quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Lido: Memória Para um Império Futuro

Memória Para um Império Futuro (bibliografia) é um romance de Isaac Asimov, integrado na sua longa série da Fundação (e na dos robôs, também), que conta a forma como Hari Seldon desenvolve a psico-história, e os desafios que enfrenta não só no desenvolvimento da sua disciplina, mas também no estabelecimento das Fundações que tão fundamentais vão ser mais tarde. Tudo isto enquanto o Império Galáctico entra em decadência acelerada e, segundo as equações de Seldon, inevitável, separando-se nas suas partes constituintes e perdendo até a capacidade de manter o nível de organização, controlo e eficiência no próprio planeta capital, Trantor.

E é um romance que chega a ser comovente. Menos por si mesmo, talvez, do que pela sua circunstância, e pelo que de humano o rodeia. Porque este é um livro sobre a decadência escrito por um homem em plena decadência. Seldon é quase um alter-ego do próprio Asimov: um homem com uma carreira longa e nem sempre bem compreendida, determinado em concluir a sua obra antes de ser como que atropelado pelas circunstâncias e pela própria morte, enquanto à sua volta tudo se deteriora e todas as pessoas que ama, todos os amigos, vão morrendo ou desaparecendo um após outro, até lhe restar apenas uma neta. Uma neta muito especial, sim, mas apenas uma pessoa das muitas que a vida lhe dera. E depois, mesmo esta chega ao fim.

E o fim da vida de Seldon é o fim da vida de Asimov. O autor morre em 1992, deixando este romance por publicar (o que só aconteceria no ano seguinte) e, talvez, por ser trabalhado até ao fim. É sensível uma diferença bastante grande entre o ritmo narrativo e o controlo que o autor tem sobre a obra no início e no fim desta. No início, o romance é bastante interessante por si mesmo, mostrando um escritor que podia já ser de idade avançada mas ainda estava na plena posse das suas capacidades (por mais duvidosa que seja a ideia de fundir todas as suas séries principais num único universo ficcional, mas isso é outra conversa); no fim, no entanto, o autor rigoroso vai-se esbatendo e vai surgindo o homem, as suas dúvidas, os seus receios.

Como resultado, e talvez paradoxalmente, o romance vai piorando na exata medida em que se vai tornando mais pessoal. E também na exata medida em que vai sensibilizando o leitor consciente das circunstâncias de vida do seu autor. Quem não o esteja, muito provavelmente, irá juntar este livro aos piores de Asimov. Talvez muitos que o estiverem também o façam, porque o romance, objetivamente falando, não é bom. Sim, tem trechos com interesse, sim, relata uma fase muito importante no desenvolvimento da psico-história que está no fulcro de todo o universo da Fundação, mas é um romance desequilibrado, é um romance no qual o característico rigor asimoviano fraqueja, o que é especialmente problemático num escritor que nunca foi grande cultor da palavra e sempre teve no rigor lógico com que construía as suas histórias a sua principal força, e é um romance que deixa pontas soltas. É possível que Asimov tivesse planeado atar estas pontas em histórias que não teve tempo para escrever, mas a verdade objetiva é que nunca o fez.

Portanto compreendo plenamente quem não goste deste livro. Mas eu não consegui não gostar. Deixei-me sensibilizar pelo homem que escrevia a última história da sua vida, pondo naquela a decadência desta. Acompanhei a morte de Asimov na de Seldon. E isso, para mim, valeu o livro.

Este livro foi comprado.

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