Tudo me leva a crer que o ponto de partida para este livro (pois é de um livro que se trata; neste caso um livro dentro do livro) foram as fotografias de João Freire. O tema, como o título de Lisboa ao Voo do Pássaro indica com toda a clareza, é a cidade de Lisboa, embora quem conheça algo da obra de Mário-Henrique Leiria não se surpreenda em nada se eu lhe disser que não é só a cidade de Lisboa. E o tempo, que também é aqui de toda a relevância sendo Leiria quem é, é aquele período pós-revolucionário em que o PREC já ficou para trás e a democracia formal já se vai consolidando.
Razoavelmente longo, o livro vai sendo construído de uma forma bastante semelhante à do Conto do Natal para Crianças: cada fotografia de Freire é como que comentada ou complementada por uns quantos versos de Leiria. Não poemas independentes, mas um poema só, apesar de alguns apartes parecerem ser um pouco alheios à história geral. Esta não será propriamente uma história mas vendo bem não deixa de o ser. É sobretudo um comentário, irónico e corrosivo como seria inevitável em Leiria, mas também algo desencantado, agora que o fascismo já ficou para trás mas pouco do sonho que a revolução trouxe se cumpriu, sobre a cidade de Lisboa que Mário-Henrique Leiria parece achar demasiado igual a si própria, demasiado semelhante à de antigamente.
Acutilante e, a espaços, bastante divertido, este texto é claramente Leiria, mas aquele Leiria de que eu tendo a gostar menos. Já o disse várias vezes e continua a ser verdade: prefiro de longe as suas prosas aos seus versos. No entanto, este é dos tais autores de que gosto tanto quando gosto mais que não é por gostar menos que deixo de gostar. Portanto sim, prefiro outras coisas dele a esta, mas não deixei de desfrutar desta leitura.
Textos anteriores deste livro:
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