Ora bem, vamos lá.
O objetivo inicial era ir lendo os artigos publicados no número dois do Debates sem olhar para os nomes, para avaliar até que ponto concordo ou discordo deles antes ainda de saber a que moção estão ligados. Nem sempre consegui fazê-lo: foram muitos os autores que declararam as suas escolhas nos próprios textos, ao passo que noutros ela é bastante óbvia por aquilo que está escrito (ainda que tenha havido dois ou três casos que me trocaram as voltas). Também houve alguns casos de textos que conhecia previamente por já terem sido publicados em órgãos de comunicação ou divulgados de outras formas. Mas mesmo com estas limitações, a leitura cega predominou.
E, sem surpresa, o meu grau de acordo com as moções está muito próximo do meu grau de acordo com os textos produzidos por pessoas a elas associadas: concordo sobretudo com gente da moção B, seguida de perto por gente da moção R (julgo serem desta os melhores textos, mas também vieram daqui alguns de que discordo bastante), seguida a alguma distância por gente da moção U, e seguida, também a alguma distância, por gente da moção E. A moção A fica fora destas contas por uma questão de escassez de amostragem: não produziram um número suficiente de textos para eu conseguir perceber onde incluí-los no escalonamento.
Também sem surpresa, concordei com textos oriundos de todas as moções e discordei, total ou parcialmente, de textos oriundos de todas as moções.
E saí da leitura ao mesmo tempo bastante satisfeito e um bom bocado triste. Mas vamos por partes.
O melhor
1. A qualidade. Embora haja, naturalmente, uns melhores e outros piores, estamos perante um conjunto de cerca de 85 textos em geral de boa qualidade. Alguns são mesmo excelentes.
2. O debate. Por esta altura, quem andou a dizer que há debates proibidos no Bloco deve estar a morder a língua. Nestes textos debate-se praticamente tudo, e geralmente com um nível político que contrasta fortemente com as inundações de fulanismo e demagogia que estamos habituados a encontrar nos debates internos de outros partidos.
3. A abertura. Debate-se tudo, livremente e de forma aberta: quem for ao site do Bloco lá encontrará todo o debate linkado logo da primeira página, disponível para qualquer pessoa interessada, mostrando um partido que só não está aberto para quem realmente não quer saber.
4. A política. Já o referi, mas quero destacar: aqui debate-se mesmo política. Não exclusivamente, é certo, mas principalmente. E isso é muito bom: mostra um partido com ideias, o primeiro passo indispensável para ser um partido com soluções, e a milhas do vácuo dos debates que temos visto em outras formações. E um partido com ideias e com soluções é um partido com tudo para ter futuro. Assim consiga fazer as escolhas certas.
5. As ideias. Encontram-se nestes textos muito boas ideias.
6. A clareza. Apesar de tudo, estes textos contribuem para clarificar uma série de posturas, atitudes e opções que talvez não ficassem inteiramente claras com a mera leitura das moções.
O pior
1. A roupa suja. Suponho que seria inevitável, mas é desnecessário e desagradável. Os textos de lavagem de roupa suja, de diz-que-disse, de acusação pessoal contrastam com os restantes e ficam muito mal na fotografia. Suponho que também seria inevitável, mas a verdade é que é sobretudo, ainda que não exclusivamente, gente ligada às moções E e U que a eles se entrega. O que está diretamente ligado a...
2. A relativa falta de qualidade das moções à partida maioritárias. Comparando o nível médio dos textos, a quantidade e qualidade médias de ideias que eles contêm, até que ponto são, ou deixam de ser, construtivos, é triste constatar que é em ambas as moções maioritárias que o nível é mais baixo. O facto de haver nelas uma quantidade desproporcional de textos de lavagem de roupa suja explica boa parte desse nível reduzido mas creio que, mesmo pondo esses de lado, os textos da moção U e sobretudo da E são em média um pouco piores que os da B e da R. Isso, no entanto, só será preocupante se não se souber ou quiser integrar quem optou pelas moções minoritárias no trabalho normal do partido a seguir à convenção. O que nos leva diretamente a...
3. A vontade de isolamento. Ficou para mim inteiramente claro que existe uma forte corrente que pretende o isolamento do Bloco relativamente ao exterior e, dentro do Bloco, o isolamento de vozes divergentes. De nada serve afirmar-se desejar a convergência com pessoas ou movimentos imaginários se se mostra sistemática oposição a todas as convergências com pessoas e movimentos reais. As grandes mobilizações populares que alguns proclamam só poderão acontecer com pessoas que se aceita; com aquelas que se rejeita (que, azar dos azares, são as que realmente existem) não acontecerão nunca.
4. A ausência, total ou relativa, de alguns temas que me parecem importantes. Nomeadamente o euro, muito pouco discutido, ou certas transformações sociológicas recentes que não me parecem estar a ser bem compreendidas no partido. Este último tema, aliás, é aquele que eu gostaria de levar à convenção, caso os aderentes do Algarve deem votos suficientes à moção B para eu ser eleito delegado. Se não derem, olha, fica para a próxima.
E pronto, é isto. Quem ainda não leu e quiser ler, aqui estão os links para as cinco partes das minhas notas:
- Primeira parte
- Segunda parte
- Terceira parte
- Quarta parte
- Quinta parte
Obrigado pela atenção.
Muito boa síntese. Verdadeiro serviço público, porque dá vontade de ler. Mais. E mesmo sem isso, põe a pensar, o que em si já não é pouco. Abraço, Jorge
ResponderEliminarObrigado.
EliminarInfelizmente, não tive a oportunidade de acompanhar esta iniciativa desde o início, mas não quero deixar de vos dar os parabéns. Contra a iliteracia, marchar, marchar! :)
ResponderEliminarBoas leituras!