Antologia de Contos Temáticos (bib.), organizada por Henry Alfred Bugalho, é precisamente aquilo que o nome indica: uma antologia que reúne contos elaborados por participantes de uma oficina de escrita criativa, sujeitos a tema. Os temas são sete, ou oito, se se incluir também o tema livre. Os autores são o organizador e mais oito, incluindo um português, embora nem todos tenham igual participação no livro: se por um lado Bugalho e Denis Clebson da Cruz têm um conto por tema, por outro três dos autores estão presentes com apenas uma história. Ao todo, os contos são 32, quase todos contos curtos ou vinhetas. As abordagens são variadas, os géneros também, ainda que precisamente metade dos contos se integrem nalgum dos géneros fantásticos, do maravilhoso à ficção científica.
O resultado geral é bastante fraco. Apesar de haver alguns contos com interesse, nenhum deles é realmente bom, e mesmo se o fossem diluir-se-iam na mediocridade geral e seriam anulados por outros tantos francamente maus. E isso, na verdade, era de se esperar.
A questão é que oficinas de escrita são locais de experimentação, geralmente povoadas por escritores inexperientes que ainda estão à procura de tudo, desde os temas que lhes dizem alguma coisa, ao seu próprio estilo. Também costuma haver alguns totalmente despidos de talento e com um domínio da língua portuguesa no mínimo frágil. Para além disso, se por um lado a existência de temas pode ser inspiradora, por outro leva os autores a uma atitude de simples resposta ao estímulo externo e não à busca interior do que realmente os afeta, daquilo que realmente mexe com eles, que é o principal motor da escrita de qualidade. E embora haja casos em que uma e outra coisa se cruzam, o mais frequente é que o resultado deste tipo de exercício seja no máximo competente. E tudo o que não passa de competente torna-se esquecível.
(Esta crítica, diga-se em jeito de parêntesis, também pode ser feita à atual moda das antologias temáticas, em especial no Brasil. É ótimo que existam, é ótimo que forneçam essa oportunidade de publicação, mas podem ter como efeito pernicioso afastar os autores dos seus próprios temas e inquietações, da busca interior que é necessária para criar obras de maior qualidade)
Não sei até que ponto esta oficina foi restritiva nas dimensões dos exercícios que propunha aos membros, nem sei quanto tempo lhes era dado para escreverem as suas histórias, mas pela amostra ficou-me a ideia de que era razoavelmente restritiva e/ou de que eles dispunham de pouco tempo. Isso tem outra consequência nefasta: reduz o espaço para elaboração de complexidade e solidez em enredos, cenários, personagens, etc. E promove o cliché como forma de escape rápido e fácil aos constrangimentos. Tudo elementos que se encontram com grande frequência nestas histórias.
Tenho poucas dúvidas de que esta oficina em concreto foi útil para os autores nela envolvidos. Mas também tenho poucas dúvidas de que o que nela produziram está muito longe do que pelo menos alguns deles terão potencial para produzir um dia. Não sei bem, portanto, se a publicação deste livro não lhes terá sido mais prejudicial que benéfica. Talvez fosse benéfica se lhes tivesse sido dada a oportunidade de fazerem uma revisão profunda das suas histórias depois de as deixarem a repousar durante algum tempo na gaveta, por forma a elaborarem melhor a linguagem, a taparem buracos de enredo, a se livrarem de alguns clichés ou pelo menos a dar-lhes outras roupagens e reduzir-lhes a importância. Mas não me parece que isso tenha sido feito. A ideia que ficou foi que as histórias foram postas no livro tal e qual como foram enviadas para a oficina.
No fundo, a ideia que ficou foi que falta aqui bastante trabalho. É pena.
Este livro foi obtido sob a forma de ebook gratuito, aqui.
Interessante a sua análise desta antologia, Jorge, principalmente porque é muito pertinente em vários aspectos.
ResponderEliminarÉ difícil julgar a "utilidade" desta Oficina, que funcionou por quase 2 anos e por onde passaram talvez uma centena de autores, pois isto é muito particular.
Por exemplo, O Denis da Cruz, um dos autores mencionados, foi o primeiro a emplacar uma publicação comercial dentre os oficineiros e hoje tem alguns best-sellers dentro da linha dele de infanto-juvenis religiosos. Certamente, para ele, teve alguma serventia, como ele algumas vezes já mencionou comigo.
Já para outros, poder ter tido pouca ou nenhuma... Como mensurar?
De qualquer maneira, tenho certeza que todos estes autores, estejam hoje ainda escrevendo ou não, se sentiriam lisonjeados por saber que seus contos, escritos em pouquíssimos dias, foram lidos. Pois, como sempre digo, pior do que a crítica é a indiferença.
Inclusive, se você tiver tempo (e disposição, é claro), adoraria saber sua opinião sobre a minha novela "O Homem Pós-Histórico", apesar de já antever um pouco o que viria por aí.
http://www.oficinaeditora.com/2009/07/o-homem-pos-historico.html
Abraços e sucesso.