sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Lido: O Senhor das Aranhas

O Senhor das Aranhas (bibliografia) é um pequeno romance de uma ficção científica retro de Michael Moorcock, o segundo (ou o primeiro, dependendo do ponto de vista) da sua série sobre as viagens marcianas do herói Michael Kane. Escrito como óbvia homenagem (ou será pastiche?) ao Barsoom de Burroughs, é tão pulp como o original mas falta-lhe toda a sua frescura (hoje já algo bafienta) e originalidade. Pelo contrário, este Marte de Moorcock tem um forte sabor a requentado.

Tudo neste livro é antiquado. O expediente literário, que coloca a história na condição de relato de segunda mão, feito por alguém a quem o protagonista terá contado as suas aventuras, é algo que nos chega já do século XIX e foi muito comum muito antes de 1965, data de publicação original deste romance. O ambiente e até o próprio herói remontam às aventuras de Edgar Rice Burroughs, que começaram a aparecer em 1912, e têm também ligações com os romances de aventuras pelas paragens exóticas do nosso mundo, entre estranhos povos e animais mais estranhos ainda, muito comuns mais cedo ainda.

O que é mais curioso é isto ter sido escrito por Michael Moorcock, um dos expoentes da New Wave britânica (pode mesmo argumentar-se que foi o principal), um movimento de escritores de ficção científica e fantasia que, descontente com o estado do género nos anos 60, que achavam estagnado e demasiado conservador, o revolucionou e refrescou. Geralmente considera-se que o momento em que esse movimento nasceu foi quando Moorcock se tornou editor da revista New Worlds. Ora isso aconteceu em 1964... e este livro foi publicado no ano seguinte.

É possível que Moorcock tenha achado graça a estar a revolucionar o género ao mesmo tempo que fazia publicar, sob pseudónimo (os livros de Kane surgiram originalmente assinados como Edward P. Bradbury), trabalhos que já então estavam décadas fora de moda. Por outro lado, a tendência para o pastiche de velhos monstros sagrados do pulp é mais ou menos constante na sua obra; a sua série mais bem conhecida, Elric, é uma fantasia de espada e feitiçaria inspirada por Robert E. Howard.

Seja como for, o resultado é muito mauzinho. Tudo é mais ou menos previsível, os bons são bons, os maus maus, as aventuras peripeciosas, o herói desenrascado e bom rapaz e acaba inevitavelmente por trocar umas beijocas com a mocinha (que neste caso é alienígena e bem grande) e a leitura, por conseguinte, bocejante.

Se pulp é em geral mau e formulaico (ou é mau porque formulaico), pulp que se resume à mera aplicação de fórmulas criadas décadas antes é-o dupla ou triplamente. E eu posso ter alguma simpatia por homenagens a velhos heróis literários ou por piscadelas de olho aos conhecedores e graças privadas, mas no fim de contas o que realmente importa é o que disso sai. E o que disso saiu, neste caso, não é nada famoso.

Por outro lado, lá está, há quem goste. Eu não.

Este livro foi comprado.

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