Se dúvidas houvesse de que Ângelo Brea é fã de Isaac Asimov (e, em geral, dos autores de FC dessa geração... mas sobretudo de Asimov), elas certamente se dissipariam ao ler esta noveleta de ficção científica e reparar no comportamento e atitude do robô pessoal da família que a protagoniza. Trata-se de um robô positrónico asimoviano, em tudo menos no nome, incluindo mesmo referências mais ou menos encapotadas às célebres três leis da robótica.
De resto, até é possível que o facto de Asimov ter sido um judeu russo, emigrado muito novo para os Estados Unidos, muito poucos anos depois de nascer numa aldeia da região de Smolensk, esteja na base de todo o ambiente de Nas Montanhas de Magadar, embora isto seja pura especulação da minha parte. É que estamos perante uma história de ficção científica que tem lugar numa colónia planetária colonizada por russos (todo o setor, de resto, parece ser ter sido colonizado por russos), e a língua russa, a "língua antiga", como as personagens de Brea se lhe referem, faz numerosas aparições ao longo do texto. Em caracteres cirílicos e tudo, sim.
Brea parece nutrir um interesse especial pela linguística, o que dá um sabor especial a algumas das suas histórias. Caso desta.
E não é só esse o seu único ponto de interesse. Esta podia ter sido uma história realmente boa, pois o ambiente de um planeta em guerra civil, com um governo democrático a ser derrotado por uma insurreição armada, que provoca a fuga do protagonista e família para as montanhas (sim, de Magadar, e eis o título explicado), está bastante bem criado, acompanhado por personagens credíveis e por um desenvolvimento da história bastante agradável.
O problema é não ser uma história, mas o princípio de uma história. Podia funcionar perfeitamente como início de um romance ou pelo menos de uma novela, mas não, cria uma situação e não a resolve. Ora, finais em aberto são uma técnica literária inteiramente válida e por vezes muito satisfatória, mas costumam exigir que haja alguma resolução subjacente à história óbvia, um nível de leitura mais subtil que permita que o final em aberto se torne mesmo num final em vez de ser apenas uma coisa escancarada que como que grita "estou incompleta". Pode ser qualquer coisa; uma descoberta, um momento de crescimento de algum protagonista, um fim de viagem, etc., etc. Mas neste texto não vislumbrei nada disso; ele gritou-me mesmo "estou incompleto".
Talvez seja de mim. Mas não creio que seja.
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