiva pré-história. Gostei deste continho. Em parte dada a minha incorrigível condição de herege, sempre pronto a rir-me dos mitos judaico-cristãos. Mas a verdade é que aqui Braga consegue ser divertido sem ser desrespeitoso (se bem que a fação ultrasisuda que há em todas as religiões seja capaz de não ser da mesma opinião), o que denota algum tato na irreverência. E também, está claro, porque o nível do português é aqui mais elevado do que noutros textos que ficaram para trás. Aprovado.

Textos anteriores deste livro:

Lido: Pirata por um Dia

Pirata por um Dia (bibliografia), conto de Sónia Louro (que tudo indica tratar-se de mais um pseudónimo (EDITADO: e daí não, não é pseudónimo)), é a primeira história deste livro que não toca, de uma forma ou de outra, nas literaturas do imaginário. Trata-se de uma história de piratas, sem nada de sobrenatural, mágico ou ciencioficcional a afastar o enredo de um certo tipo de realismo, protagonizada por um sedutor que é preso e condenado ao degredo depois de ser apanhado com a amante e consegue, de forma bastante inverosímil, diga-se, liderar um motim no navio que o transportava, transformá-lo em navio pirata e a si próprio em comandante, e embarcar em várias aventuras, tanto no mar como em terras brasileiras.

É uma história que tem bem presentes algumas das qualidades do pulp, com a agilidade do enredo e a presença de abundante ação à cabeça. Mas também sofre de alguns dos seus defeitos, em particular um português muito deficiente. Atendendo apenas aos seus aspetos literários, à capacidade de usar a língua que o autor revela, esta história é muito má. Mas a verdade é que no verdadeiro pulp isso é secundário, portanto o conto até acaba por funcionar no contexto em que se insere.

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sábado, 27 de julho de 2013

Lido: Captive Girl

Captive Girl é um brilhante conto de ficção científica de Jennifer Pelland sobre... bem, talvez seja melhor começar de outra forma.

Estamos numa colónia humana, a primeira, num planeta extrasolar. Anos antes do presente ficcional, a colónia foi atacada por misteriosos alienígenas. Ou talvez não. Não se sabe bem. O facto é que algo caiu sobre a colónia, causando morte e destruição, e como consequência foi instituído um programa de vigilância centrado em jovens cirurgicamente fundidas com maquinaria e presas a essa maquinaria. Ciborgues, totalmente dedicados à função, totalmente dependentes dos cuidados de terceiros para a satisfação das suas necessidades mais básicas. E apenas três, sempre à beira da loucura.

A protagonista, a rapariga cativa a que o título se refere, é um desses ciborgues. E está apaixonada pela mulher que dela cuida... mas ao contrário de outras histórias em que as paixões de humanos alterados ficam sem resposta, aqui ela é concretizada, pois a cuidadora tem um fetiche por ciborgues.

E é então que rebenta um escândalo, o projeto se vê cancelado, e as raparigas cativas são libertadas das máquinas que as prendem e postas nas mãos dos médicos que voltam a transformá-las, na medida do possível, em seres humanos razoavelmente normais. O que vai confrontar a protagonista com a natureza da amante. E consigo própria, com os seus desejos, com as suas ambições, com o seu passado e com o seu futuro.

Sim, trata-se de uma história de amor em circunstâncias invulgares como só a ficção científica permite. E trata-se de uma história de amor muitíssimo bem concebida e executada, que explora alguns dos mais profundos limites da humanidade e do desejo. Excelente.

Textos anteriores deste livro:

Lido: Anuário Brasileiro de Literatura Fantástica 2005

O Anuário Brasileiro de Literatura Fantástica 2005 é um livro pertencente a uma série de anuários editados no Brasil e que têm como objetivo registar criticamente o que vai sendo publicado dentro dos géneros fantásticos, ou em língua portuguesa, ou só no Brasil. Os autores, julgo que de todos estes anuários, são César Silva e Marcello Simão Branco. Nesta edição em concreto, que já tem alguns anos, há a participação adicional da americana M. Elisabeth Ginway e de um tal Jorge Candeias, português, que não faço ideia de quem seja.

O livro faz um apanhado da edição no ano a que diz respeito, com listas de títulos, alguma análise numérica, comparações com anos anteriores, etc., mas está longe de se resumir a isso, pois a maioria das suas quase duzentas páginas é ocupada com noticiário, obituário, críticas, tanto a obras editadas no ano a que o livro diz respeito como a obras com várias décadas, entrevistas e artigos. E foi isso que mais me interessou na leitura que lhe dei (embora os dados concretos sejam o que mais me vai interessar na fase seguinte).

Estará completo? Não, não está. Na verdade, foi essa a principal frustração que senti ao colaborar nestes anuários (colaborei em duas edições): por exaustivo que tente ser o trabalho de compilação de edições, há sempre lacunas, e por vezes lacunas bastante grandes. Especialmente em Portugal, onde só recentemente algumas (só algumas; nem todas) editoras se aperceberam do potencial de divulgação que o contacto com comunidades de fãs e a internet pode oferecer e é comum surgirem livros de género publicados por editoras inesperadas e quase em segredo. Se não calha alguém esbarrar com um desses livros numa livraria, algures, passam completamente sob o radar, o que é uma técnica de vendas, convenhamos, no mínimo bizarra.

O resultado é que ainda hoje vão sendo acrescentados ao Bibliowiki livros publicados em 2005 ou até antes. Livros que, naturalmente, não foram incluídos no Anuário.

Por conseguinte, o trabalho é ingrato. Por mais duro e dedicado que seja, fica sempre incompleto. É certo que estes anuários têm uma secção dedicada a correções e acrescentos de livros de anos anteriores, mas mesmo assim a incompletude é mais norma que exceção.

Ou seja: essa tarefa é mais adequada a uma compilação dinâmica, em constante mutação, como um website, do que a uma compilação estática, como um livro. E foi em boa medida essa constatação que me levou à decisão de concentrar os meus esforços na criação e ampliação do Bibliowiki, abandonando a colaboração com este projeto.

