O inesperado, na literatura, é sempre um bom amigo que o eu leitor reencontra com um abraço e um sorriso. Especialmente quando lê coisas em que ele não abunda, como contos tradicionais, consabidamente feitos em boa medida de retalhos remastigados e reutilizados à medida das necessidades. E sim, é verdade que há muito de repetido neste Os Três Aprendizes, conto que é mesmo dos Irmãos Grimm, construído a partir de outros dois. Não é a primeira vez que se encontram aqui aprendizes, o número três é repetido até à exaustão, há fartura de outros contos em que os protagonistas partem pelo mundo fora, e mesmo tratos faustianos já apareceram vários nestas páginas.
O que é inesperado aqui não é tanto ou propriamente o que aqui se encontra. É já não ser a primeira vez que aparece um trato faustiano em que aqueles que vendem a alma ao Demo se dão bem com o negócio.
Porque é disso que aqui se trata. Os três aprendizes, sem encontrarem trabalho, veem-se obrigados a aceitar um negócio proposto pelo Diabo, e no fim tudo termina em bem, eles ricos e livres, o Diabo com a alma que queria apanhar (nenhuma das deles), e eu a pensar no motivo que poderá levar o povo teutónico a criar histórias destas.
Também poderia pensar nas razões que obrigam o Diabo a recorrer a este tipo de estratagemas para apanhar a alma de um criminoso, mas não vale a pena procurar lógica nestas histórias. Se valesse, podíamos perguntar: mas então o crime não garante o inferno, segundo os crentes? Nesse caso, para quê tanta coisa, se bastaria esperar? Não se percebe.
O inesperado é um bom amigo, e aqui espreitou. Ainda bem.
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