quinta-feira, 26 de abril de 2007

Do medo

Começa-se tudo por algum sítio, e neste caso pouco importa o sítio por onde se começa. Porque sim, o que é o mesmo que dizer por nenhum motivo em especial, vou começar pelo medo. E pelo PC.

O PC andou anos a dizer que não era preciso referendo nenhum à despenalização do aborto, que a assembleia da república tinha toda a competência para decidir despenalizá-lo sozinha, sem perguntar ao povo o que o povo preferia.

E tinha razão. Formalmente, pelo menos, a AR podia ter decidido com toda a legitimidade. Se deputados eleitos pelos cidadãos, conhecendo de antemão esses cidadãos a posição dos seus partidos no que toca ao aborto, tivessem decidido no parlamento o destino a dar ao problema, isso não seria nem mais nem menos democrático do que legitimar a decisão por via referendária, especialmente se vários partidos não se tivessem comprometido com o referendo em campanha eleitoral. Coisa que o PC não fez, logo tinha toda a legitimidade para defender o que defendia.

Até aí tudo certo, portanto.

Mas a porca tinha de torcer o rabo um dia. Sabe-se bem como as porcas, essas porcas, adoram andar por aí a torcer rabos como se fossem algumas... bem... porcas.

É que agora, nem três meses depois, vem o PC dizer, a propósito da posição do Cavaco sobre o eventual referendo ao tratado constitucional europeu, que recusar fazer referendos é ter medo do voto popular. Donde se conclui, ou a lógica é um tubérculo qualquer, que a posição original do PC sobre o referendo à despenalização da IVG não seria tanto uma posição de princípio mas precisamente isso: medo do voto popular.

Tivesse o PC admitido antes que tinha medo do voto popular no que toca à despenalização da IVG, até daria para aplaudir esta honestidade. É raro, e poderia até ser refrescante, ver os partidos admitirem desta forma cândida que na sua forma de fazer política a democracia é só quando convém e que vale tudo para ganhar, votos ou o que seja. Todos funcionam desta forma, mas não é comum que o deixem assim tão cristalino. Seria de dar vivas ao PC.

Mas não. Não era medo do voto popular que o PC argumentava para pedir que a AR despachasse o assunto do aborto.

Ora bolas...

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