No entanto, lendo-o agora à distância de mais de meia década, constato que a sua principal valia não é nem nunca foi a de servir como listagem e divulgação de edições, mas a de proporcionar um olhar sobre o género. Um olhar que, como todos os olhares, é subjetivo e falível, tanto na simples listagem de títulos, como, ou principalmente, nas obras e autores que são selecionados para merecer um exame mais atento através da crítica, dos artigos e da entrevista. É isso que o justifica como livro, e provavelmente foi isso que fez com que estes anuários não só continuassem a publicar-se até hoje, como até tenham abandonado a edição artesanal que este ainda teve (o livro é um conjunto de fotocópias, com capa também em fotocópia e encadernação manual) para serem acolhidos por uma editora estabelecida e impressos profissionalmente.

E encarado desta forma, o livro (ou os livros; este e os outros) é muito interessante para qualquer pessoa que tenha pelas literaturas do imaginário um interesse que inclua alguma componente de análise. Não será livro para simples leitores, tampouco será livro para aqueles escritores que se contentam em escrever o que lhes dá na gana, sem se preocuparem muito com o que os rodeia, mas para estudiosos, dos mais aos menos sérios, é um projeto muito válido e de todo o interesse. E seria bom que alguém fizesse algo de semelhante por cá.

Um exemplar deste livro veio-me parar às mãos por ter nele colaborado.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Lido: O Vampiro Passivo

O Vampiro Passivo (bibliografia) é uma vinheta de Ghérasim Luca, aqui de novo em versão livre de Sacadura Brettz. Foi o primeiro texto de Luca que li e não fiquei impressionado. O continho, de quatro páginas apenas, deambula por uma série de sítios sem se prender em nenhum, e vai-se arrastando, intimista e aborrecido, até parecer mais comprido do que algumas das noveletas deste volume. Na prosa, de ambições poéticas, surgem com alguma frequência frases de efeito enxertadas aparentemente a destempo, que parecem servir apenas de decoração. Rodriguinhos. Veja-se, como exemplo, este parágrafo (na grafia original, pré-AO):
Fecho os olhos, activo como os vampiros, abro-os por dentro, passivo como os vampiros, e entre o sangue que chega, aquele que parte e aquele que se encontrava já em mim, produz-se uma troca de imagens como um choque de punhais.
Pois. Em suma: não gostei. E de novo não sei bem se isso se deve a Luca, se a Brettz.

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Lido: Heróis Relutantes

Heróis Relutantes (bibliografia) é uma noveleta de Frank M. Robinson sobre a Lua, que no entanto não é sobre a Lua. O ambiente é uma base lunar, pequena, no início da colonização do nosso satélite, habitada por um punhado (ou até menos) de homens. Devido ao preço elevado das viagens entre a Terra e a Lua, os homens são revezados só uma vez a cada ano e meio, mas há sempre um que fica para trás a fim de ambientar os recém-chegados, a fim de lhes transmitir a experiência adquirida durante ano e meio de respostas aos desafios da vida lunar. E durante esse tempo, deixam tudo para trás. Amigos, família, mulheres e namoradas, um mundo inteiro.

O protagonista da história é um destes homens, no fim de uma permanência de três anos na Lua. Um homem especial porque particularmente adequado à função, e que por isso recebe do controlo de missão a proposta de prolongar a sua estadia durante mais ano e meio. Mas ele está farto. Tem saudades de casa, tem saudades de uma namorada que deixou na Terra, já não aguenta mais o confinamento tosco da base e não ter nada para fazer a não ser as reparações que se façam necessárias e manter os colegas vivos. E é sobre esse conflito que a história versa: o conflito entre as pressões para a permanência e a urgência do regresso, o dever e o gosto de viver. Não é um conto sobre a Lua; é um conto sobre os seus primeiros habitantes e os desafios psicológicos que eles têm de vencer. Um conto melancólico, cheio de humanidade. E, também por isso, é um conto muito bom.

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quarta-feira, 24 de julho de 2013

Lido: Louvor e Simplificação de Pacheco Pereira

Louvor e Simplificação de Pacheco Pereira é uma crónica de escárnio e maldizer de Manuel António Pina sobre o nosso velho conhecido Pacheco Pereira, obviamente. Pina não morre de amores pelo homem, e dá-lhe com força e ironia. Eu também não morro de amores pelo homem (ainda que ele nos últimos tempos tenha andado a dizer e escrever umas coisas acertadas), mas mesmo assim não evitei um certo desconforto. Há nesta crónica um pouco daquela maledicência mesquinha de internet que conhecemos demasiado bem, bem reconhecível apesar de revestida com roupagens menos analfabetas do que é de regra por aqui. Mereça ou não o Pacheco a surra, parte dela faz richochete. E eu mal sorri ao ler isto.

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terça-feira, 23 de julho de 2013

Lido: Um Corpo que Cai

Um Corpo que Cai é um texto curto sobre a criação do homem, entre o conto e a crónica, escrito por José Alberto Braga. E é uma historinha fantástica, descrevendo de forma naturalmente bem-humorada — ou não fosse Braga mais humorista do que escritor, o que aliás se nota bem — a forma como um criador algo desleixado vai adicionando órgãos à criatura. Tudo em barro, bem entendido, que é de barro que a bíblia fala. Mas se acham que o fantástico de inspiração bíblico-cristã vai tornar esta história e este humor bem-comportados, são capazes de ter uma surpresa.

Não é um bom conto, parece-me. Mas é um conto divertido, especialmente quando se chega ao último par de parágrafos.

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segunda-feira, 22 de julho de 2013

Lido: O Vampiro do Sussex

O Vampiro do Sussex (bibliografia), conto de Arthur Conan Doyle, é um conto de vampiros com a particularidade de... não ser um conto de vampiros. Na verdade, trata-se de uma história policial e, sendo policial e de Conan Doyle, tem como protagonista Sherlock Holmes. E, tendo como protagonista Sherlock Holmes, fácil se torna prever que será uma história firmemente ancorada na realidade, por mais sobrenatural que o problema se apresente à primeira vista, pois as capacidades dedutivas do célebre detetive não funcionam no plano fantasmagórico.

