É pena que em Portugal se leia tão pouca ficção científica brasileira, tal como pena é que no Brasil haja tanta gente que teima em ignorar a portuguesa. Sim, é verdade que de um lado e do outro do Atlântico há que desbastar bastante palha para chegar às pepitas, mas que nem se leiam as pepitas, por puro preconceito (por vezes, reconheça-se, temperado a xenofobia), é uma tolice gigantesca.
E querem saber? Este conto de Luiz Bras é uma pepita.
Não se limita a estar muito bem escrito, o que não surpreende conhecendo Bras e sabendo que entre os escritores brasileiros que se dedicam à FC ele pertence ao grupo dos que melhor usam a língua portuguesa. Está também muito bem concebido, podendo ser usado como lição de como ir entregando ao leitor a informação necessária a pouco e pouco, de forma natural e sem necessidade de infodumps. Mais: de como usar essa entrega gradual como motor da narrativa, sustentando-a em boa parte com a curiosidade sobre o que ao certo estará a passar-se ali, e usando-a para criar surpresas e reviravoltas. É o que a pessoa que protagoniza o conto não sabe, e portanto o leitor também não, que mantém boa parte da leitura em andamento, e é aquilo que ambos vão descobrindo que vai fornecendo as pistas para o bocado de informação seguinte.
O conto começa no vazio. Alguém desperta em amnésia total, sem saber quem é, onde está ou sequer o que é. Vai analisando as cercanias, as pessoas que se aproximam e afastam, e tirando conclusões, nem sempre inteiramente corretas. E no fim, quando o conto termina, o leitor apercebe-se de que acabou de ler uma história de muito boa ficção científica, sobre identidade, sobre desigualdade e sobre futuros possíveis.
Não sei bem é qual a origem do título. O Índio no Abismo Sou Eu é daqueles títulos crípticos que geram a suspeita de uma relação qualquer com outras obras literárias. Haverá algures na literatura brasileira um índio no abismo a que Bras decidiu fazer referência ou prestar homenagem? Não sei; não conheço. Mas lendo o conto o título até se torna adequado.
Este conto é ótimo.
Olá Jorge. O conto está disponível online?
ResponderEliminarOi.
EliminarTodo o livro está, no site dos Livros Fantasma, em http://livros-fantasma.com/catalogo/