quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Lido: A Casa Quieta

A Casa Quieta é um romance de Rodrigo Guedes de Carvalho que nem sequer se esforça para esconder a sua afiliação a um estilo e perspetiva literários liderados por António Lobo Antunes. Um longo exercício de estilo com comparativamente pouco conteúdo, repleto de repetições e ruminações das mesmas ideias, consegue ainda assim ser menos encerrado na forma do que livros como Que Cavalos São Aqueles que Fazem Sombra no Mar? Mas, apesar disso, ainda o é muito em demasia para que eu consiga gostar dele.

Não é um mau livro, note-se. Literariamente é até um bom livro, na medida em que Rodrigo Guedes de Carvalho faz bem aquilo que se propõe fazer. Há pormenores interessantes, como alguma adaptação do estilo que é usado àquele que estava em voga entre os lobantunianos na época que está a ser representada em cada parte do romance (este abrange um período de 20 anos, entre 1985 e 2005), ou o facto de começar pelo fim e a ele regressar, no fim. Mas tudo isto se refere à forma. O conteúdo é um fado do desgraçadinho quase insuportavelmente deprimido e deprimente, com uma história familiar de mortes e enlouquecimentos que daria para 50 páginas, se tanto, caso não fosse esticado e re-esticado, torcido e retorcido quase até ao ponto de rotura pelos artifícios da forma. O livro tem 250. 250 longas, lentas, palavrosas páginas que pouco atam e nada desatam, sobre a decadência duma família da alta burguesia lisboeta (não da antiga, porém; da nova-rica). Não há um pingo de humor, há apenas um lento desespero ao som gemebundo das guitarras.

Sim, está bem feito. Mas. Não. Há. Pachorra.

Não há pachorra para nenhuma daquela gente, cujo traço de personalidade realmente marcante é ter muita, muita, muita pena de si própria. Não há pachorra para uma análise tão superficial sobre a condição humana que nos reduz a meros bocados de carne à espera da morte. Não há pachorra para todo aquele pessimismo oprimente, para toda aquela choradeira sem redenção, para todo aquele silêncio. Só dá vontade de abrir as janelas da casa quieta e berrar "tirem-me daqui!"

Este é dos tais livros que apesar das qualidades que possam ter, acabam por se tornar detestáveis. Para mim, bem entendido. Há quem se pele por coisas destas.

Mas mais detestável ainda é tanta da literatura mainstream portuguesa das últimas décadas ser precisamente assim. Forma sempre sobreposta ao conteúdo (e nisto salva-se o Saramago, que criou a sua forma, o seu estilo, e depois se dedicou a explorá-lo com conteúdo, e às vezes conteúdo de primeiríssima água), e o pouco conteúdo que consegue a duras penas quebrar a barreira da forma a sair deprimente, deprimido, negro como catacumbas. O resultado? Estátuas literárias que até podem estar muto bem esculpidas por fora mas que por dentro estão ocas, sem um soprozinho de vida, sem sequer uma aragem, um rebentar de ondas. Coisas mortas. Caixas vazias.

Meus senhores, escritores, editores. Leitores. Quero dizer-vos que. Não. Há. Pachorra.

1 comentário:

  1. Também não apreciei o livro. Fiquei com sono o que é sempre mal sinal. Foi com esforço que cheguei perto das 12 páginas.

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