De facto, à primeira vista parece haver vampirismo clássico nesta história. Um homem procura Holmes, devido a atitudes estranhas da mulher — que ama —, incluindo atos de violência contra um filho de um casamento anterior e aparentes dentadas no pescoço do filho de ambos, um bebé de peito. E não se trata apenas de indícios: há testemunhas, fidedignas, que terão até chegado a encontrar a mulher com o bebé a sangrar nos braços e a boca ensanguentada.

Contar mais irá desvendar demasiado do enredo, que é movido a mistério, portanto não o farei. Direi apenas que se trata de uma história com a qualidade que seria de esperar de um conto de Sherlock Holmes, ainda que me pareça que um pouco mais de desenvolvimento talvez não lhe ficasse mal... por outro lado, como aquela que li foi mais uma versão livre de Sacadura Brettz, não uma tradução propriamente dita, até pode acontecer que no original esse desenvolvimento exista. Seja como for, versão livre ou não, o conto é bom. E isso, no fundo, é o que importa.

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domingo, 21 de julho de 2013

Lido: Somos uns Queixinhas!

Somos uns Queixinhas! é uma crónica de Manuel António Pina, na qual ele se queixa muito portuguezmente, com verve, piada e um português bom e descontraído, da insuportável queda que os portugueses têm para queixar-se de tudo e mais alguma coisa. Não é nada de original — suponho que não haja cronista português, pelo menos desde Eça, que não tenha feito pelo menos uma crónica a queixar-se da lusa propensão para a queixinha e o queixume — mas Pina consegue ter a qualidade de evitar o tom calimérico e fazê-lo com graça, sem aquela presunção bacoca de tantos outros que se acham acima da ralé. E por isso mesmo, esta crónica de Manuel António Pina é melhor do que a vasta maioria das milhentas outras crónicas escritas sobre este eterno tema do cronismo tuga. Aprovado.

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Lido: Dúvidas Para Além De

Dúvidas Para Além De é um brevíssimo conjunto de dúvidas entrocadilhadas de José Alberto Braga, destinadas a fazer rir, ou pelo menos sorrir, mas que só me conseguiram levar a isso uma vez ou duas. Se bem que, bem vistas as coisas, algumas dessas dúvidas até tenham alguma profundidade. Por exemplo? Bem, esta: "O descanso eterno, cansa muito?" Portanto não é mau, suponho.

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sábado, 20 de julho de 2013

Lido: A Noite do Sexo Fraco

A Noite do Sexo Fraco (bibliografia), conto de um tal Ludovico Bombarda, certamente pseudónimo de alguém, é uma história que só faz realmente sentido neste livro. Abstrandindo-nos de tudo o resto, é uma historieta bastante má, com um enredo banal, escrita no estilo tonitruante da má fantasia, com um único e muito relativo motivo de interesse: ter como protagonista uma guerreira. A história, na pior tradição pulp, não passa de uma descrição do que a heroína faz para matar um feiticeiro malvado, totalmente vazia de substância ou profundidade, e noutro sítio qualquer só me mereceria um gigantesco bocejo.

Ah, mas aqui não. É que neste livro a história foi "cortada" pela "censura". Porquê? Ora, por vários motivos: ofensas à moralidade dos anos 40 em que teria sido escrita (fala de mariquices, vejam só!), subtis (bem, nem por isso) ataques a Salazar, à PIDE e a outros ditadores, coisas assim. De modo que a censura saca do famigerado lápis azul e risca, risca, risca. E o que é riscado, e as notas de rodapé que explicam os cortes, são, numa palavra, hilariantes.

E assim uma má história se torna boa exclusivamente por causa do contexto.

Contos anteriores deste livro:

Lido: Accelerando

Accelerando, de Charles Stross, é aquilo a que se costuma chamar "romance em mosaicos", ou "coleção de histórias interligadas". Trata-se de uma obra de grande fôlego e maior escopo que, em nove histórias interligadas, descreve a evolução da sociedade futura, tanto pré como pós singularidade tecnológica, acompanhando para isso a família Macx ao longo de várias centenas de anos... se bem que ao fim de algum tempo o próprio conceito de ano comece a perder substância.

Para quem não sabe, o conceito de singularidade tecnológica está no cerne das crenças transumanistas. A expressão designa aquele momento em que a maquinaria inteligente criada pelo Homem suplanta o seu criador em termos de capacidade intelectual. Há quem ande a prever o surgimento para breve da singularidade tecnológica há pelo menos duas décadas, e houve escritores de FC que construíram boa parte da sua obra em volta do conceito (notavelmente Vernor Vinge).

E é disso que Stross aqui fala, num livro que muitas vezes (talvez demasiadas?) pende para algo de semelhante ao ensaio, deixando um pouco de lado a história, ou as histórias, que está a contar. Será necessário, pois os conceitos são múltiplos e complexos, desde os intrincados pormenores da especulação económica intermediada por algoritmos sofisticados com que o primeiro protagonista, Manfred Macx, põe em marcha toda a revolução que se vai seguir, até ao desmantelamento de sistemas planetários inteiros com o objetivo de criar maquinaria inteligente e aumentar a área de absorção de energia solar, passando por muitos outros detalhes, por muitas outras ideias. Mas o certo é que o foco nas ideias cria algumas fragilidades ao enredo e a outros aspetos da criação literária.

Muitas dessas ideias não são bem novas na ficção científica ou até da especulação tecnofuturista. O desmantelamento de sistemas planetários está na base da ideia das esferas de Dyson e de outras megastruturas que vêm surgindo na FC desde há várias décadas a esta parte. A mistura ciborgânica, do homem com a máquina, também é velha de décadas. A nanotecnologia idem. Uma rede de intercomunicação através de buracos de verme aspas. A noção de upload de mentes para redes informáticas igualmente. E por aí fora. Mas Stoss consegue aqui combinar todos estes elementos, e mais alguns, num livro vertiginoso, com uma densidade de informação invulgar, e cheio do bom e velho sentido de maravilha que se associa à FC.

