Há histórias que praticamente não envelhecem, mesmo no género que entre todas as formas literárias tende a envelhecer mais rapidamente. Outras, porém, sentem com força o peso dos anos a acumular-se, e tornam-se frágeis, prontas a desfazer-se com um sopro. Para isso, e muito embora a qualidade original tenha a sua influência, talvez seja a sorte o fator mais importante. A sorte e o sempre imprevisível caminho seguido pela sociedade, pelo pensamento, pela tecnologia, são o que determina em grande medida se uma história sobrevive incólume ao passar dos anos ou não.
Os Pomos Dourados do Sol (bibliografia) não é das histórias que melhor sustentaram a passagem das décadas porque se debruça sobre um problema difícil: como conhecer a natureza do Sol? Ou por outra, não é por se debruçar sobre esse problema em concreto, mas porque o faz avançando com soluções que hoje, em retrospetiva, nos parecem um bom bocado ridículas: Ray Bradbury coloca-nos dentro de uma nave cuja missão é aproximar-se do Sol até quase tocá-lo, pôr em operação uma espécie de colher gigantesca, tocar com ela o Sol e trazer lá dentro uma amostra da sua substância, tudo muito inútil para uma civilização que conhece a espectroscopia, sabe o que são linhas de absorção e de emissão e tem instrumentos capazes de observar o Sol em qualquer comprimento de onda e um arsenal teórico suficiente para deduzir a partir dessas observações não só a sua constituição superficial mas até a sua estrutura interna.
O melhor que este conto nos legou, parece-me, foi o título. Porque Bradbury o usou para intitular uma coletânea de contos muitas vezes brilhantes, quase sempre mais resistentes ao desgaste do tempo do que este, uma coletânea que consegue ser excelente apesar de contos como este. Porque sim, este não o é. Não o é hoje e creio mesmo que nunca o foi, nem mesmo quando era novo.
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