quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Opiniões pessoalíssimas e intransmissíveis, primeira parte

Tenho vindo a ler com a maior atenção os 86 artigos de contributo (não são bem 86... já lá iremos) para o debate que o Bloco de Esquerda está neste momento a fazer na preparação da convenção e que podem ser encontrados aqui (PDF). A metodologia tem sido simples: leio o título, ignoro o(s) autor(es), leio o artigo, tiro umas notas e depois vou ver quem escreveu e que moção apoia. Não a que moção estão os textos afetos, note-se: que moção os autores apoiam. É algo diferente.

Isto é uma súmula o mais rápida possível do que penso de cada um deles, ou seja, uma compilação das notas que fui tirando, seguida da moção apoiada pelos autores.

Quem não tenha interesse por política nem pelo BE, passe adiante. Isto não é para vocês. Os outros sejam bem-vindos. Espero não vos aborrecer, embora vá desde logo avisando que geralmente estou de acordo... por algum motivo estou neste partido e não em algum dos outros.

Vamos lá então aos primeiros vinte, mais coisa, menos coisa.

1. Um Partido Para a Luta Social - Artigo de balanço sobre a atividade do "Que Se Lixe A Troika," escrito por alguns dos seus ativistas, e a ligação do Bloco a esse movimento, apontando algumas contradições e insuficiências. Concordo quase com cada palavra. Na verdade, só não concordo com o fim. Não creio que seja o status quo que melhor poderá responder a insuficiências que foi o status quo que criou. (Moção U)

2. A Esquerda e o PS - Artigo de contextualização das relações entre o PS e os partidos à sua esquerda, mas também das várias atitudes perante o PS que existem dentro do próprio Bloco, propondo uma forma de ultrapassar bloqueios à ação comum. Concordo por completo. (Moção B)

3. A Centralidade do Trabalho no Nosso Combate - Artigo sobre a relação entre o BE e o mundo do trabalho, com contextualização do que neste tem acontecido nos últimos tempos. Não gostei muito. Embora concorde com o que nele se diz, parece-me um conjunto de boas intenções demasiado vago. (Moção U)

4. Lutar Pelo Direito ao Trabalho e Pelos Direitos Sociais, Vencer a Precariedade e o Desemprego - Artigo com um tema semelhante ao anterior, embora se concentre mais nas questões ligadas à precariedade laboral. De novo, concordo quase por completo. É um artigo mais sólido que o anterior, motivo pelo qual gostei bastante mais deste. (Moção U)

5. Basta-nos a Constituição? - Artigo basicamente sobre a proposta da moção E de centrar a luta política na defesa da Constituição. Não gostei. Embora concorde que a Constituição não basta, e embora concorde com a ideia de que a defesa da Constituição está longe de ser a questão fundamental dos próximos tempos, desagradou-me muito o tom de mal disfarçado sectarismo patente no artigo. Não é porque é preciso encontrar algo que distinga o Bloco do PS que a defesa da Constituição não chega; é porque de facto, para tirar o país do buraco, não chega. (Moção U)

6. As Autarquias Locais e o seu Relacionamento Institucional com o Estado e as Regiões Autónomas - Artigo com propostas concretas para mudar a relação entre as autarquias e os poderes nacionais e regionais. Gostei do caráter propositivo e objetivo do texto. À primeira vista concordo com as propostas, mas precisaria de me informar melhor sobre os assuntos em pauta para ter uma opinião mais sólida sobre elas. (Moção E)

7. Poderes Tributários e Serviços Públicos das Autarquias Locais - Artigo que faz um apanhado de ideias autárquicas que, na verdade, têm estado no centro do trabalho autárquico do BE nos últimos tempos... e bem. Concordo praticamente com tudo, mas não traz nada de novo. (Moção E)

8. Democracia Local - Outro artigo propositivo sobre mudanças a fazer na legislação e prática autárquicas. Estou basicamente de acordo, apesar de ser menos otimista quanto às virtudes da democracia popular do que os articulistas mostram ser. Mas sim, creio que a generalidade daquelas mudanças faz todo o sentido. (Moção E)

9. Em Bloco Contra o TTIP - Artigo explicativo sobre o que é e quais as consequências que a Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP é a sigla inglesa) terá para Portugal e a Europa. Exceto num pormenor (não estou inteiramente convencido de que o PS apoia mesmo este tratado, embora concorde que a posição dúbia do costume não serve), poderia subscrevê-lo e julgo que não há uma pessoa no Bloco e até em setores que vão muito para lá do partido que não o subscreveria. (Moção U)

10. Os Jovens Todos, na Luta Toda! - Artigo sobre a relação do Bloco com a juventude. É um tema que basicamente desconheço, portanto nem concordo nem deixo de concordar. Noto, no entanto, que há um tom genérico no texto que me parece sugerir um embrião de criação de uma juventude partidária, ideia que me desagrada profundamente, tal como também me desagrada a ideologia que reduz a política à "luta". A luta faz parte, com certeza, mas não é o alfa e o ómega da política. (Moção E)