A história propriamente dita acaba por ser uma história de sobrevivência. Do princípio ao fim, há sempre qualquer coisa a acossar as personagens, a impeli-las à ação, a levá-las a dar passos que em retrospetiva acabam por parecer inevitáveis. Nisso, este livro é inteiramente transumanista: consultem os sites transumanistas que há espalhados pela web e verão como a singularidade é apresentada na maioria (e não digo em todos porque não conheço todos) como algo de inevitável, como consequência lógica e frequentemente desejável do progresso tecnológico corrente.

Também é um livro bastante típico de ficção científica na unidimensionalidade até das personagens principais. Macx, em particular, nunca muda, mesmo apesar de começar o livro como um homem como todos os outros para o acabar transformado em padrões múltiplos de personalidade, exemplares capazes de se ramificar e de voltar a reunir-se e de viver ora em simulações informáticas, ora em corpos especialmente cultivados para o efeito. Não é credível? Não, não me parece que seja, e não é só nesse detalhe que este livro exige mais da suspensão da descrença do que muitos outros. E aí, quanto a mim, reside a sua maior falha.

Mas os acertos são mais. A história contada é fascinante. As ideias que traz e, mais do que as ideias, a forma como elas são misturadas e fundidas, geram uma experiência de leitura única, auxiliada por uma prosa ágil e razoavelmente sofisticada. E há aspetos na história que são credíveis, alguns demasiado, alguns até de forma assustadora. Só para dar um exemplo, algoritmos de especulação económica existem mesmo no mundo real, e há pessoas muito inteligentes e bem informadas a pensar que são um dos fatores na base da catástrofe económica em que a economia de casino mergulhou o planeta há cinco anos com os resultados que se conhecem.

O conjunto, portanto, é bom. Bastante bom mesmo. Não creio que chegue ao patamar da excelência, mas não anda longe.

Claro, não é livro para toda a gente. Quem goste acima de tudo de personagens não irá sair satisfeito da leitura. Quem não tenha uma base sólida de conhecimento tecnológico irá atravessar longas passagens sem conseguir retirar delas grande coisa a não ser confusão. Accelerando é um livro exigente, mesmo para leitores habituais de ficção científica, e não me parece que seja aconselhável a leitores pouco familiarizados com o género, a não ser que possuam outro tipo de bases que lhes permitam compreendê-lo.

Mas se conseguirem compreendê-lo, irão andar com a cabeça a zunir durante bastante tempo. E isto é um elogio.

Este livro foi obtido gratuitamente na Feedbooks. E continua disponível, aqui.

Lido: Contos Ficção Científica

Contos Ficção Científica (bibliografia) é uma pequena antologia com dois contos de ficção científica, e vou desde já adiantando que não é grande coisa. Oh, a ideia compreende-se: tendo um espaço reduzido, e talvez querendo apresentar algo mais elaborado do que é característico na flash fiction (ainda que haja excelente flash fiction de ficção científica; tenho aqui um livro intitulado 100 Great Science Fiction Short Short Stories, editado pelo Asimov y sus muchachos, cheio de coisa boa), e fazer uma escolha que, apesar disso, desse alguma ideia da variabilidade que o género contém, a opção por apenas dois autores, de épocas e estilos bem distintos, é compreensível.

O problema é que nenhuma destas histórias se inclui entre o que de melhor os seus autores escreveram, até porque ambas são histórias do início das respetivas carreiras, ainda que isso seja mais verdade no caso de Ballard do que de Van Vogt. E, embora Ballard seja um dos meus escritores favoritos do género, e um dos grandes expoentes da New Wave britânica, Van Vogt está longe de ocupar um lugar elevado no meu ranking, mesmo entre os autores da Golden Age.

Assim, não será grande surpresa que tenha achado a junção destes dois contos desequilibrada e, pior, capaz de dar uma pálida imagem do que a ficção científica pode ser. Há, no género, muitos outros contos muito melhores do que estes dois. Mas muito melhores.

Eis o que achei de cada um dos contos:
Este livro foi comprado.

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Lido: Lokis

Lokis (bibliografia) é uma longa noveleta de Prosper Mérimée que não me parece inteiramente bem enquadrada num livro que pretende apresentar histórias de vampiros. É, contudo, uma história bastante boa. Narrada na primeira pessoa pelo protagonista, sacerdote e linguista, relata a sua viagem pela Lituânia a fim de recolher dados sobre o "jmude", dialeto lituano que, segundo a história, seria falado pelo povo da Samogícia, região que ocupa o noroeste da Lituânia. Aí, o protagonista hospeda-se na propriedade de um estranho nobre local e a história segue por aí fora, em situações razoavelmente comuns na ficção oitocentista. Mas sempre com toques agoirentos que pressagiam a existência naquele local de algo de sobrenatural. Uma condessa louca que trata o anfitrião por "urso", estranhos recolhimentos e ruídos noturnos, conversas que são levadas por caminhos desconfortáveis cheios de alusões mais ou menos claras a canibalismo, animais com comportamentos bizarros, enfim, uma longa série de indícios a levarem o leitor a pensar (apesar da fleuma do protagonista, que de nada aparenta dar-se conta) que alguém naquela casa não é bem o que parece.

O desfecho, no entanto, parece ser mais característico de uma história de licantropos do que propriamente de vampiros. E não é a primeira vez que isso acontece neste livro. Pelo que tenho lido, há uma certa sobreposição dos dois conceitos no folclore do Leste europeu (e ambas as histórias em que isso acontece passam-se, total ou parcialmente, no leste da Europa), e essa sobreposição extravasou para a literatura publicada antes de Stoker cristalizar na literatura de horror um determinado conceito de vampiro e as duas criaturas se separarem (em definitivo?) na ficção ao longo do século XX.

Seja como for, é um conto bastante bom, de um ótimo escritor francês no pleno das suas capacidades, apesar de ter já mais de 60 anos quando o escreveu; Lokis foi publicado apenas um ano antes da morte de Mérimée.

