Anda por aí toda a gente muito eufórica porque ah e tal e viva a língua portuguesa porque faz 800 anos.
Não faz nada, desculpem lá rebentar-vos a bolha da chiclete.
O que faz 800 anos é um documento. Dizem que é o primeiro escrito em português, mas não só não é porque há outros mais antigos e muito provavelmente outros mais antigos ainda existiram mas se perderam entretanto, como aquilo não é português no sentido moderno do termo: é galaico-português. Podemos considerar que é a mesma coisa, mas para isso teremos de integrar o galego moderno na família da língua portuguesa. E eu até concordo com essa integração, mas a verdade é que isso é irrelevante.
É que as línguas não nascem quando são escritas. Nascem, ou melhor, "nascem" quando as pessoas começam a falá-las. E meti nascem em aspas porque mesmo isto é errado: à parte as línguas que são invenções motivadas por política, internacionalismo, nacionalismo ou linguística, e que são uma minoria muito reduzida, as línguas não nascem. Vão, isso sim, evoluindo devagar de outras línguas mais antigas, num processo que demora séculos. Foi o caso da nossa, que evoluiu devagarinho do velho latim, primeiro diferenciando-se em dialeto e mais tarde em língua propriamente dita, processo que demorou ao todo cerca de um milénio.
Falar-se do nascimento da língua portuguesa é, portanto, um absurdo. Querem comemorar o papel que faz agora 800 anos? Comemorem o papel. Mas deixem a língua em paz.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Por motivos de spam persistente, todos os comentários neste blogue são moderados. Comentários legítimos passam, mas pode demorar algum tempo. Como sempre acontece, paga a maioria por uma minoria de abusadores. Parece ser assim que o mundo funciona, infelizmente.