Lokis (bibliografia) é uma longa noveleta de Prosper Mérimée que não me parece inteiramente bem enquadrada num livro que pretende apresentar histórias de vampiros. É, contudo, uma história bastante boa. Narrada na primeira pessoa pelo protagonista, sacerdote e linguista, relata a sua viagem pela Lituânia a fim de recolher dados sobre o "jmude", dialeto lituano que, segundo a história, seria falado pelo povo da Samogícia, região que ocupa o noroeste da Lituânia. Aí, o protagonista hospeda-se na propriedade de um estranho nobre local e a história segue por aí fora, em situações razoavelmente comuns na ficção oitocentista. Mas sempre com toques agoirentos que pressagiam a existência naquele local de algo de sobrenatural. Uma condessa louca que trata o anfitrião por "urso", estranhos recolhimentos e ruídos noturnos, conversas que são levadas por caminhos desconfortáveis cheios de alusões mais ou menos claras a canibalismo, animais com comportamentos bizarros, enfim, uma longa série de indícios a levarem o leitor a pensar (apesar da fleuma do protagonista, que de nada aparenta dar-se conta) que alguém naquela casa não é bem o que parece.
O desfecho, no entanto, parece ser mais característico de uma história de licantropos do que propriamente de vampiros. E não é a primeira vez que isso acontece neste livro. Pelo que tenho lido, há uma certa sobreposição dos dois conceitos no folclore do Leste europeu (e ambas as histórias em que isso acontece passam-se, total ou parcialmente, no leste da Europa), e essa sobreposição extravasou para a literatura publicada antes de Stoker cristalizar na literatura de horror um determinado conceito de vampiro e as duas criaturas se separarem (em definitivo?) na ficção ao longo do século XX.
Seja como for, é um conto bastante bom, de um ótimo escritor francês no pleno das suas capacidades, apesar de ter já mais de 60 anos quando o escreveu; Lokis foi publicado apenas um ano antes da morte de Mérimée.
Contos anteriores deste livro:
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