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Lido: Umas Férias na Lua

Umas Férias na Lua (bibliografia) é uma noveleta de Arthur C. Clarke que se afasta do tema que tem sido habitual neste livro — a primeira viagem à Lua — para levar o leitor a um ponto mais avançado, no qual já existem as primeiras bases permanentes no nosso satélite. À semelhança do que acontece na Antártida no mundo real, trata-se de bases científicas. Tempos houve em que se sonhou que seria esse o passo lógico a dar após o programa Apollo, mas como todos sabemos tal não aconteceu. E esta história continua ainda hoje, meio século depois de ser escrita, a ser pura ficção científica.

E é bastante mais interessante do que todos os contos anteriores por isso mesmo: por apresentar um futuro que (ainda?) não aconteceu. Mas não só: a abordagem que Clarke faz, as personagens que usa como protagonistas, dão à sua história uma vida que as anteriores, centradas nos surradíssimos clichés do cientista/financeiro obcecado ou do aventureiro disposto a tudo, não têm. Aqui, os protagonistas são a família de um astrónomo colocado numa base lunar que, tendo prescindido de uma licença para vir à Terra por causa de uma descoberta rara que o leva a não poder abandonar o trabalho, decide trazer a família até à Lua. É através dos olhos desta, em particular da filha, adolescente, que toda a maravilha do trabalho do pai e, por extensão, da ciência, da tecnologia e da conquista espacial, é transmitida ao leitor. A história é basicamente a de uma visita guiada, das férias a que o título faz referência, mas o que lhe subjaz é uma defesa arrebatada da conquista do espaço.

É daquelas histórias repletas do sentido de maravilha de que tantas vezes se fala quando se tenta definir a ficção científica. Ou a boa FC, pelo menos. E esta é uma bela noveleta de FC.

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terça-feira, 16 de julho de 2013

Lido: O que me Vale

O que me Vale é um curto poema de Manuel António Pina, cujo principal objetivo parece ser brincar com as palavras. E fá-lo bem, ritmadamente e de forma divertida. Engraçado. E nada mais tenho a dizer sobre ele.

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sábado, 13 de julho de 2013

Lido: O Caçador de Étês

O Caçador de Étês é um conto de José Alberto Braga, algo de próximo à ficção científica, a que talvez se possa chamar humor ufológico. É escrito na primeira pessoa, em forma de depoimento (aliás, começa quase como uma confissão num interrogatório policial, com alguém a pedir a outro alguém para afastar os holofotes), por alguém que afirma já ter viajado em discos voadores e descreve como tal insólito acontecimento terá tido lugar. O conto é curto, as descrições sumárias, o português algo abrasileirado, o que é natural visto o autor ser português mas ter vivido muitos anos no Brasil, mas não deixa de dar origem a uma mistura um pouco estranha. Quanto ao humor, há um par de passagens que dão para risinhos, mais outro par que dá para sorrisos, mas em geral este conto não foi texto que me titilasse os penduricalhos humorísticos. Gostaram desta? Dos penduricalhos humorísticos? Acabei de inventar.

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Lido: Um Leque

Um Leque, é mais um dos muito bem escritos contos de Armando Silva Carvalho. À primeira vista, trata-se de um finamente irónico continho a troçar das convenções da escrita oitocentista; ele é "A." que faz avanços sentimentais, ele é "F." que manda deter uma carruagem, e por aí fora. Há, porém e em contraste com o resto da bem comportada prosa, sexo com fartura, implícito mas também explícito. E mais do que uma referência a Renoir. No fim, aparece-nos o anacronismo de carros barulhentos e fumegantes. O conto pode, portanto, ser também visto como um conto fantástico, quiçá uma viagem no tempo, quiçá as observações de alguém que andou a passear por dentro de um quadro, testemunhando as pequenas historietas que ele conta, até se ver devolvido à poluída realidade contemporânea. Bem vistas as coisas, é disso mesmo que aqui se trata: de alguém que se deixou imergir num quadro durante algum tempo e depois regressou a si mesmo. Bastante bom enquanto conto sobre as delícias do escapismo intermediado pela arte. Mas como conto de humor, pois é numa antologia de humor que se insere, não me convence.

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Lido: Teu Amigo, o Vampiro

Teu Amigo, o Vampiro (bibliografia) é um conto curto de horror do Conde de Lautréamont, surpreendentemente moderno no estilo literário e estrutura e muito bem escrito. Narrado ora na primeira pessoa, ora na segunda, ora em jeito de confissão, de depoimento, ora interpelando diretamente o leitor, conta de forma indireta uma história de descoberta da própria monstruosidade, do modo como o narrador se descobre vampiro, enquanto ao mesmo tempo vai fazendo um retrato, necessariamente curto dada a dimensão do texto, da sua psique. O resultado é francamente bom. Francamente bom.

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quinta-feira, 11 de julho de 2013

Lido: Provérbios Modificados

Provérbios Modificados é um texto de José Alberto Braga que modifica provérbios (surpresa!), procurando com isso fazer humor. Às vezes consegue (exemplo: "Cão que ladra não morde. Enquanto ladra.") Mas é mais frequente ficar-se pelo quase, ou até nem ao quase chegar. E ainda por cima tem um problema com as vírgulas não resolvido pela revisão (exemplo: "um corajoso de certa, vaidade"). Em suma: achei fracote.

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quarta-feira, 10 de julho de 2013

Lido: O Inconsciente

O Inconsciente (bibliografia) é um conto de horror de Tiago Rosa sobre um monstro. Podia ter sido um conto interessante se não fosse estragado pelo estilo pomposo e hiperadjetivado que o autor emprega, e isto apesar de recuperar um tema já bastante gasto. Um estranho bebé, que é abandonado num convento e trancado pelos monges nas masmorras, acaba por se desenvolver ao longo dos anos até se transformar numa criatura gigantesca, grotesca, mas ingénua, sem qualquer noção de moralidade, movida apenas pelos instintos mais primários apesar de mostrar alguns sinais de inteligência. E claro que tudo acaba mal.

Não é nada que não se tenha já visto, até no cinema e na TV.

