sábado, 19 de setembro de 2015

Lido: Aquele Sol Poente

Aquele Sol Poente, de William Faulkner, é um belíssimo conto, que narra a história de Nancy, uma negra no muito racista Sul dos Estados Unidos numa época em que, embora já tivesse deixado para as páginas de história os anos da escravatura, continuava a fazer coincidir negro com miserável e empregado do patrão branco. Isto, de resto, continua a ser verdade hoje em dia, embora não de forma tão absoluta como na época retratada nesta história, o início do século XX.

Nancy é lavadeira de uma família branca numa cidade chamada Jefferson (há várias no Sul dos EUA, mas provavelmente será a da Louisiana, pois é a mais próxima do espaço geográfico em que Faulkner viveu, embora pouco passe de uma vila. Ou então é ficcional), posta a fazer outros serviços porque a cozinheira da família (também negra, claro) adoeceu. Mas Nancy tem uma vida complicada, dificultada ainda mais por um homem que a enlouquece de terror apesar de ter desaparecido. Ou talvez precisamente porque desapareceu, deixando atrás de si ameaças por concretizar.

É esse terror que serve de esteio à história, esse terror e as interações entre ela e a família. O que torna o conto especial é ser contado sob o ponto de vista dos filhos da família branca, que pouco ou nada compreendem do que se está a passar. Vemos tudo distorcido pelos olhos deles, como quem olha o mundo pelo fundo de uma garrafa de inocência, e é só isso que torna suportável a indiferença com que quase toda a gente reage aos terrores da mulher, por muitos vistos como simples "coisas de negros". E também é isso que acentua o terror, através do contraste com as brincadeiras normalmente alegres dos miúdos.

É nestas pequenas-grandes opções que se distinguem os grandes escritores dos que não chegam lá. Faulkner foi um grande escritor; basta este conto para o compreender.

Conto anterior deste livro:

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