segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Ângelo Brea: Lembranças da Terra

Já aqui falei de ficção científica portuguesa, já aqui falei de ficção científica brasileira, até já falei de aproximações a ficção científica angolana pela mão do Agualusa. Agora, e durante alguns meses, vou falar-vos de ficção científica vinda de outro ponto do mundo lusófono: a Galiza. E àqueles que possam achar estranho eu estar aqui a integrar a Galiza no mundo lusófono, pois oficialmente o galego é uma língua distinta do português, aconselho primeiro um saltinho ao artigo sobre o reintegracionismo na Wikipédia e explico depois que Ângelo Brea escreve aqui em galego reintegracionista, cuja distância face ao português não é maior do que a que existe entre os vários dialetos da nossa língua. Chame-lhe galego quem quiser, para mim este livro está simplesmente escrito em português. Numa variante um pouco diferente da minha, mas português.

Mas sobre o livro falarei mais adiante, depois de o ler todo. Para já, o que me traz aqui é o primeiro conto, Lembranças da Terra.

Este é uma ficção científica muito clássica e bastante seca, que enquanto fui lendo me fez lembrar os contos de António Bettencourt Viana que li não há muito tempo, tanto pelo estilo quanto por questões temáticas. Pelo menos neste primeiro conto as influências de Brea parecem ser mais ou menos as mesmas: a FC americana da golden age, talvez com foco em Asimov. A história é uma conversa não particularmente convincente entre um filho e os seus pais, os quais explicam ao jovem as origens deste. É que neste futuro de Brea não só há marcianos como existem marcianos que pretendem a independência do planeta face à Terra, e o jovem é um deles. Só que a história de origem, que Brea conta com muitas digressões algo acessórias, que usa para estabelecer os vários aspetos do universo ficcional que cria, radica precisamente na Terra.

Não sendo um conto particularmente estimulante, quer em termos literários, quer enquanto ficção científica, ganha algum interesse quando nos lembramos de que o autor é galego e a questão de uma eventual independência de Espanha, ou pelo menos de uma maior autonomia face ao governo central, está muito presente na política galega e de outras regiões periféricas do estado espanhol nas últimas décadas. O mundo real parece ter interferido na inspiração de Brea... o que de resto é uma constante na ficção científica.

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