domingo, 17 de outubro de 2021

Ângelo Brea: Por Causas Naturais

Começo dizendo que este conto é incomparavelmente melhor que o anterior, o que não o impede de ter os seus problemas. E são vários, mas o principal mal deste Por Causas Naturais, onde voltamos a encontrar um Ângelo Brea igual a si próprio, com tudo o que isso iimplica, é ser tão previsível. Que quero eu dizer com isto? Bem...

Estamos em Marte, nos primeiros tempos da colonização do planeta, uma fase em que vão chegando pessoas novas em cada nave que faz o trajeto vindo da Terra, mas ainda em número reduzido. Numa dessas naves chega uma mulher, e vem grávida. Um daqueles azares: embarcara sem se saber grávida e quando se apercebera era tarde demais. E Brea faz questão de sublinhar que a imprensa tem a mania de especular sobre quem será a primeira pessoa a morrer em Marte. E a nascer, também. E nesse momento, o leitor que não seja completamente tapado fica a saber o fim do conto.

Para chegarmos a esse final, Brea destaca a mulher num posto de comunicações, afastado da base principal. Por que motivo um posto de comunicações haveria de ficar longe da colónia? Não é explicado e, sem ser explicado, não faz qualquer sentido. É dos tais artifícios que são usados apenas para dar mais tensão ao enredo, mas que acabam por ter o efeito oposto, desgastando a verosimilhança. E não chega, pois o autor ainda tem de arranjar uma das tempestades de poeira que por vezes envolvem o planeta inteiro. E assim a mulher fica isolada na altura do parto, sem que se saiba bem que efeitos poderá ter o ambiente marciano no desenvolvimento do feto. Soa tudo muito a coisa forçada para se atingir um fim determinado, o que torna esse fim completamente previsível.

E quando se junta a isso aquelas características que já se esperam das prosas do autor, a FC escrita à moda antiga e um tom excessivamente didático em que as personagens explicam umas às outras coisas que ambas sabem porque Brea acha que os leitores não sabem, o resultado é mais um conto bastante fraco. Brea já mostrou que é capaz de muito melhor que isto.

Contos anteriores deste livro:

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