Mais uma vez não sei se esta historinha que Mia Couto (ou será Mya Kowto?) aqui conta aconteceu mesmo, o que fará da crónica uma crónica mesmo crónica, ou se trata de ficcionalização de um tema para melhor o explorar, o que a transforma num continho com um pé na crónica. Sei, sim, que é história francamente divertida.
Passa-se num aeroporto brasileiro, durante as formalidades necessárias para um par de moçambicanos entrarem no país. Mia Couto é basicamente espetador de uma discussão que surge porque o homem que o acompanha insiste que a maneira africana de escrever português enche a escrita da língua de k, w e y, e teima que é assim que se deverá escrever o seu nome. Daí o título de África com Kapa. O brasileiro, um dos funcionários do aeroporto, não vê o mínimo sentido naquilo, argumentando que k, w e y são caracteres latinos como os restantes, tão europeus como todos os outros, mas acaba derrotado pela teimosia do moçambicano. Derrotado não no sentido de convencimento, mas de se fartar de uma discussão sem pés nem cabeça, cheia de argumentos sem ponta por onde se lhes pegue, aceitando o nome do outro como quem diz "que se lixe; se o pateta quer escrever assim o nome, pois que escreva".
Ironia a rodos, claro. E Mia Couto, que em outros textos dá no toutiço dos conservadores disparatados, aqui dá no toutiço dos inovadores disparatados, mostrando que para ele não é o conservadorismo ou a inovação que estão em causa, mas sim o disparate. Simpatizo com o sentimento, confesso.
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