Um dos clichés eternos dos contos populares em que aparecem três irmãos ou, mais raramente, outros tipos de trios (e têm de ser três, naturalmente), determina que os dois primeiros a aparecer na história devem ter características semelhantes mas o terceiro faça contraste com eles em algum detalhe fulcral (ou em mais que um), ou pelo menos que as qualidades (ou defeitos) vão em progressão do primeiro para o segundo e deste para o terceiro. Lembram-se da história dos Três Porquinhos? Pois. É um caso típico: os dois primeiros são imprudentes e preguiçosos e estúpidos, embora o segundo seja menos mau que o primeiro, e o terceiro é prudente, trabalhador e inteligente, salvando-se assim do lobo.
Esta história, de acordo com a habitual nota dos Irmãos Grimm e para variar, não resulta na fusão de dois ou mais contos. E é uma dessas histórias protagonizadas por três irmãos, nos quais uma certa qualidade vai em progressão do primeiro para o terceiro, seguindo portanto de perto o esquema dos Três Porquinhos. Que qualidade? A ambição.
A ambição de saírem da miséria, para começar. Por isso partem pelo mundo, em busca de fortuna. O primeiro irmão encontra-a sob a forma de uma montanha toda feita de prata; o segundo, sob a de uma montanha de ouro. E o terceiro?
Bem, se atentarem a que a história se intitula O Bornal, o Chapéu e a Corneta poderão imaginar, corretamente, que esses três objetos vão acabar por constituir a fortuna do terceiro. Como? Sendo mágicos, claro.
São esses três objetos os prémios do terceiro irmão. Não direi que magia tem cada um, mas sigo que esse terceiro irmão é um canalha de todo o tamanho, que consegue os seus três objetos da forma mais criminosa possível, e que depois de os reunir, de voltar a casa, de mais umas quantas peripécias, acaba como rei. Não se trata, pois, daqueles contos de fadas em que no fim os bons vencem os maus e vivem felizes para sempre. É um conto cínico e brutal, que deixa à interpretação de cada um se a brutalidade do terceiro irmão é de elogiar por levar a que ele alcançasse tudo aquilo que desejara ou, pelo contrário, se trata de uma história de denúncia do negrume que os reis têm dentro. Seja como for, é um conto perturbador e, em parte por isso, interessante.
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