Li há dias alguém dizer que a maioria das pessoas que conhece prefere ler segundo a antiga ortografia.
Tenho a certeza absoluta de que é a mais pura das verdades. Mas a maioria das pessoas que eu conheço prefere ler coisas bem escritas e bem elaboradas, seja qual for a ortografia. Tanto lhes dá se é a moderna, se é a antiga, se é a portuguesa, se é a brasileira, se é, até, a orthographia pseudo ethymologica anterior a 1911. Para isso, estão-se basicamente nas tintas, e são suficientemente inteligentes e flexíveis para saltar de uma para outra sem qualquer dificuldade (ou sem grande dificuldade quando é a anterior a 1911, que é a que mais se afasta de todas as outras). Porque o que a maioria das pessoas que eu conheço quer mesmo é ler coisas interessantes, escritas em bom português.
Mas repito: não tenho a mínima dúvida de que o que a tal pessoa de que falei no princípio disse é a mais absoluta das verdades. É que les bons esprits se rencontrent. Great minds think alike. E etc.
E o inverso também é verdadeiro.
Há a questão de sensibilidade artística. Se existisse um pénis entre cada parágrafo isso iria certamente distrair-me da leitura. Mas não sendo extremista, se houvesse erros ortográficos, ainda que "mudos" também distrairia. Algo como "har" em vez de "ar."
ResponderEliminarE quem não gosta do Acordo (muita gente, como o senhor referiu) irá distrair-se sempre. A sua mente irá reverter para o Acordo, quer queira quer não.
Eu falo por experiência, larguei a leitura do Acácia ao fim de três páginas. E conheço muitos casos assim.
Não há questão nenhuma de sensibilidade artística. Os casmurros anti-AO não têm nem mais nem menos "sensibilidade artística" do que os que são capazes de se adaptar.
ResponderEliminarA questão que existe é apenas uma: rigidez mental. É a única coisa que explica o facto de que, embora todos nós tenhamos aprendido a ler segundo as regras antigas, uns se adaptam com a maior facilidade às novas, e outros não.
Já aconteceu o mesmo em 1911. E acontecerá sempre que se fizer uma atualização ortográfica. É natural.
Mas ser natural não implica que a língua portuguesa tenha de ficar refém dos seus utilizadores mais inflexíveis. A inflexibilidade, a resistência à mudança, a casmurrice, é uma sentença de morte para a língua.
Os que não se conseguem adaptar não irão transformar a nossa língua num fóssil, por mais que tentem fazê-lo.
É natural no nosso país. Quantos efectivamente fizeram Acordos? A Inglaterra recusou três já.
ResponderEliminarNós sempre fomos um país sofredor de alterações forçadas à língua. Daí que o nosso povo vá com a desculpa do: "A mudança é natural." Claro que é, então não a forcem. Eliminar grafemas não é algo com bons resultados.
E o que diz o senhor ao facto de só ter havido dois filólogos na elaboração do Acordo? E do facto de nunca ter sido entregue o vocabulário comum? E da esmagadora maioria do povo estar contra? E linguistas, também.
Não estamos numa democracia? Mudanças à língua merece no mínimo um referendo.
Tem havido milhares de reformas ortográficas por este mundo fora. Só no século XX houve centenas. Houve até línguas que mudaram de ALFABETO.
ResponderEliminarE já que me fala de Inglaterra, o inglês que se escreve hoje não é idêntico ao que se escrevia há 100 anos. Houve várias atualizações ortográficas em vários países anglófonos ao longo do último século. Pequenas, é certo, mas existiram. Ainda recentemente houve uma polémica por causa da abolição de um apóstrofo.
E já agora, era bom que as pessoas que querem ter opinião sobre isto soubessem o mínimo. E o mínimo é, por exemplo, saber que uma coisa é a língua, outra MUITO DIFERENTE são as convenções ortográficas com que ela se escreve.
Quanto ao "facto" de só terem havido dois filólogos na elaboração do acordo, é mentira.
A esmagadora maioria do povo estar contra é outra mentira. A esmagadora maioria do povo está-se nas tintas. E a esmagadora maioria do povo que acha que está contra foi de tal maneira aldrabada por graçamouras que julga que vai ter de passar a escrever "fato" em vez de "facto". Quanto aos linguistas, a maioria não está contra o acordo: têm dúvidas sobre certos aspetos pontuais do acordo. E isso, até os que são globalmente favoráveis à nova ortografia têm.
Se mudanças à língua merecem no mínimo um referendo, toca a referendar esse "mudanças merece" que você aí põe. Isso sim, é uma mudança à língua. ;) Passar-se a escrever "ato" conforme se pronuncia não é.