sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

Romeu Martins: Amazônia Underground

Há um problema recorrente nas histórias integradas em universos ficcionais previamente estabelecidos, sobretudo quando se tratam de universos criados por um autor X, para o qual outros escritores escrevem: os autores gostam de as fazer pelos mesmos motivos por que tanta gente escreve fan fictions (e no fundo é precisamente isso o que são, ainda que sejam bastante menos menosprezadas pela opinião crítica do que a fanfic tradicional), os leitores já familiarizados com o universo tendem a gostar de as ler porque tendem a gostar do jogo de referências e daquele delicado equilíbrio que muitos dos escritores que se dedicam a essa forma de criação tentam manter entre o respeito pelo material de base e a inovação, mas para leitores não familiarizados todas as referências passam ao lado, são-lhes indiferentes, e eles avaliam as histórias apenas pelas suas características enquanto histórias isoladas. Ora, muitas destas histórias, especialmente as mais curtas, têm dificuldade em sustentar-se enquanto histórias isoladas. Porquê?

Porque não é nada fácil integrar uma história num universo ficcional de forma a fornecer toda a informação básica necessária para isso ao mesmo tempo que se tenta mantê-la interessante para todos os tipos de leitores. A informação necessária para um leitor familiarizado com o universo é x, a necessária para outro que não o está já será x+y. E o autor vê-se confrontado com um dilema: apontar para x ou para x+y? Seja qual for a escolha, o risco de alienar parte dos leitores existe. E apontar para algures no meio é ainda mais arriscado porque pode tornar a história chata para os leitores familiarizados e ainda incompreensível para os que não o estão.

Ora eu, no que toca ao Wold Newton Universe, pertenço mais aos leitores que não o estão do que aos que estão. Sei o que é — um universo ficcional criado por Philip José Farmer e desenvolvido por outros autores desde então, no qual convivem livremente, num crossover permanente, personagens criadas por outros autores... semelhante à Liga dos Cavalheiros Extraordinários de Alan Moore ou ao que o João Barreiros fez na Verdadeira Invasão dos Marcianos — mas li muito pouco material pertencente à série e, do que li, não gostei particularmente.

Não será por isso de estranhar que também não tenha gostado particularmente deste Amazônia Underground, um conto muito curto (uma vinheta, na verdade) em que Romeu Martins gasta muito mais latim com informação de contexto, a relacionar a sua história com as outras do Wold Newton, do que a escrever realmente uma história. É quase exclusivamente infodump de referências que, na maioria, me passaram ao lado. Imagino que alguém que conheça bem o universo e goste da caça às referências possa apreciar bastante este conto, mas decididamente não é o meu caso.

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