Mas apesar da pouca originalidade, o conto até está bem construído. O problema é o estilo, o qual isto, qual aquilo, as palavras e expressões pomposas, e sobretudo os "arrebatamentos abstractos e maníacos", essa adjetivação excessiva que é basicamente o que faz com que eu ache insuportável ler Lovecraft. Rosa não é tão extremo, logo não é insuportável. Mas é suficientemente excessivo para eu não ter gostado mesmo deste conto. Mesmo.

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Lido: The Pleasure Garden of Felipe Sagittarius

The Pleasure Garden of Felipe Sagittarius é um conto de Michael Moorcock que pode ser visto como weird fiction, ainda que nesta questão das categorizações haja sempre polémicas. É, sobretudo, um conto bizarro. Num ambiente policial mas surreal, há elementos de ficção científica, fantasia, história alternativa e outros subgéneros mais esotéricos, numa mistura que apesar de tudo é coerente dentro das regras que estabelece para si próprio. E é precisamente este o segredo.

Um tal Sam Begg, Investigador Metatemporal, tem a tarefa de resolver um homicídio ocorrido numa Berlim arruinada não se chega a perceber porquê. Detalhe de toda a relevância: o corpo foi encontrado nos jardins de um tal Bismark, Chefe da Polícia. Detalhe com menos relevância: o morto tinha pulmões de papel, artefacto que parece não ser comum na Alemanha. Detalhe que acaba por ter mais relevância do que à primeira vista pode parecer: Begg vai ser auxiliado na sua tarefa por um Capitão dos Detetives à Paisana da polícia, um homem de bom coração ainda que com uma certa propensão para não gostar de judeus, chamado Adolf Hitler. E o conto segue por aí fora, reviravolta atrás de reviravolta, com Eva Braun, traições e plantas carnívoras à mistura.

É um conto adequadamente alucinatório para aquilo que Moorcock obviamente pretende (numa palavra: subverter). Acho até que é um conto muito bom. Mas, ao lê-lo, senti o mesmo que senti ao ler Mervyn Peake: OK, tudo isto é muito engraçado, mas e daí? Espremida toda esta exuberância imaginativa, que retiro eu desta história? E a resposta é: pouco, muito pouco. Fica a subversão literária. Algum entretenimento. Mas o entretenimento sempre foi para mim fator secundário na apreciação do que leio e quanto à subversão literária... terá ela, reduzida a si mesma, realmente algum interesse intrínseco?

Não sei bem. E é também isso o que acabo por achar deste conto: não sei bem se gostei ou não.

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terça-feira, 9 de julho de 2013

Lido: Destino: Lua

Destino: Lua (bibliografia) é uma novela de ficção científica de Robert A. Heinlein, datada de 1950, que imagina a primeira viagem à Lua. É, em muitos aspetos, bastante semelhante a O Homem que Vendeu a Lua: também aqui a construção do foguetão que levaria os primeiros pioneiros ao nosso satélite está a cargo da iniciativa privada, que também aqui se debate com constrangimentos financeiros e uma oposição retrógrada que é obrigada a derrotar através da trapaça e do engano (nesta parte, um pouco à semelhança de Tendências, de Asimov). E, sim, do heroísmo dos pioneiros, que não hesitam em oferecer-se eles próprios como cobaias de um voo tripulado, propulsionado por um motor atómico experimental e nunca testado.

Em certas coisas, esta história é pior que O Homem que Vendeu a Lua. Quem quiser, por exemplo, apontar a dedo as personagens rasas e unidimensionais da velha FC poderia usar sem receio esta história como paradigma. A ingenuidade do otimismo tecnológico, de que aliás a ficção científica sempre padeceu, chega a ser chocante, em especial tendo em conta que os rebentamentos atómicos de Hiroshima e Nagasaki tinham acontecido vários anos antes (embora, para ser justo, seja provável que toda a extensão da devastação não fosse do conhecimento comum naquela época... e os não menos devastadores efeitos secundários de médio e longo prazo seriam em grande medida desconhecidos, até para os cientistas e militares mais ao corrente do potencial destrutivo das explosões nucleares). E o tom patrioteiro de Amerika Über Alles, o estúpido maniqueísmo de nós somos os bons, os outros são os maus, é no mínimo irritante.

Noutras coisas, contudo, esta história é melhor. Ao focar-se menos nas negociatas empresariais subjacentes ao empreendimento, concentrando-se na viagem propriamente dita, esta história adquire um ritmo mais interessante do que a outra. É, basicamente, uma história de exploração e aventura. E tem pelo menos tantos acertos, em termos da realidade da viagem à Lua, como desacertos. Não é, portanto, tão risível como outra FC produzida na época; não está tão irremediavelmente envelhecida. Também esta foi uma boa história. Mas também esta, decorridos todos estes anos, e apesar de tudo, já deixou de o ser.

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segunda-feira, 8 de julho de 2013

Lido: Al Kindi

Al Kindi é um conto de Armando Silva Carvalho, com mais estrutura do que O Alto mas que tem muito em comum com esse texto. A ironia, de tão subtil, quase não chega a provocar um sorriso; o português tem qualidade; a atmosfera genérica é surrealista. Mas aqui a componente fantástica é mais forte do que no primeiro texto. O protagonista desta história é um filósofo muçulmano — Al Kindi, precisamente — que terá dito (escrito?) no século IX umas coisas inteligentes sobre a natureza do intelecto, e que Carvalho transplanta anacronicamente para uma esplanada popular contemporânea, provavelmente lisboeta, pondo-o em interação com uma cauteleira. O resultado é bastante mais intrigante do que divertido. Mas gostei; há escondida algures no contraste uma verdade que lhe é própria.

