Uma olhadela ao boneco que aqui está ao lado e o grupinho que está aí e vai acompanhando o que vai sendo publicado neste blogue já sabe duas coisas: que vamos a mais um conto da Alexandra Pereira e que ele vem antecedido de mais uma dedicatória. Desta vez o contemplado chama-se João Botelho, que a malta conhece do cinema e até pode eventualmente ter lido o continho a ele dedicado, e este, o conto, é fantástico.
Ana, assim se intitula ele, com três letrinhas apenas, é um conto sobre um rapaz ou jovem que chega a casa de uma mulher, descrita longa e poeticamente, em busca de uma outra pessoa com a qual teria trocado correspondência durante algum tempo. Segue-se um diálogo repleto de frases arroubadas, discursivas e, francamente, ridículas como "Desta sorte lhe peço que guarde essa carta com desvelo e não a dê a ninguém, nem mesmo a mim que a escrevi, pois é da Ana e uma afeição recíproca pode ela manter pelos meus escritos, a qual a senhora desconheça" durante o qual vimos a descobrir que a tal Ana que o rapaz diz que ama é filha da mulher com quem dialoga e desapareceu enquanto criatura humana, metamorfoseando-se noutra coisa, o que é, se excetuarmos alguns sinais discretos e ambíguos logo no início do conto, aquilo que o afasta da literatura realista.
Não é conto que faça grande sentido, é um conto com alguns erros que uma revisão eficaz devia ter apanhado (as velas não se "enfonam"; enfunam-se) mas o pior, o que realmente o estraga, são mesmo os diálogos. Depois deste conto e de um par de outros que ficaram para trás, solidificou-se em mim uma certeza: Alexandra Pereira devia ser proibida de escrever diálogos porque quando os escreve a qualidade dos seus contos despenca. Há uma linha fina entre a prosa poética e a prosa ridiculamente empolada (os ingleses chamam-lhe "purple prose"), que os bons escritores não ultrapassam e os maus sim. Alexandra Pereira não costuma ultrapassá-la... mas quando se põe a escrever diálogos ultrapassa-a sempre, porque aparentemente não sabe (ou não quer saber, o que talvez seja pior) que em diálogo escrito em discurso direto essa linha é bastante mais recuada do que no texto descritivo, narrativo ou até em diálogos expressos em discurso indireto.
Consequência: este conto é mau.
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