Não existe quase nada de caso clínico neste conto de Shelley Jackson, e nada nele existe que remeta aos pseudofactuais borgesianos que tão prevalentes têm sido neste livro. O que existe, e com fartura, é literatura. Da boa. E, claro, existem Os Putti (bibliografia). E uma dose gigantesca de imaginação.
Os putti são uns bicharocos curiosíssimos. Secos, são usados como droga (e sabe-se lá se a autora andou a consumi-los para imaginar tal coisa), mas a sua proveniência é o que de mais curioso têm. Encontram-se no interior do corpo humano, ocasionalmente cá fora, mas não é muito difícil apanhá-los mediante delicadas (e por vezes sanguinolentas) operações. Jackson conta tudo isto e numa prosa que chega frequentemente à poesia, o que dificilmente poderia afastá-la mais do texto seco, (pseudo)científico, dos casos clínicos propriamente ditos que se encontram em outras secções do livro. Mas não se trata de purple prose; é uma prosa de muito boa qualidade que enquadra da melhor forma a exuberância imaginativa do conto.
Jackson conta tudo isto, como disse, e muito mais, pois tudo no seu texto é sinuoso, repleto de apartes e becos sem grande saída. A interpelar diretamente o leitor como uma professora pouco segura do que está a dizer. Até a sugestão de ficção científica, de que os putti poderão na verdade ser uns alienígenas quaisquer vindos de algures, é acompanhada de dúvidas. Certeza só parece haver uma: a de que os putti existem. E eu também só fiquei com uma certeza: este conto é muito bom.
Textos anteriores deste livro:
Os putti são uns bicharocos curiosíssimos. Secos, são usados como droga (e sabe-se lá se a autora andou a consumi-los para imaginar tal coisa), mas a sua proveniência é o que de mais curioso têm. Encontram-se no interior do corpo humano, ocasionalmente cá fora, mas não é muito difícil apanhá-los mediante delicadas (e por vezes sanguinolentas) operações. Jackson conta tudo isto e numa prosa que chega frequentemente à poesia, o que dificilmente poderia afastá-la mais do texto seco, (pseudo)científico, dos casos clínicos propriamente ditos que se encontram em outras secções do livro. Mas não se trata de purple prose; é uma prosa de muito boa qualidade que enquadra da melhor forma a exuberância imaginativa do conto.
Jackson conta tudo isto, como disse, e muito mais, pois tudo no seu texto é sinuoso, repleto de apartes e becos sem grande saída. A interpelar diretamente o leitor como uma professora pouco segura do que está a dizer. Até a sugestão de ficção científica, de que os putti poderão na verdade ser uns alienígenas quaisquer vindos de algures, é acompanhada de dúvidas. Certeza só parece haver uma: a de que os putti existem. E eu também só fiquei com uma certeza: este conto é muito bom.
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