Os Filhos do Fogo (bibliografia) é uma curiosa noveleta de Jorge Palinhos que me fez lembrar um pouco O Prestígio, de Christopher Priest. O protagonista, também narrador, é um homem de certas posses, como costumava dizer-se nas histórias de antigamente, amigo da cultura e de tertúlias, que a páginas tantas, numa dessas tertúlias, conhece um tal Casimiro Gonçalves, poeta de vulto e de mérito. Nada de mais? Não tanto assim. Qual não é o seu espanto quando, dias mais tarde, acorda a meio da noite com o mesmíssimo Casimiro no seu quarto, em cima de si, a tentar sufocá-lo com uma almofada.
Palinhos arranca daqui para construir uma história mirabolante, num ambiente e num estilo muito oitocentistas. O que a faz mover é, claro, o mistério em volta de Casimiro Gonçalves, e por isso mesmo não o irei detalhar. Direi apenas que o ambiente oitocentista inclui também uma certa abordagem um pouco, digamos, "etérea" às questões físicas e que isso tem relevância central para o enredo, além de ser aquilo que mais me levou a recordação até ao romance de Priest.
A noveleta é boa. Bastante, mesmo. Poderá exigir um certo esforço para suspender a descrença mas, uma vez esse esforço bem sucedido, fica-se livre para apreciar uma história muito bem estruturada e bem escrita, com toques de humor nos lugares certos.
A única coisa que me deixou algumas dúvidas foi a forma como ela se encaixa nas restantes que compõem o livro. Pareceu-me destoar um pouco; as duas histórias lidas antes dela nada têm dos toques novecentistas que Palinhos inculcou na sua, o que faz com que esta última tenha um certo ar de corpo estranho. Mas a verdade é que pode perfeitamente ser só impressão ilusória e passageira; afinal de contas, é apenas a terceira história em 17.
Contos anteriores deste livro:
Sem comentários:
Enviar um comentário
Por motivos de spam persistente, todos os comentários neste blogue são moderados. Comentários legítimos passam, mas pode demorar algum tempo. Como sempre acontece, paga a maioria por uma minoria de abusadores. Parece ser assim que o mundo funciona, infelizmente.