domingo, 8 de maio de 2022

Luiz Bras: A Última Árvore

Há muito quem diga, sem se rir, que ficção científica não é literatura, mesmo quando surge em livros e outras publicações que dão ao texto primazia. Dizem-no, geralmente, sem nunca terem lido uma linha de ficção científica ou sem nunca terem passado para lá dos exemplos mais caricaturais do género, arvorando aquele ar douto de quem tudo ignora convictamente. Luiz Bras, imagino, ri-se dessas pessoas em longas gargalhadas e depois, assim que lhe passa a hilariedade, põe-se a mostrar que sim, caríssimos, ficção científica é literatura. Mais: que ficção científica não só é literatura como pode por vezes ser ótima literatura.

Não é o único, longe disso. Mas Bras parece fazer disso uma forma de ativismo. Em alguns dos seus livros a ficção científica chega-nos repleta de experimentalismo, por vezes de uma forma que se aproxima muito de algumas vertentes da poesia, como quem faz FC para mostrar a poetas o que a FC pode ser. Em outros, como neste A Última Árvore, aparece uma ficção científica mais tradicional, mas escrita com todo o rigor literário de quem escreve contos para leitores de contos que nunca leram FC na vida. É como se estivesse a dizer a quem preconceitua o género "deixem-se de tacanhices e avaliem as coisas com base naquilo que elas são, não no nome que lhes dão".

Não sei até que ponto será eficaz nesse trabalho. Tampouco sei até que ponto será aceite pelos leitores mais limitados do género, que também os há, aqueles que também julgam que FC é aquela literatura que não precisa de literatura para nada, bastando-lhe um enredo interessante e palavreado de ar tecnológico. Mas sei o que mais me interessa enquanto leitor: sei que a abordagem comigo funciona em pleno. Sei que nos seus contos encontro quase sempre muito daquilo que procuro na ficção científica: literatura, sim, literatura, extrapolação rigorosa que no entanto não deixa que o rigor estorve a história, ideias estimulantes, inteligência, subtileza, quase todas essas coisas boas que tanto me atraem para o género.

A Última Árvore é um ótimo livro. Como em qualquer compilação de contos há alguns que me parecem mais bem conseguidos do que outros, mas o nível geral é muito alto. Contos como Aço Contra Osso, Mecanismos Precários ou O Índio no Abismo Sou Eu são do melhor que tenho lido nos últimos tempos e a maioria dos restantes não lhes fica muito atrás.

E o melhor de tudo é estar disponível gratuitamente no site dos Livros Fantasma. Só em PDF, infelizmente, mas está. Deverão poder descarregá-lo clicando simplesmente aqui. É só desfrutar.

Eis o que achei de cada uma das histórias:

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