Relatório Minoritário (bib.) é, como devem saber, uma noveleta de ficção científica de Philip K. Dick, que deu origem ao filme homónimo de 2002. Como de certeza a maior parte das pessoas viu o filme sem ter lido o conto, começo por dizer que aquele é mais do que uma adaptação deste. Na verdade, aquilo que une história e filme é pouco mais do que a ideia-base, magnífica, diga-se de passagem: num futuro próximo, a descoberta de mutantes precognitivos é aplicada à prevenção do crime, fazendo com que este praticamente desapareça. Mas nenhum sistema é perfeito, e é a imperfeição deste sistema que tanto noveleta como filme exploram, ainda que de duas formas bastante diferentes.
Dick é frequentemente um escritor absolutamente brilhante nas ideias, e foi isso que o guindou à posição invejável que ocupa na ficção científica mundial do século XX. Isso e uma abordagem muito própria, profundamente paranoica, que o ajudou a criar os seus típicos enredos cheios de reviravoltas, em que só raramente, muito raramente, as coisas são o que parecem. Mas também é frequentemente um escritor pobre na execução literária dessas ideias e desses enredos, em especial na sua ficção mais curta. Esta história é disso bom exemplo.
Ao lê-la, não consegui nunca libertar-me da sensação de que faltavam coisas. De que tudo se passava depressa demais. Inverosimilmente depressa demais. De que as personagens nunca chegam a passar de esboços grosseiros, todas elas. De que aquela matéria-prima daria um excelente romance ou no mínimo novela, mas que era demasiado rica para ser comprimida num conto. E eu gosto de contos. Só posso imaginar o que sentirá quem normalmente não é grande apreciador de ficção curta.
Em todo o caso, não deixa de ser um livro com interesse. Sim, porque se trata de um livro. Em vez de aproveitar o ensejo do filme para publicar uma coletânea de contos em que este fosse peça central (e nem teria de inventá-la, visto que há publicadas várias coletâneas intituladas Minority Report, tanto nos EUA como no Reino Unido, e o conto foi também incluído noutros livros do autor), a Presença preferiu arranjar um papel grossíssimo, usar um tipo de letra enorme, e publicar apenas a noveleta. E isso é, de longe, o que esta edição tem de pior.
Chama-se a isto uma oportunidade perdida.
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