domingo, 23 de abril de 2017

Lido: O Saque da Lampedusa

Encerra-se este livrinho com O Saque da Lampedusa, de José de Barros, já conhecido alter ego de João Barreiros. Trata-se de um conto integrado no universo ficcional electropunk que serviu de esteio à antologia Lisboa no Ano 2000, de que já falei aqui na Lâmpada há coisa de um ano. E é um típico conto de Barreiros, bastante bem escrito, irónico, cínico, carregado de hiperviolência. Trata-se de um depoimento, de uma ruminação desencantada da consciência de um soldado da Grosse Germânia após ter sido transferida para um tanque de assalto robótico cuja missão é combater fábricas automáticas que se tentam instalar e se combatem umas às outras na ilha de Lampedusa (não deveria o título ser "O Saque de Lampedusa"? "A" Lampedusa sugere uma nave ou coisa que o valha), no meio do Mediterrâneo, depois de terem dominado todo o Norte de África. A coisa é complicada pela parte do saque, pois as potências europeias (e não só), ao mesmo tempo que procuram refrear a expansão destrutiva das autofábricas, desejam o que elas produzem, e por isso combatem-se umas às outras pela posse dos despojos, numa situação de todos contra todos absolutamente caótica.

Barreiros faz muito bem este tipo de conto caótico, sabe transmitir de forma extremamente palpável a sensação de confusão e sobrecarga sensorial e emocional inerente a situações em que tudo acontece ao mesmo tempo e nunca existe uma saída óbvia. Por isso, e mesmo havendo neste conto umas certas quebras de ritmo provocadas pela necessidade de informar o leitor o mais depressa e completamente possível do que se está a passar, esta é, claramente, a melhor história de todo o livro.

Textos anteriores deste livro:

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