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Lido: Billennium

Billennium (bibliografia) é um conto de J. G. Ballard que, embora esteja algo distante do seu melhor (até porque é das suas primeiras obras, antecedendo de um ano tanto a primeira coletânea como o primeiro romance), acaba também por ser bastante típico do autor, no sentido em que encontramos aqui uma sociedade a correr terrivel e grotescamente mal. Ballard é absolutamente brilhante nos seus mundos despovoados e devastados; aqui, encontramos um mundo devastado mas pelo excesso de população, um mundo em que a cada pessoa cabe um espaço de habitação cada vez mais exíguo. A premissa, que não fará grande sentido para um mundo inteiro (muito antes de se chegar a esse ponto a ecologia entraria em colapso, algo que Ballard terá compreendido mais tarde), fá-lo todo para algumas cidades. Tóquio, com os seus hotéis-cápsula, vem repetidamente à mente ao longo da leitura.

Mas o que este conto tem de melhor é a interação entre as personagens. Um homem perde o minúsculo quarto que alugava e decide alugar outro, com um amigo. Iam ficar mais apertados, sim, mas não haveria alternativa. Só que o novo quarto vem a revelar-se uma bênção inesperada, pois no jogo de tabiques com que a cidade está constantemente a reestruturar os seus espaços habitáveis alguém isolara uma sala inteira, à qual conseguem chegar, clandestinamente, deitando abaixo um desses tabiques. Abre-se perante ambos um autêntico paraíso!

Mas depois começam a convidar amigos para se mudarem para lá; afinal, eles tinham tanto espaço só para si, e havia amigos em situações tão complicadas!...

O resultado, mesmo que não seja muito bom enquanto ficção científica propriamente dita, é uma bela e muito irónica reflexão sobre o egoísmo e o altruísmo humanos.

Conto anterior deste livro:

domingo, 7 de julho de 2013

Lido: Berenice

Berenice (bibliografia) é um conto de Edgar Allan Poe, aqui numa tradução feita a partir da versão francesa de Baudelaire, motivo que poderá levar quem conheça a relação entre as traduções de Baudelaire e a popularidade de Poe em França e na Europa a julgar ser essa a explicação para um burilamento de texto superior ao que é hábito encontrar nas traduções portuguesas dos contos do americano. Mas eu tive a curiosidade de passar uma vista de olhos pelo texto original, e a verdade é que a tradução lhe é bastante fiel, o que mostra que, ao contrário do ruído das luzes que às vezes se faz sentir, nem sempre uma tradução de uma tradução é pior do que uma tradução direta.

Quanto ao conto, narrado na primeira pessoa, é uma típica história romântica de vampiros, com o seu sentimentalismo arrebatado e a sua atmosfera trágica, marcada pela loucura, doença e morte. A protagonista, a Berenice do título, é prima e interesse amoroso do narrador, e o conto descreve um período de alguns meses durante os quais uma estranha doença que acomete a jovem (aliás, as doenças são duas, pois o próprio narrador se afirma doente, ainda que a sua tenha uma natureza algo diferente) vai revelando sinais cada vez mais claros de que algo de sobrenatural ali se passa.

Os três ou quatro gatos pingados que costumam ler estas coisas que aqui vou deixando já devem estar por esta altura fartos de saber que o estilo romântico não é do meu agrado. Portanto não gostei particularmente deste conto. Reconheço que está muito bem escrito e que, dentro do estilo, é um conto bastante bom, mas torci-lhe o nariz.

Contos anteriores deste livro:

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Lido: Pagamento Zero

Pagamento Zero é um pequeno conto/crónica/depoimento irónico e de certa forma fantástico, de José Alberto Braga, sobre um homem que tem uma ideia genial para ficar mais rico que Midas: reivindicar a posse do... zero (sim!) e exigir uma taxa pelo uso do número e da palavra. Braga pretende "apenas" fazer humor, e por isso não leva a ideia aos limites do absurdo, o que de certa forma é, para o meu gosto, uma insuficiência. Mas a verdade é que mesmo assim consegue espetar um agulhão eficaz na tendência que tem havido nas últimas décadas de registar a posse e invenção das coisas mais disparatadas. Quem não se lembra do processo que opôs recentemente a Apple à Samsung, com uma empresa a reivindicar violação de direitos de autor por parte da outra devido à "cópia" daquela espantosa inovação chamada... cantos arredondados? É mais ou menos por aí que Braga envereda, pela crítica (ou pelo gozo, o que vai dar ao mesmo) deste tipo de abuso corporativo e, embora o seu conto(?) não seja nenhuma obra-prima da literatura, é eficaz. E faz sorrir.

Texto anterior deste livro:

Lido: O Alto

O Alto, de Armando Silva Carvalho, é um... conto? fragmento? crónica?... enfim, um texto de pendor sobretudo surrealista que vai tocando ao de leve, numa prosa flutuante de borboleta a esvoaçar sobre nenúfares, numa miríade de assuntos e situações, mas sem se deter em nenhuma. Há nele ironia. Alguma. Mal chega para o sorriso. Há uma língua portuguesa bem tratada, o que, aliás, parece ser o objetivo principal. Há uns toques de fantástico, do mesmo género das girafas em chamas de Dali, embora com menos intensidade. Mas se há mais do que isso, eu não vi. O defeito talvez seja meu. É provável que sim.

Textos anteriores deste livro:

Lido: O Monstro

O Monstro (bibliografia) é um conto de ficção científica de A. E. Van Vogt datado da golden age (1948) e que apresenta um dos mais duradouros clichés do género: o bug eyed monster (expressão que há quem traduza para "monstro de olhos esbugalhados", mas na verdade significa "monstro de olhos de inseto"). É um conto, há que dizê-lo, bastante mau. Colado com cuspo, e talvez mal traduzido (parece-me notar vários casos da síndrome "tradutor que não percebeu o que acabou de ler e faz o melhor possível com base nessa incompreensão), é daqueles contos de FC que nos procuram ver pelos olhos do Outro, sendo o Outro desta vez uma raça de alienígenas agressivos que se vão expandindo pela galáxia, devastando um planeta após outro a fim de os preparar para serem colonizados. E, claro, chegam à Terra.

Mas depois fazem uma magia tecnológica qualquer com as células dos derrotados (ou de mortos antigos; múmias e coisas do género), devolvendo-os brevemente à vida, não se chega a perceber bem para quê. Devolvendo-os à vida por inteiro, note-se, com as ideias, as memórias, as atitudes que tinham no momento da morte. Até depararem com o Monstro.

