O Sul é um conto de Jorge Luís Borges que, pelo menos à primeira vista, nada tem de fantástico. Relata as desventuras de um tal Juan Dahlmann que às tantas se acha a debater-se pela vida, no hospital, depois de o seu entusiasmo por um exemplar recém-adquirido de As Mil e Uma Noites o ter levado a dar uma cabeçada, da qual resultou uma ferida, a qual entrou em septicémia. Embora já se fosse desenganando, acaba por recuperar e parte para sul, para convalescer. Mas aí é quase como se a Dona Morte não se deixasse levar pela habilidade dos médicos, e acaba envolvido, sem saber como nem porquê, num duelo.
Há neste conto, de enredo inteiramente realista (na verdade é até autobiográfico, pois Borges sofreu mesmo um problema de saúde grave causado por um ferimento na cabeça), uma atmosfera que de certa forma o aproxima do fantástico. De resto, é uma atmosfera muito semelhante à que se encontra em O Fim, ainda que neste conto o fantástico seja mais concreto do que em O Sul, onde só existe se interpretarmos o conto sob esse prisma. Mas em ambos os contos há a noção fatalista de que as coisas simplesmente acontecem, de que não vale a pena tentar remar contra a maré. Há em ambos personagens sem qualquer mão sobre o rumo que as suas vidas seguem.
Mas é bom, este conto? No prólogo desta parte do livro Borges diz que é (talvez, só talvez) o seu melhor conto. Eu não creio que o seja; os melhores contos, os exercícios realmente assombrosos de criação literária, estão, julgo, na primeira parte. Mas é um bom conto, sim.
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