Também difícil é determinar se se trata de ficção ou relatos de acontecimentos reais, ainda que trabalhados literariamente. Parece também aqui ser um livro híbrido, entre a memória e a invenção, mas talvez com mais daquela do que desta. Memórias de infância e juventude de um tal Ndalu, burguês luandense nascido já após a independência de Angola, que cresceu durante os anos em que o seu país estava politicamente alinhado com a esfera socialista, durante uma guerra civil que o protagonista desta(s) história(s) aparentemente não chega a sentir, e quem não saiba que Ondjaki é pseudónimo de um homem chamado Ndalu de Almeida talvez se sinta tentado a atribuir tudo à ficção; afinal, por mais que a pessoa usada seja a primeira, há aqui construção de personagem, não é verdade?
Não é verdade?
Não sei, a verdade é essa. Não sei quanto disto é verdadeiro e quanto é ficcionado. Não o sabia ao iniciar a leitura e após terminá-la continuei a não saber.
O que sei é que estas histórias me desapontaram. Depois de ter lido há uns aninhos Quantas Madrugadas Tem a Noite, e ficado muitíssimo bem impressionado com o humor, a escrita, a mistura de realismo e fantasia que o romance tem, esperava encontrar aqui algo nos mesmos moldes e não foi isso que encontrei. O português em Os da Minha Rua, sendo embora de qualidade, não tem o mesmo rasgo que se encontra no outro livro; humor está presente em quantidades bem mais discretas na maioria dos contos (há algumas exceções); fantasia não existe. O que aqui se encontra é um retrato da infância, que é em parte universal, porque miúdos são miúdos, e em parte muito característica de um tempo e lugar, a Luanda dos anos 80, estendendo-se um pouco pelos 90. Um retrato bem feito? Sim, provavelmente. Mas falta-lhe qualquer coisa. Ou então sou eu que não reajo bem à escrita umbiguista. Se calhar é isso.
E como também se podem encarar estas histórias como contos independentes, aqui fica o que achei de cada uma:
- O Voo do Jika
- A Televisão Mais Bonita do Mundo
- O Kazukuta
- Jerri Quan e os Beijinhos na Boca
- Os Óculos da Charlita
- A Professora Genoveva Esteve Cá
- A Ida ao Namibe
- O Homem mais Magro de Luanda
- O Último Carnaval da Vitória
- A Piscina do Tio Victor
- Os Quedes Vermelhos da Tchi
- Manga Verde e o Sal Também
- Bilhete com Foguetão
- As Primas do Bruno Viola
- O Portão da Casa da Tia Rosa
- Os Calções Verdes do Bruno
- O Bigode do Professor de Geografia
- No Galinheiro, no Devagar do Tempo
- O Nitó que Também Era Sankarah
- Um Pingo de Chuva
- Nós Chorámos Pelo Cão Tinhoso
- Palavras Para o Velho Abacateiro
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