O Monstro é um de nós, e é isso que o conto tem de mais interessante. O problema é ser um de nós à maneira da golden age: intrépido herói, dotado de capacidades sobre-humanas de entendimento e desenrascanço, que se enfia ousadamente atrás das linhas adversárias (de uma espécie, note-se, tão mais avançada tecnologicamente do que nós como nós do que as formigas) e frustrando os planos aos alienígenas candidatos a invasores. E soam fanfarras: PARI-PARAAA!

Que nada daquilo faça grande sentido é secundário. Infelizmente.

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Lido: O Bom Vampiro

O Bom Vampiro (bibliografia), texto de Charles Nodier com a dimensão de uma vinheta, não se apresenta como conto, mas como texto etnográfico, descrevendo a existência, nos Morlaques (região montanhosa situada no norte da Dalmácia, atual Croácia), de uns tais vukodlacks, vampiros bondosos, atacados pelo mal vampírico que os horroriza e repugna mas ao qual não são capazes de resistir, muito embora a palavra que é usada para os designar tenha mais a ver com as que se referem aos lobisomens nas línguas eslávicas do que propriamente com vampiros. Com apenas duas páginas, o texto não tem história; limita-se a descrever tais criaturas (ou tal doença?) em traços gerais, sem aprofundar. Mas, por outro lado, essas duas páginas bastam para demonstrar que a figura do vampiro sem maldade não é uma invenção delicodoce dos modernos romances vampíricos para meninas, antes remonta, pelo menos, a um par de séculos atrás. Interessante, embora não me pareça que passe disso.

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Lido: Ao Sabor da Corrente

Ao Sabor da Corrente é um poema humorístico de José Alberto Braga cujo título me parece indicar a forma como foi escrito. Trocadilhos, tem em fartura, mas parece-me faltar-lhe algo mais do que isso. Piada, por exemplo. E também sentido, dado que não parece haver nenhum fio condutor que interligue as estrofes. Estas são quadras, mas não populares, pois apesar de terem rimas não têm a métrica que as quadras populares exigem. Em suma: não gostei muito.

Lido: Horror em Sangre de Cristo

Horror em Sangre de Cristo (bibliografia) é uma noveleta de Maxwell Gun (também conhecido como Marcelo Augusto Galvão) ambientada no Velho Oeste americano. Mais um conto razoavelmente lovecraftiano, pelo menos na medida em que a sua abordagem à história é a do horror cósmico, com as suas criaturas transcendentes e predatórias, de origem extraterrestre, trata-se de um bom pastiche dos velhos pulps, embora não me pareça um bom conto porque revela não só as qualidades típicas das histórias pulp (um bom ritmo, cenas de ação convincentes, etc.) mas também as suas fragilidades (deficiências no tratamento da língua, personagens unidimensionais, final previsível, etc.). Seguindo fielmente o guião, o horror irrompe na pequena cidade de Sangre de Cristo, Novo México, sob a forma de misteriosos assassínios, e pouco depois a ela chega também um inglês, igualmente misterioso, cheio de conhecimentos a que os locais estão alheios, e que se vem a revelar a única pessoa capaz de os salvar. E basta isto para se adivinhar como a história vai terminar. É um conto inteiramente adequado ao livro a que pertence e basta isto para o justificar.

Contos anteriores deste livro:

Lido: Ficções, nº 15

O número 15 da revista Ficções (bibliografia) foi, para mim, feito de altos e baixos. Começa muito bem, com uma série de contos que, embora muito diferentes uns dos outros, acabam por ser todos (bem, com uma exceção) de leitura agradável, mas depois do conto de Dick a coisa descamba, com dois contos que não me agradaram de todo e um trio de textos de Beckett que, embora proporcionem uma experiência linguística de todo invulgar e de muito elevada qualidade, pouco me deram além disso. Como é natural, em todos os números da Ficções há contos que me agradam mais e outros menos. Isso é inerente a todas as compilações de contos, em especial às que juntam diversos autores. No entanto, não é comum encontrar nesta revista histórias que me desagradem tão violentamente como aconteceu com Fim-de-Semana. E também não é comum encontrar-se seja em que publicação for contrastes tão violentos como os que aqui existem entre a língua em estado puro de Beckett e as ideias em estado puro de Dick ou entre a aguda consciência social de Bellow e a futilidade burguesa de Weldon e Welty.

A impressão geral foi, pois, de grande desequilíbrio. Talvez tenha sido propositado, numa tentativa de conferir versatilidade à seleção, mas a verdade é que o achei excessivo.

Somando tudo, este número da revista acabou por me saber a pouco. Também porque a componente literária que mais interesse costuma despertar-me, o fantástico nas suas várias vertentes, se encontra aqui pouco presente, mesmo havendo a invulgar presença de um conto de ficção científica. Também por isso.

Eis o que achei de cada um dos textos:
Esta revista foi comprada.

Ratazanas

É em dias como o de hoje (ou de ontem, se vocês se regem pela arbitrariedade do relógio) que uma série de contos que começam quase todos com «O ministro abriu a boca e dela saíram ratazanas.» faz o mais completo dos sentidos.

segunda-feira, 1 de julho de 2013

Lido: Pelos Pentelhos

Pelos Pentelhos, que uma vez mais não é título mas primeiro verso (e tem logo de ser primeiro verso, para informar à cabeça o leitor ao que vem) de um poema hesitante de Alberto Pimenta, que sabe que quer escrever algo sobre pentelhos, trampa, Platão e rosas, mas não sabe bem o quê nem como. Mas lá vai tentando, estrofe a estrofe, experimentando permutações dos seus vários temas até que por fim consegue. É um humor um bocado mais básico do que o que Pimenta usa em textos anteriores, mas também dá para o sorrisinho. E de resto, a literatura portuguesa tem uma longa e ilustre tradição de poesia javardolas, portanto isto se calhar nem é tão básico como à primeira vista poderá parecer.

Textos anteriores deste livro: