Os contos estão em geral bem escritos, ainda que a autora tenha um problema demasiado comum nos escritores portugueses quando chega a hora de escrever diálogos: só muito raramente estes conseguem transmitir a voz própria das personagens, ficando-se quase sempre por trechos rebuscados que em nada se distinguem da parte descritiva das histórias. Por vezes, isto é tão intenso que consegue estragar os contos respetivos, mas quando Alexandra Pereira consegue evitar cair nessa armadilha é capaz de escrever textos de leitura bastante agradável. Ela não tem uma prosa perfeita, há algumas falhas aqui e ali, mas escreve bem. E feitas as contas são mais os bons contos que aqui apresenta do que os maus, mesmo que alguns dos primeiros não correspondam propriamente às minhas preferências literárias e outros me pareçam um bom bocado inconsequentes. Ora, como eu repito com frequência, basta uma compilação de histórias conter várias boas ou nem que seja uma muito boa para valer a pena a publicação e a leitura, e é claramente o caso desta.
Em suma: não se tratando de nenhuma obra-prima, este é um livro que quem gosta de contos deverá achar interessante, e quem gosta de conhecer a literatura fantástica portuguesa, especialmente aquela que se situa na vertente mais mainstream do espectro, tem aqui algumas obras que merecem claramente leitura.
Eis o que achei de cada um dos contos e artigos:
- Alfarrobeiras em Flor
- Feitiço de Dona Divina
- O Músico Naufragado
- O Índio de Vilacamba
- O Maior Espectáculo do Mundo
- Yakutuba
- A Groselha que Pariu um Rato Ou O Violãotista Mimado
- A Respiração
- Ana
- Cristais Como Nós
- Boca da Trompete
- O Buda de Lisboa
- A Décima-Terceira História
- Ibêje-Ìbeji
- A Maldição de Hemingway
- Linguagem Óptica
- A Hora do Lagarto
- A Alegoria da Gaiola
- Na Metade do Meio
- Naturalmente Feliz
- Posição Yoguística
- O Espelho Antropomórfico
- O Passarão Invisível
- Um Tuaregue e Dois Cavalos
Caro Jorge, Muito obrigada pela leitura, resenha e crítica, seja positiva ou não. Fico muito feliz que tenha gostado de, pelo menos, alguns continhos. E pelo facto de me situar na literatura fantástica também - acho um género difícil (como a forma do conto curto) e não muito comum em Portugal. O Cristais Como Nós ganhou um prémio em São Paulo na altura. Mas atenção que estes Continhos foram escritos nos inícios dos anos 2000 e publicados há mais de dez anos online pela Sinapses, um projecto duns amigos de Coimbra e dos Jovens Criadores. Abraço.
ResponderEliminarDe nada.
EliminarQuanto a o fantástico ser ou não incomum em Portugal, quando eu comecei a primeira versão do que viria a ser o Bibliowiki também achava que era escasso. Hoje, o raio do site é um monstro com mais de 39 mil páginas e ainda falta incluir montes de material. É menos incomum do que se pensa, apesar de ser muitas vezes posto de parte como género "menor".
Quanto ao atraso na leitura, eu sei, eu sei. Passei muitos anos só a gravar coisas publicadas online, sem as ler. Só comecei a lê-las quando começaram a aparecer tablets a preço razoável, e tenho aqui larguíssimas dezenas de publicações das mais variadas à espera de atenção. Um dia...
Por fim, parabéns pelo prémio. Esse, realmente, foi dos contos que mais me agradaram.
Eu falava de literatura fantástica publicada e escrita POR PORTUGUESES... Sei que, no mundo, ela é comum! :) Tenho o Expresso Latino que é de 2006, uma espécie de tentativa de romance... foi aí que percebi que o Conto talvez fosse melhor para mim ahah Esse também ganhou um prémio de ficção narrativa, mas vale o que vale. Abraço e continue as leituras!
ResponderEliminarSim, também eu. É verdade que o Bibliowiki tem muito material estrangeiro, mas tem mais de 1200 autores portugueses; é a nacionalidade mais numerosa (quase a ser ultrapassada pela brasileira) com quase 400 nomes a mais que os estado-unidenses.
EliminarApesar das resistências à publicação, os portugueses escrevem muito mais fantástico do que eu pensava quando comecei a fazer isto.