sábado, 7 de novembro de 2020

Guillaume Apollinaire: O Desaparecimento de Honoré Subrac

O que faz um sedutor não particularmente dotado no que toca a propensão para a violência, e menos ainda no quesito coragem, quando o marido corneado, que ainda por cima é brutamontes, decide que o primeiro objetivo da sua vida é limpar-lhe o sebo? Foge, naturalmente. E se se vir perseguido e na iminência de ser apanhado? Bem... há o sempre recurso in extremis ao mimetismo.

Pelo menos é essa a premissa deste conto de Guillaume Apollinaire. É por isso que desaparece o Honoré Subrac de O Desaparecimento de Honoré Subrac (bibliografia), pelo menos a princípio. Na verdade, ele não chega propriamente a desaparecer: usa a estratégia do polvo, nunca chega a perceber-se bem como, e funde-se com o que o rodeia. É para isso, de resto, que anda sempre vestido apenas com um sobretudo e pouco mais. Se lhe aparece o inimigo à frente, larga a roupa, fica nu, e mimetiza.

O mais curioso deste conto, para mim, já se deixa entrever no que ficou dito acima: o início é francamente divertido. Toda a situação e a estratégia do sedutor para se escapar ao cornudo são engraçadas e mais que um pouco ridículas. Mas no desenlace o conto muda de natureza, tomando um súbito tom trágico que tem mais impacto pelo contraste que faz com a leveza do que fica para trás. À partida, eu teria imaginado que algo assim não funcionaria, mas o facto é que funciona. O conto é interessante. Não será dos melhores contos que aqui se encontram, nem é dos contos mais elaborados que se possam imaginar — até porque é bastante curto — mas é francamente interessante.

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