segunda-feira, 13 de julho de 2020

Charles Nodier: História de Helena Gillet

Charles Nodier parece ter sido um homem preocupado com as injustiças do seu tempo, especialmente com aquelas cometidas pelas instituições que deviam pugnar pela justiça. Digo isto porque o que encontramos nesta História de Helena Gillet (bibliografia), um conto com elementos fantásticos relativamente escassos, embora suficientes para merecer a designação de "conto fantástico", é basicamente uma denúncia das injustiças da Justiça e daqueles que a exercem.

É, tal como o título indica, a história de uma tal Helena Gillet, que é vítima de um caso escabroso. Boa rapariga, atrai as atenções de um canalha que, com o auxílio de uma cúmplice, a droga e viola. E, pior, a engravida. Ora, uma gravidez fora do casamento em época de todos os puritanismos é motivo mais que suficiente para destruir a vida de qualquer mulher, mas no caso de Helena o caso é mais grave porque ela se vê acusada do crime de conduta imoral e condenada. E os juízes, guardiães da moral e dos bons costumes, não se ficam por menos: condenam-na à morte.

E, depois da inutilidade dos apelos, lá vai ela rumo ao cadafalso, deixando toda a gente que a sabe inocente em paroxismos de aflição. Toda a gente menos uma velha freira, que diz a todos para não se preocuparem porque Helena não será morta. É aqui que o conto se torna fantástico, uma vez que a premonição da freira se concretiza e algo — a justiça divina, provavelmente — salva a inocente da justiça humana. E para o caso da moral da história não ficar assim inteiramente clara, Nodier encerra-a com página e meia de violento ataque contra a pena de morte e aqueles que a defendem.

Bastante bem escrito e muito bem estruturado, este conto, sendo fantástico, é também político por inteiro (não seria descabido até chamar-lhe um "conto de intervenção"), demonstrando mais uma vez, como se ainda fosse preciso, que literatura fantástica e política sempre andaram de mãos dadas, quer de forma bem explícita, como aqui, quer de maneiras mais subtis. Beatices à parte (que não deixam de ser naturais), gostei bastante.

Contos anteriores deste livro:

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