segunda-feira, 30 de agosto de 2021

Publicar? Sim. Mas a qualquer custo, não.


Há pessoas para as quais escrever só faz sentido se o que é escrito for publicado. Não tenho nada contra, mas não sou assim. Para mim, escrever é coisa pessoal, que acontece porque há histórias a querer sair. Depois de elas saírem, publicar é coisa que pode acontecer ou não. Se é certo que o escrito quer ser lido, normalmente, não é menos certo que quando o que nos move é o ato de escrever propriamente dito a leitura por outros é apenas um sucedâneo razoavelmente desimportante. E a gaveta transforma-se num reservatório de histórias de que nos livrámos.

Isto, de um modo geral. Há casos particulares em que as coisas mudam de figura. Quando aparece um convite para participar de alguma publicação, por exemplo, ou quando há um prémio a dar dinheiro, esse dinheiro faz falta e se tem alguma ideia que parece adequada. Ou quando se quer levar um projeto avante. Quando resolvi pôr em prática o Infinitamente Improvável, por exemplo, escrevi para o II algumas histórias que de outra forma nunca teria escrito. Olhando agora a minha produção, recente e antiga, calculo que esse tipo de escrita feita para publicação ande no máximo por cerca de um sétimo ou um oitavo de tudo o que escrevi, embora a percentagem seja bastante mais elevada quando se contar só o que publiquei (em número, pelo menos; em extensão nem tanto, que o Por Vós lhe Mandarei Embaixadores, o único romance que publiquei até hoje, foi escrito para me divertir e só para isso) e também quando se contam só as coisas que tenho completas. Na gaveta quase não tenho coisas escritas para publicar e, por outro lado, há lá muita coisa incompleta.

(Querem números? OK, tomem lá uns quantos. O Bibliowiki, que só lista coisas publicadas, evidentemente, mas talvez não liste todas as coisas publicadas, lista cerca de 50 títulos em meu nome; uma consulta à minha gaveta eletrónica dá mais de 220, dos quais uns 40 estão por completar. Todos estes números incluem coisas dos mais variados tamanhos, do miniconto ao romance.)

Na publicação também pode haver um certo elemento de ativismo. Algumas das coisas que publiquei só viram a luz do dia porque achei que se estava a escrever e publicar pouca FC em Portugal. Manter a chama viva e essa conversa toda. E continua a escrever-se e publicar-se pouca FC em Portugal, embora não tão pouca como há algum tempo, o que reduz o estímulo para pôr cá fora coisas minhas. Outro do material que publiquei só saiu porque me apeteceu explorar formas alternativas de edição; toda a experiência Infinitamente Improvável foi isso mesmo desde o início e Por Vós lhe Mandarei Embaixadores, o romance, também: Foi primeiro serializado num blogue, só saindo em livro, revisto, anos mais tarde (e só saiu em papel porque quis aprender sobre paginação, criação de capas, as minudências dos ISBNs e depósitos legais, etc.). O certo é que sem esses incentivos aqueles 50 títulos seriam significativamente menos. Porque publicar é para mim sempre coisa secundária. E por isso, aquelas coisas de que me veem aqui a falar uma vez por mês tendem a ficar engavetadas durante períodos longos. Ou indefinidamente.

Quem perde se for indefinidamente? Eu, com toda a franqueza, não perco grande coisa. As coisas estão escritas, pelo que me livrei delas, já não me andam às voltas na cabeça. Ainda se se ganhasse algum dinheiro que se visse com a publicação de livros, talvez perdesse, mas neste país isso é utopia bastante utópica. Perde o punhado de pessoas que gostam do que eu escrevo e as outras que também gostariam se conhecessem... mas estas perdem sem saber que perdem, pelo que no fim de contas talvez não percam coisa alguma, e aquelas... bem... aquelas ainda vão sendo um dos poucos incentivos que tenho para tentar publicar. E uma das razões para estar aqui agora a escrever isto. Porque imagino que para essas pessoas, por poucas que sejam, acaba por ser insatisfatório virem aqui um mês atrás de outro ler um postzito sobre o que ando a escrever e depois não encontrarem nenhuma informação sobre eventuais publicações.

Outra razão para estar aqui agora a escrever isto, e a principal, é ter tomado uma decisão.

Talvez saibam (e talvez não saibam) que tenho dois livros em análise por duas editoras diferentes. Podem vir a ser aceites para publicação, mas o mais provável é, desde o início, que não o sejam. Por motivos diferentes (afinal, os livros são diferentes) e também por um forte motivo comum: o ano em que estamos é provavelmente o pior ano possível para apresentar originais a editoras, sejam elas quais forem. Está tudo em retração total. E sim, ainda está: muitas das edições recentes são edições que já estava previsto fazer antes da pandemia ou nos seus primeiros meses, pelo que a abertura para coisas novas é baixa, quando não é inexistente. Mas como foi no ano passado que os livros ficaram prontos, é este ano que andam por aí.

O que não sabem de certeza é que eu tenho regras bastante estritas para apresentar coisas a editoras. Para começar, não faço submissões múltiplas. Enquanto um livro está na editora xis só está na editora xis, mesmo quando elas me deixam à vontade para o apresentar a outras. E não apresento os livros a qualquer sítio. Vanities, por exemplo, nunca, mesmo que a Chiado por vezes me tente um bocadinho com aquela coisa de publicar ao mesmo tempo no Brasil e em Portugal. Mas é uma tentação muito insuficiente para compensar o resto. E também não apresento nada a quem não dê mostras de me respeitar as opções ortográficas. Tudo isto (e mais umas coisas) precisamente porque não há pressa e não há realmente necessidade de publicar. Sem pressa e sem necessidade não me sujeito a qualquer coisa, como vejo tantos escrevinhadores como eu fazer por aí.

O que eu ainda não tinha decidido, e decidi agora, é os prazos. OK, só apresento o livro xis à editora ípsilon, mas durante quanto tempo lá fica? Não indefinidamente, com certeza, e indefinidamente seria uma possibilidade real, com o tempo que tipicamente demoram a dar uma resposta. Andei a pensar nisto durante o último mês e picos e finalmente resolvi que este ano, excecionalmente, será um ano. De 2022 em diante será seis meses. Findo esse prazo, mandarei o livro a outra editora e será dessa outra editora o exclusivo. Se entretanto a primeira editora resolver que quer publicá-lo, terá de esperar que a segunda diga de sua justiça, ou que o prazo a ela dado termine, para podermos conversar.

E se eu entretanto ficar com pressa, ou se o projeto for demasiado pessoal para o estar a apresentar a editoras, ou se não gostar das condições que me propuserem, ou se, como explico nesta série, o livro for de contos (se bem que o estigma pareça estar a ficar menos intenso, o que me pode levar no futuro a reavaliar as minhas opções relativas a contos), publico-o simplesmente eu. Quem gosta do que eu escrevo não terá grande dificuldade em encontrá-lo, que a internet é nossa amiga. Aumenta a dificuldade de chegar aos que não conhecem e poderiam gostar, mas não é intransponível, pelo menos em parte. E tudo talvez se concretize mais depressa.

Portanto já sabem. As tais notas mensais não existem num vácuo. Vão acontecendo coisas por trás delas. Devagarinho, muito devagarinho, mas sim. E vai haver novidades mais concretas, mais tarde ou mais cedo. Provavelmente mais tarde que mais cedo, mas seja como for é só questão de uma coisa: tempo.

1 comentário:

  1. Olá. Podes indicar que editoras estão agora a publicar contos? Obrigada.

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