As experiências literárias, como quaisquer experiências, comportam sempre um risco: falhar. Na verdade, a maioria falha mesmo, se não por completo pelo menos em parte ou para parte dos leitores, pois mesmo quando a experiência é compreensível é sempre invulgar (de contrário não seria experiência) e aquilo que é invulgar traz sempre em si uma dificuldade acrescida e muita gente não gosta disso. E por vezes é pouco compreensível.
Vem isto a propósito de A Tentação de Eva, um poema (aqui não há dúvida) de Luiz Bras em que é possível compreender que estamos em territórios bíblicos e paradisíacos e se conta a história da expulsão de Eva do paraíso, mas pouco mais. Trata-se de um exercício de invenção de linguagem, possivelmente ancorado em brasileirismos obscuros mas nem disto tenho certeza. Certeza tenho é de que só citando compreenderão o que quero dizer.
O poema começa assim: Flecheira, a serpeste fliduchou. Estão a ver? Não estão, não, que há pior. Olhem este verso: Vapt-vupt! Eva-nuvem blablaviu e badulatiu. E é tudo assim, do início ao fim, uma impenetrável selva de neologismos cujos significados nem tenho a certeza de que o próprio Luiz Bras conhece, pois por vezes parece-me mais preocupado com a sonoridade da junção de sílabas do que com o significado subjacente.
Enquanto pessoa que já fez coisas destas (ainda que nunca a este extremo), entendo o gozo que dá fazê-las. Mas estar do lado do leitor não dá nem um décimo do prazer, e isso é um problema, a meu ver.
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