Todo o bicho que escreve faz experiências e tenta arranjar formas alternativas de se expressar por intermédio de letras e palavras e sinais de pontuação. Bem... talvez não todo. É possível que os menos criativos nunca cheguem a fazê-lo e se limitem ao ramerrame habitual do já feito anteriormente. Os outros, todos eles, dedicam-se com maior ou menor aplicação e durante uma época mais ou menos extensa, a exercícios de estilo, que têm como características fundamentais a experimentação, obviamente, e também uma probabilidade muito alta de falhar, como qualquer experiência que se preze. Faz parte. É não só natural como é também assim que se aprende.
Ora bem, é precisamente o que acontece a esta história de Carlos Silva. Trata-se de um exercício de estilo em modo de fanfic não assumida do Batman, no qual o autor entrega o texto à (ir)responsabilidade do Joker. E o resultado é uma coisa tresloucada, que recorre profusamente a alterações tipográficas para sublinhar o efeito que se pretende alcançar, entre o doido varrido e o vilão paranoico que envia à polícia (ou, no caso, ao milionário super-herói, ainda que o texto pareça referir-se a discurso direto de viva voz, não a algo de escrito) cartas compostas com letras recortadas em jornais.
OK, o efeito é alcançado, mas a história que lhe subjaz é tão desimportante para o sucesso ou insucesso do exercício de estilo que não passa de um velhíssimo cliché pouco pensado e bastante desinteressante, o que tem como resultado a leitura terminar com um encolher de ombros de "é só isto? Meh." Ou seja: o exercício falha mesmo tendo sido alcançado o efeito pretendido. Dito de outra forma, o conto não é grande coisa enquanto conto, mas o autor terá ficado a saber que se um dia quiser integrar algo do género numa história mais desenvolvida já saberá como. E é também para isso que servem exercícios destes.
(Um parêntesis pessoal: eu, porque sentia dificuldade com os diálogos, fiz vários contos compostos exclusivamente por diálogos e por outras formas de discurso direto. Nenhum deles é grande coisa, mas ensinaram-me bastante.)
Não deixa por isso de ser deliciosamente irónico que na capa com que o ebook foi publicado tenha ficado esquecido o S do título de É Só uma Piada. A imperfeição da embalagem cai como uma luva à imperfeição do embalado.
Este livro, como todos os publicados pela Fantasy & Co., pode ser descarregado a partir daqui.
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