11. Ciência Precisa-se! - Artigo em que é feito um rápido diagnóstico do estado miserável em que este governo tem deixado a investigação científica no país e se lançam ideias sobre a relação do Bloco com esse setor. Só não concordo por inteiro porque me parece que parte do diagnóstico é algo simplista - na verdade, ao capital a ciência (alguma ciência, pelo menos) interessa porque só com ela é possível implementar indústrias de alto valor acrescentado. A questão, parece-me, é que existem pressões fortes, vindas da nossa direita atávica e de poderosos setores internacionais, para destruir o investimento em ciência da Europa do sul. É parte do esforço de terceiro-mundização das nossas sociedades que está em curso. (Várias moções)

12. A Eleição de Delegados/as e a Desvalorização dos Debates - Artigo que critica a opção de realizar os debates preparatórios da convenção já com as listas de candidatos a delegados pelas moções encerradas. Estou inteiramente de acordo com esta crítica. Os prazos deviam, de facto, ser outros. (Moção R)

13. Reinventar a Unidade, Desdramatizar a Pluralidade - Artigo preocupado com o momento interno no Bloco e as tensões internas, onde se propõe um esquema coletivo de liderança. Estou plenamente de acordo. (Moção R)

14. Que Caminho Tão Longo, que Viagem Tão Comprida! - Artigo, muito bem escrito, sobre a relação, nem sempre fácil, entre a esquerda e o feminismo. Farta-se de pôr dedos em feridas incómodas e por isso mesmo é tão bom. De se lhe tirar o chapéu, mesmo. (Moção B)

15. Ainda a Paridade - Artigo sobre as questões da paridade dentro do BE. Deixou-me ambivalente. Concordo na parte da crítica à coordenação bicéfala e na insuficiência de autocrítica na moção U, mas já discordo na exigência de paridade total que nele se faz. A questão é que a participação não é paritária; está, mesmo, muito longe de o ser. Por isso parece-me inviável que se tente fazer nascer dirigentes de um terreno onde não existem militantes. O que de facto importaria no Bloco, bem mais do que forçar paridades inexistentes na prática, era ir à raiz do motivo por que os homens continuam ainda a participar muitíssimo mais do que as mulheres no trabalho do partido e criar mecanismos internos que possibilitem inverter essa situação, no todo ou em parte. Depois sim, dever-se-á avançar para a paridade total. (Moção E)

16. Roteiro Para uma Cidadania Ativa, na Construção Duma Democracia Real - Artigo com propostas de organização dos cidadãos e algumas ideias sobre a relação entre o BE e essas organizações cidadãs. Embora existam algumas ideias que me parecem certas e outras que me parecem meritórias, não concordo lá muito porque ou fui eu que entendi mal o que aqui é proposto, ou parte das questões organizativas são redundantes com a possibilidade cidadã de participação em instituições já existentes como as assembleias municipais. (primordialmente sem moção)

17, 18, 19 e 22. Organizar os Cidadãos - Mais do que um artigo, trata-se de uma protomoção que acabou por não ser apresentada. Muito duro com o estado do Bloco, é um documento com uma base ideológica forte e cheio de ideias, umas que merecem mais o meu acordo, outras menos. Julgo no entanto que se trata de um documento que deveria ser encarado a sério e bem debatido. Há aqui, parece-me, muito de válido, embora também me pareça haver algum exagero e um punhado de ideias duvidosas e/ou dificilmente exequíveis. Destaco principalmente como boa a proposta da Agenda Para uma Democracia, embora nem todas as suas componentes me pareçam igualmente boas. (primordialmente sem moção)

2 comentários:

  1. Alguns textos não estão afetos a moções, e são resultados de grupos de trabalho que ultrapassam o espaço das proprias moções. O texto Ciência precisa-se não é da U. Não é de nenhuma moção. Não basta olhar aos nomes dos subscritores para marcar o texto como sendo de uma moção. Até porque se assim tivessem tido atenção, teriam reparado que o dito tem pessoas da U, R e B bem como gente sem moção. Pedia para essa correção no texto. O ciência precisa-se sai de um grupo que tem trabalhado sobre ciência no bloco. Irina Castro co-autora do texto e promotora da moção R

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    1. Peço desculpa e já está corrigido. Como compreenderá, quando um texto tem muitos subscritores é algo complicado ir verificar um a um que moção subscreveram. Normalmente verifiquei dois ou três e, se a moção era a mesma, parti do princípio de que o mesmo acontecia com os restantes.

      É possível que haja outros erros do género (aproveito para pedir que mos corrijam se assim for).

      Também fiz uma precisão no texto para deixar claro que o "Moção X" não quer dizer que os textos são afetos à moção X, mas sim que os seus autores a apoiam. Aparentemente, isso também não estava claro à partida.

      Obrigado.

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