De longe vem a tentação que assalta muitos escritores para escolherem falar de animais quando na realidade estão a falar de homens. É o que faz Mário Braga neste breve conto, apesar de não seguir pelo caminho mais comum da fábula mas pelo (neo?)realismo de um conto rural cujo protagonista é um pastor pobre. Ambientado na Serra de Queiró, agreste terra ficcional que lembra a terra fria trasmontana ou talvez as alturas da Estrela, Balada passa-se num inverno intenso, sem pasto, que faz as ovelhas do pastor definharem de fome. O contraste é feito com um rico local, cujo gado não passa necessidades independentemente das intempéries. Contraste de injustiça, naturalmente; que mal fizeram as ovelhas do protagonista para morrerem de fome quando as outras vivem sãs e anafadas? Não serão no fundo todas iguais? São estas as ideias que germinam na cabeça do pastor e o levam a tomar uma atitude. Da fome das ovelhas se fala falando da fome dos homens, e da forma como o que se faz para minorar essa fome corre sempre o risco de acabar traído, não pelos donos do poder, mas por outros homens igualmente miseráveis que, em vez de se unirem para acabar com as desigualdades, são lestos em apontar o dedo aos que violam as normas.
É um conto profundamente político, este, mesmo falando-se apenas de gado. Essa obliquidade era talvez uma necessidade no Portugal de 1948. Mas a verdade é que isso melhora a obra. O óbvio raramente é bom.
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