domingo, 27 de novembro de 2022

Tex Taylor: As Montanhas Negras

O meu pai lia muito. A minha mãe também lia muito, de resto, até ficar com grandes problemas de visão, mas aqui falo só do meu pai por um motivo. Ele lia muito e sempre leu muito, desde miúdo. Tinha os seus gostos, as suas preferências, mas sempre foi um leitor eclético, tão capaz de mergulhar em Proust como de devorar livrinhos de bolso policiais, tão capaz de ler a poesia mais erudita como de se deliciar com ficção científica (tentou, de resto, convencer muitos dos intelectuais com que se dava de que Ray Bradbury era dos melhores escritores americanos vivos... sem grande sucesso, ao que me consta), tão capaz de gastar dinheiro numa edição em capa dura do Quixote como nos muito baratos livrinhos de bolso espanhóis. Livrinhos como este As Montanhas Negras.

Sim, não deixem que o nome de Tex Taylor vos engane. O autor é espanhol, o nome é pseudónimo e o livro pertence a um conjunto razoavelmente abundante de livrinhos de vários géneros, que foram editados durante anos e vendidos (exclusivamente?) em quiosques, todos eles com origem em Espanha, onde recebem o nome de "novelas de a duro". Aqui há tempos fui descobrir três ou quatro na biblioteca do meu pai e, porque sei que parte desses livros espanhóis são de géneros relevantes para o Bibliowiki, decidi a páginas tantas ler um para ver ao certo como são. Que tipo de escrita, que tamanho têm, essas coisas. O escolhido, sem grande escolha pois foi simplesmente o primeiro em que agarrei, foi este.

Não esperava nada de especial e não foi nada de especial o que li. A prosa é tão básica e o enredo é tão formulaico como eu já esperava. Surpresa, e apenas relativa, foi a exiguidade da obra. No bibliowiki, estes livros estão rotulados como romances, mas esse rótulo está errado. Apesar de ultrapassarem as 100 páginas, o formato do livro é tão pequeno e o tipo de letra tão grande que o texto pouco ultrapassa o tamanho de noveleta. E também surpresa, de novo relativa, foi a fraca qualidade da tradução, carregada de castelhanismos um tanto ou quanto estapafúrdios.

De resto, como a capa revela sem deixar margem para dúvidas, esta é uma história de faroeste protagonizada por uma mulher jovem que chega à fronteira acompanhada por uma tia, vinda de Nova Iorque, em busca do noivo que partira em busca de fortuna e deixara de dar notícias. Mas o que encontra nos territórios que formalmente pertenciam a índios mas estavam a ser invadidos pelo homem branco é muito perigo, canalhas decididos a violá-la e um galante galã (pleonasmo? acham?) que a protege. Claro que há perseguições, sopapos, índios que atacam e são mortos às dezenas, enfim, todos os clichés de uma história do faroeste. E amor instantâneo, obviamente. O galã fica sempre com a rapariga.

É tudo muito mauzinho, em vários detalhes é altamente duvidoso, quem goste de ser surpreendido com o que lê deverá ficar bem longe deste livro. Mas por outro lado, ele tem a qualidade principal do pulp: distrai. Sim, que pulp é isto. Pulp puro. É daquelas leituras feitas de propósito para desligar o cérebro, tirá-lo da cabeça e enfiá-lo no jarro de formol sobre a mesa de cabeceira. Não gosto, nunca gostei, nunca gostarei, mas há quem goste.

O meu pai? Não sei. A escassa quantidade destes livros cá em casa leva-me a crer que também não gostava, mas arranjava um ou outro de vez em quando, talvez quando andasse mais apertado de finanças e não pudesse comprar coisas mais interessantes e mais caras. E ao contrário dos livros de FC, que me aconselhou a ler quando cheguei à adolescência, não me lembro de alguma vez me ter tentado passar estes livros para as mãos. Portanto desconfio que a opinião que deles tinha era muito semelhante à minha. Mas só desconfio. Já não lhe posso perguntar, essa é que essa.

Escusado será explicar que este livro veio da biblioteca dos meus pais, mas aqui fica na mesma.

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