Christopher Reynaga está presente nesta antologia com duas noveletas.
The Grande Complication é uma deliciosa história de uma fantasia francamente surreal, temperada com umas pitadas que remetem ao steampunk, sobre um rapaz de nove anos que, no momento em que o mundo para, permanece ativo e se vai de seguida ver cooptado por um velho relojoeiro que tenta afanosa mas infrutiferamente manter a funcionar o Relógio do Mundo. O relógio de quê, perguntam? Do mundo. Pois consta nesta história que existe, em algum lugar escondido da realidade mundana, um mecanismo de relojoaria que mantém o tempo, e portanto o mundo, a funcionar. Mas esse mecanismo está gasto, aqui e ali há coisas que se partem ou emperram, e a função do relojoeiro é manter tudo funcional. Contudo, vai perdendo a batalha de uma forma que aparentemente é tão inexorável como a entropia. É aqui que entra o rapaz, sem que nenhum dos dois saiba bem como nem porquê. A história está muito bem construída e igualmente bem executada, mas o que realmente leva a palma é o mundo que Reynaga aqui constrói, surreal, muito imaginativo, mas estranhamente palpável, para o que contribui o facto de possuir a sua própria fauna e flora. Este é daqueles contos que não se esquecem facilmente.
Say Goodbye to the Little Girl Tree é outro conto de fantasia, este misturado com horror e até com leves traços de uma certa forma de ficção científica pós-apocalíptica, pois descreve um mundo invadido por uma floresta alterada, transformada em algo violento o suficiente para ter destruído as cidades e a civilização que as alimentava, expulsando os poucos sobreviventes para aldeias esparsas. Ao começar o conto não se sabe porquê; sabe-se apenas que as mulheres encerram em si um perigo mortal qualquer e por isso têm de ser cozidas ao chegar à puberdade. Cozidas intimamente, se percebem onde quero chegar. A história acompanha as deambulações de um pai, que se dedica precisamente a esse ofício, acompanhado pela filha, que quer ser sua aprendiza, ao mesmo tempo que nos vai informando aos poucos sobre os antecedentes, o mundo, o que a rapariga tem de invulgar, o que aconteceu com a mãe, etc. Embora a julgue um pouco pior que a primeira, esta também é uma noveleta francamente boa. Christopher Reynaga é decididamente um bom escritor.
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