domingo, 24 de dezembro de 2017

Lido: As Atribulações de Jacques Bonhomme

Nos bons velhos tempos do e-nigma, depois de ter editado uma antologia de contos curtos, intitulada O Planeta das Traseiras, que foi recebida com algum agrado, tive uma ideia: e que tal pegar nestes contos sobre Marte, abrir nova convocatória para contos mais extensos sobre o mesmo tema para se lhes irem juntar, usar a promissora tecnologia do print-on-demand e pôr cá fora um livro físico, uma antologia de ficção científica e fantasia que tivesse em Marte o seu fulcro?

E como era meu hábito, da ideia à execução foi um curto passo. Abri a convocatória, recebi um conto bastante bom de um autor desconhecido, que aceitei imediata e entusiasticamente... e o projeto foi morrendo lentamente com a passagem dos meses porque nunca mais recebi nenhum outro com qualidade suficiente para ser publicado. A convocatória nunca chegou a ser encerrada; limitou-se a morrer suave e discretamente como quem cai num sono profundo para nunca mais despertar.

Esse autor era Telmo Marçal.

E é por isso com alegria e, confesso, uma certa dosezinha de orgulho que reencontro esse conto neste As Atribulações de Jacques Bonhomme (bibliografia), livro produzido em condições de profissionalismo que o meu projeto antológico não poderia ter tido.

Vem acompanhado por mais onze histórias, entre o conto curto e a noveleta, todas elas bastante bem escritas, todas elas fortes, narrativamente falando, e todas elas muito, muito negras, em absoluta distopia. Na verdade, várias destas histórias têm ambientes e narrativas tão semelhantes que deixam a suspeita de pertencerem ao mesmo universo ficcional e formarem uma série. E mesmo as outras não se afastam muito dessa atmosfera sombria. É bom? É, sim senhor. Em certos casos é até muito bom. Mas há um problema: as histórias talvez sejam demasiado semelhantes umas às outras, ao ponto de se começarem a tornar repetitivas e por isso previsíveis. Se a existência de uma série fosse assumida e Marçal tivesse arranjado algum arco narrativo capaz de reunir pelo menos metade destas histórias num todo maior e numa narrativa mais vasta, isso talvez pudesse ter sido evitado ou pelo menos suavizado, transformando este livro num dos melhores livros de sempre da ficção científica portuguesa. Mas o Telmo não o fez, não sei se por não ter conseguido, se por nem sequer se ter lembrado de tal coisa.

O resultado é um livro bastante bom mas que ao fim de alguns contos se torna repetitivo e por isso perde um pouco de interesse. Não é uma obra-prima? Não, não creio que seja. Mas é bom o suficiente para figurar por mérito próprio em qualquer lista das boas publicações de FC portuguesa das últimas décadas.

Eis o que achei de cada uma das histórias:
Este livro foi comprado.

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