O Luís Ene tem vindo a publicar uns quantos posts sobre este assunto e quero dizer que subscrevo quase cada uma das suas palavras. Mas agora que as coisas estão mais calmas quero acrescentar qualquer coisa que vai para além das queixas que ele debita relativamente à comunicação social. Quero falar do povo.
Tem-se dito por aí que "o povo" isto, e "o povo" aquilo, querendo-se com "o povo" designar aquelas centenas de imbecis que vão, entre insultos, gozar o espectáculo de uma família tragicamente disfuncional (pelo menos isso já está provado) para a Figueira ou para as imediações do tribunal de Portimão. É o mesmo tipo de raciocínio que levou as televisões a fazer directos insuportavelmente longos a partir do Barlavento algarvio. A ideia de que é aquilo que "o povo" quer.
A verdade é que o povo não é aquilo. O povo, os dez milhões de portugueses que o constituem, não tem nada a ver com aquilo. Mesmo se reduzirmos o povo às suas camadas mais desfavorecidas, pouco de comum há entre ele e aquela gente para além de ela ser uma parte dele. O povo terá, sim, ficado chocado com o crime, pelo menos aquele povo que não se esteve nas tintas para ele, mas não se vai amontoar em cima do tribunal aos berros de "assassino", "puta" ou "o que faz falta aqui é a PIDE".
Tanto assim que para que a reunião de imbecis em Portimão tivesse aquelas centenas de componentes foi preciso "importá-los" não só dos concelhos limítrofes de Lagos, Silves e Lagoa, mas até do Alentejo. O povo, na sua esmagadora maioria, ficou em casa. Talvez chocado, mas a tratar das suas vidas e à espera que a justiça funcionasse. Mesmo os 40 mil habitantes do concelho de Portimão (o povo de Portimão), que não teriam de se deslocar muito para se irem juntar à maralha. Ficaram quase todos em casa.
Que é que isto quer dizer?
Quer dizer que quando se aponta para aquela gente e se diz "o povo" está-se a insultar o povo verdadeiro, está-se a imbecilizá-lo, está-se a subumanizá-lo. E isso, meus caros, não é inocente.
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