Pelo primeiro parágrafo que Mia Couto escolheu para prefaciar esta historinha, no qual nega perentóriamente, àquele jeito muito seu, que a história seja mais que ficção da mais pura, eu deduzo, paradoxalogicamente, que esta foi história realmente acontecida e este conto-crónica acaba por ser mais crónica que conto. E para se compreender melhor porquê, descreva-se a história. Obscurecidamente, não vá alguém irritar-se com demasiadas desvelações.
O Cabrito que Venceu o Boeing é, curiosamente, sobre um cabrito que venceu um Boeing. Não sozinho, entenda-se. Contou para isso com a prestimosa ajuda do responsável, cuja função no Boeing era acompanhar à província a delegação estrangeira, gente investimenteira. E com uma dose avultada de azar, pois só por azar acabou como acabou. A coisa é insólita: ao embarcar no avião, depois de muito bichanar do responsável, a delegação estrangeira surpreende-se por ver que um rebanho inteiro de cabritos irá voar com ela, e depois surpreende-se mais ainda com uma imprevista demora na descolagem. Um dos cabritos fez o que não devia, e antes dele o próprio responsável também já tinha feito o que não devia, com consequências várias.
Mais uma historinha ironicamente corrosiva, a atacar a pequena e, por extensão, também a grande corrupção dos responsáveis políticos, dos que se servem dos cargos para proveito próprio, com efeitos fáceis de adivinhar sobre o desenvolvimento de um país, que neste caso é Moçambique mas podia ser qualquer um, e a imagem desse país no exterior. Aconteceu mesmo? Se calhar, se calhar...
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